Ficou por aquilo. E os minutos seguintes se desenrolaram bons, descomplicados.
Digo, é a Mia, não é. A garota levou mais
de dois anos para terminar um namoro, cacete,
vá lá. Eu não estava esperando um anúncio oficial de envolvimento romântico
em nenhum momento ainda neste século. Meia palavra de ciúmes me bastava. Para
alguém que terminava e começava namoros como se fossem vídeos no Vine – isto é, eu –, consistência não era lá uma
demanda interna. Eu não ligava de não definir a minha situação com a Mia. Não mesmo.
As minhas experiências passadas com rótulos não haviam sido bem-sucedidas.
“Namoradas” – o que isso quer dizer
afinal? Cada pessoa tem o seu próprio entendimento das palavras que não
inventou por si mesmo; e sem isso, você é obrigada a prestar atenção em si
mesma e no que a outra pessoa demonstra ou sente. Evolui-se em simbiose. De um
jeito particular de vocês, não do dicionário ou da porra da cabeça dos outros. Algo
como o que eu tivera, da maneira mais espetacular, com a Clara uns meses antes –
até eu meter o pé na merda toda, claro.
E sim, havia uma parte de mim que queria que a Mia dissesse ‘sim’. Que fosse ‘minha’.
Era mais para satisfazer uma necessidade conceitual de que fosse enfim minha e
não dele. Uma vez. Anos de incertezas
depois, depois de tudo o que acontecera entre nós. Eu gritaria para o mundo –
bêbada na Augusta, provavelmente – algum dia daqueles. Que era minha garota. Por ora, todavia, me
bastava estar com ela. E saber que me queria de volta.
Enfim. Por fim.
Sorri ao vê-la debruçar sobre o meu armário. Completamente bagunçado. “Você
tem alguma coisa aqui que não esteja amassada?”, resmungava, jogando peça atrás
de peça no chão. Eu piscava para ela e negava, com a cabeça. “Faz parte do meu
estilo, gata!”. Ela revirava os olhos então. E eu me divertia. A sua mãe
chegaria em alguns minutos para pegá-la – ela se desesperava. Iam visitar a avó
da Mia, uma senhora respeitável do lado mais-do-que-podre-de-rico da cidade. Dessas
com mais grana do que a minha família, a do Du e a do Fernando combinadas. Ou algo assim. E a Mia mentira para a
patroa ao telefone, dizendo que havia trazido uma troca de roupa para depois balada
daquele sábado – só para evitar ter de ir até Higienópolis, de ressaca, pela
manhã de domingo. Arrependia-se visivelmente.
_Não tem um maldito vestido! Uma blusa que preste. Zero!
_Você que inventou essa porra, mano, e agora – ri – vem acusar as minhas
roupas que não fizeram nada contra você?! Pra quê cê foi mentir??
_Quê?! Eu achei que fosse esse
todo o propósito de se dormir com uma merda de menina. Não? Poder pegar roupa
emprestada dela no dia seguinte...
_Mas você pode pegar o que quiser aí, oras.
_Jura? – ela ergueu uma camisa social preta minha e me desprezou com o
olhar, antes de descartá-la ao chão – Na boa, você não podia ser mais sapatão?!
_Essa blusa é bonita. Ok?
_Arghhh. NÃO TEM NADA AQUI QUE EU POSSA USAR! Nada. Eu não posso aparecer
em Moema com um Nike, skinny jeans e
uma porra de uma camiseta xadrez!! Não posso. Minha vó sequer sabe das minhas
tatuagens, até hoje, meu. A minha mãe vai me matar...
_É. E a propósito, sua mãe não vai achar estranho te buscar aqui, não ô?
_Não. Ela sabe que somos amigas. Sei lá! Ela nem tem falado direito
comigo esses tempos.
_Mas você acha que...
