agosto 31, 2010

Pupilas dilatadas

Foi como ficar sóbria, instantaneamente. Às vezes, mergulhos muito profundos em si são perigosos. O consumo exagerado de entorpecentes também. O problema é que quando sua brisa te tira tanto de si mesma, sua mente às vezes é obrigada a te puxar de volta – à força. É como quando você recebe a pior notícia da sua vida em meio a uma bebedeira: o mundo automaticamente para de girar e você recupera a razão. Mas aí vem a dor de cabeça, claro. Porque trancos mentais tão bruscos assim não devem ser tão simples, eu imagino, anatomicamente falando. A sua percepção da realidade entra em colapso de repente, o que não deve ser nada saudável.
 
A culpa, no entanto, foi das cores.
 
E não se deixem enganar pela pressuposta inocência das mesmas. Não quando se tem drogas demais na cabeça e álcool em excesso no sangue – aí as cores adquirem malícia, entendem, perdem a sua passividade. Foram elas que provocaram a tal submersão perigosa. Começou com os pés descalços da Mia. Os seus pés e a sua pele pálida, de anos sem tomar sol em São Paulo. E tá, eu sei, sei que branco não constitui exatamente uma cor só, mas que se dane. Foi assim que começou. Com a pele dela, esvaziada de cor pelo cinza dos céus paulistanos, contra o azul-marinho do sofá da nossa sala. E continuou, descendo pelas suas pernas. Encostadas suavemente entre si, até os tons castanhos da madeira no piso, que estava frio pra caralho, contrastando ironicamente com o calor que emanava do seu corpo. Espalhava pelas suas coxas. Ia desviando dos desenhos tatuados e descendo. Até a sua calcinha preta, intensamente preta, e as cerejinhas vermelhas desenhadas em toda a parte da frente. Observei deslumbrada – estava chapada demais. Era como caminhar numa madrugada tranquila, dessas de verão, no interior de São Paulo, quando pequenos pontos de luz iluminam as ruas e as árvores escuras à noite. Era bonito de ver, realmente bonito. Me encantava.
 
E aí os meus olhos continuaram subindo, lentamente, admirando em seguida o trechinho descoberto da sua nova tatuagem. As linhas pretas e o amarelo dos narcisos na lateral do seu corpo. E então vinha o cinza desbotado do seu moletom velho. Pois é, sem graça. No entanto, poucos palmos acima, ressurgia a sua pele, iluminada pela luz quente e amarela da sala, cada poro novamente, diante dos meus olhos apaixonados atentos, misturando-se com o castanho dos fios de cabelo que caíam ao longo do seu pescoço e o castanho envernizado do chão da sala, onde se esparramavam.
 
Me deu uma vontade incoerente de mergulhar ali, de correr meus dedos pelos fios, de tocar sua pele. Encostar nela, sabe? É que estava assim tão perto, tão bonito. Que me vinha aquela paz, aquela lentidão, num impulso de olhá-la por horas e não sair mais dali. Apenas contemplar cada centímetro, cada fio, acompanhar os menores dos seus gestos, se movendo desatenta ao meu lado, nuns tons serenos e num respirar lento, chapado, absolutamente magnífica.
 
Levantei a mão até o meu rosto, em um movimento igualmente lento, e corri a ponta dos meus dedos pelos meus lábios. Sem pressa. Eu – também – me movia pausadamente; pouco a pouco, junto com o mundo, que demorava a passar. 420 horas por minuto, é. Sentir o calor das minhas mãos na minha boca me acalmava, de certa forma, mas não resolvia o problema. Não era a sensação que meu corpo buscava, ali, às cegas. Era apenas um reflexo automático. O calor que eu queria, pelo qual eu de fato ansiava, estava a alguns centímetros de castanho, de piso gelado, de mim – encostada sinuosamente nas linhas da madeira. A sua boca me tentava por acidente, sem qualquer intenção.
 
Foi quando, então, o escuro dos meus olhos encontrou o amendoado dos dela, permeados por raios finíssimos de um preto lindo, tão lindo. E eles estavam ali, me olhando de volta. Me olhando atentamente. Desde quando? Não sei. A sua mão se moveu cuidadosamente na direção do meu rosto, tirando a franja bagunçada de cima dele, e eu senti a sua respiração pesar dentre a ínfima distância entre nós duas. Aos poucos, meu coração acelerou. O sangue corria intensamente pelas minhas veias, eu podia sentir, como se o mundo inteiro formigasse ao meu redor e a vontade não fosse mais mera emoção – era real. Tão palpável quanto a garota na minha frente.
 