A Mia meteu a cabeça entre o bolo de roupas empilhadas dentro do
armário. Em resignação. E eu interrompi o que dizia para perguntar, aos risos,
o que diabos ela estava fazendo. “Não vai rolar”, choramingou, já sem
esperanças, “não tem nada que não grite ‘dormi na sarjeta da Frei Caneca’ aqui,
não tem nada que preste”. Eu ria. Deitada confortavelmente na minha calcinha e camiseta
velha, atravessada na cama. Levantei então e passei por ela, ignorando as
claras ofensas ao meu estilo. Vasculhei aquele caos todo por alguns segundos
até encontrar um vestido-bata verde-musgo que a minha mãe me dera uns dois Natais
antes, numa tentativa inútil de me fazer vestir como uma cidadã normal. Joguei
na sua direção e a Mia pareceu surpresa – “não sei se vai servir, nunca
experimentei”. Ela o abriu adiante de si mesma. E sorriu. “Vai! É perfeito”.
_Tá. E aí... Quer ajuda para se trocar? – ofereci, imprestável.
Ela me olhou, como se eu fosse a pessoa mais brega do planeta. E
retrucou: “Não precisa”, me dispensando, antes de puxar toda a blusa para fora
do corpo e largá-la como se não fosse nada no chão. “Eu tiro sozinha”. Caralho, garota. Quer me matar? Virou. E
vi o seu corpo caminhar adiante, as suas costas traçadas com flores amarelas,
rosadas. As linhas pretas. Acompanhei o seu compasso, alcançando-a no meio do quarto.
E peguei na sua cintura, completamente nua.
_Se não posso ajudar, o que você acha... – abracei-a, de frente mim, e a
segurei no ar – ...de eu atrapalhar um pouco?
Aquela mulher me arrancava o fôlego, à força. Puta que pariu. Sentia as suas coxas nas minhas mãos e de repente
toda a minha boca ansiava pelo gosto da sua pele, como se carecesse de água. Ou
de qualquer porra vital. Ela sorriu e me beijou no ato. Um beijo inebriante
daqueles. Não tinha como não se deixar envolver, pelas suas mãos, pelos
movimentos do seu corpo. Contra o meu. Lentamente, ofegante. Ou nem tanto – a coloquei sem delicadeza
sobre a escrivaninha. Correndo os meus lábios pelo seu pescoço, o seu colo. E
para a nossa infelicidade a sua mãe tão logo começou a ligar, estacionada em
frente ao prédio na Frei Caneca.
16 comentários:
HAHAHAHAHAHAHA "Não tem nada que não grite 'dormi na sarjeta da Frei Caneca' que, não tem nada que preste". hahahahaha ai ai ai como vc adora essa palavra!!
eu achava a mãe da mia hot, agora acho ela uma maldita. queeeeeime no inferno por interromper!!!! kkkkkkkk
Eu gosto dos posts mais curtinhos e gostosos de ler (L)
"Se eu não posso ajudar, o que você acha... de eu atrapalahr um pouco?" <3333
Coito interrompido é uma merdaaa!!!
HAHAHAHAHAHAHA
"Coito", hahahahaha. :P
Estava eu aqui, estudando neurologia e eis que me deparo com o post. Obrigada por me salvar do tédio!
Manda mais, please! Essas duas.. ♥
Fucking Mia define o que penso de relacionamentos. FODA.
Uou!
Q lindaaaaaaas, morri!
Ja da pra Mia deixar umas roupas na casa da fm hein? hehehehe
Lindo lindo!
"Evolui-se em simbiose. De um jeito particular de vocês, não do dicionário ou da porra da cabeça dos outros.
fm ficou na mão.
como a mia é apaixonante, pqp!
Super concordo! ;DD
Aiaiaia x.x linda Mia e a agonia para encontrar uma roupa boa com a fm em vez de ir em casa... Mas que triste a mae da Mia atrapalhando elas.. aff
Cade o transito messas horas, cadê? Hahahhaahaha ;p
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