Aí a mistura de tonalidades e sensações, sensações vivas e deslumbrantes, coloridas, ou o excesso delas, me arrancaram todo o resto de consciência que eu possuía. Me sacaram de mim, me roubaram a razão. E impulsionaram, sem qualquer pensamento coerente, a mim na sua direção. A meio centímetro, quase lá. Ela me olhava de volta, completamente envolta nas minhas intenções, hipnotizada pelo mesmo tipo de sentimento que me dominava.
 
Era aquilo. E aquilo era quase um beijo, envolto em castanhos ondulados e vermelhos cintilantes, azuis macios, rosas lentos e pretos amendoados. E por pouco não foi. O beijo. Realmente pouco – a ponto de eu sentir o movimento oscilante do seu colo empurrar as partículas de ar contra o meu, conforme ela respirava, ansiosa. Ambas à mercê de toda aquela iminência. Involuntariamente minha boca se enchia de gosto, de vontade dela.
 
De repente, porém, os meus olhos recuperaram a velocidade normal.
 
O pequeno círculo, ao centro, se estreitou por um instante e toda a realidade entrou de uma só vez na minha cabeça. Quase brutal de tão súbito. Eu estava tomada por uma inércia entorpecente, desavisada de qualquer perigo e inconsciente dos meus próprios atos. A meio centímetro da Mia e a menos de um metro do Fer.
 
Para, porra. Para.
 
O que diabos eu estava fazendo?

30 comentários:

  1. aaaawn *-* eu amo quando a FM descreve a Mia assim, toda apaixonada! ♥_♥

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  2. e o fer nessa história toda? o.o

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  3. oooown, ela toda apaixonada pela Mia, a FM muda perto dela, eu gosto G_G SUIDHIASUHD melhoor <3

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  4. Ain *-* esse passou a ser um dos meus favoritos T1

    Perfeito Mel,mas bom rs vc sabe hauahuah ;*

    IPC:#Noellyhot venk?.6.
    (*) x3

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  5. Fico hiper empolgada pra hora que o fer descobrir tudo, haha. Tão bonito como ela descreve a Mia.

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  6. com o azar q a FM tem, ctz q o fer viu kkkk meu o blog ta demais, parece q to lendo um livro de suspense... adorooo!!!! não vejo a hr do proximo :}

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  7. passo por isso sempre que o acaso me coloca na contra-mão do que tento abafar todos os dias, é.. difícil!
    VG

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  8. o fer teve uma overdose ali
    EAEAEAEAEAEE

    ai ta :(

    parei
    :~mimimi

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  9. meu ela tao apaixonada pela mia é d+ pq ela descreve a mia cmo tanto amor q deixa os leitores sem palavras e os leitores sempre querendo mais

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  10. nossa. não consegui ler em ordem. fui pulando linhas e voltando. muita tensão pro meu coraçãozinho fraco.

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  11. AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA.......


    Incrível como uma única letra pode descrever um sentimento tão complexo e confuso como a ansiedade......

    Obrigada, Mel, pelas intermináveis horas de ansiedade e delírio com essa entorpecente história de amor!

    ^^

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  12. É lindo como ela descreve a mia ♥

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  13. Aiiin, como assim.. Posta mais... >< Atualizo o blog dezenas de vezes ao dia, fico relendo momentos delas.. >< Perfeita, perfeita demais essa cena! *O* Quero mais! ><

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  14. MEEEEEU QUE TEXTO É ESSSEEE, que descrição MARAVILHOOOOSAAA, noosssa que inveja, queria ter escrito isso, tenho que adimitir ! PERFEEITO.
    parabéeeens !

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  15. Pq o Fer não dorme?! XD

    Ai fiquei boba pela mia agora *-*

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  16. eu to com a impressão que segurei minha respiração por esse capítulo todo! *-*
    incrível!

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  17. Ahei o post suuuuper poético. Parabéns Mel, arrasou como de costume. Bjo, sua linda ;*

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  18. nossa, Mel, encarnou a FM nesse post, hein? putamerda! não é possível que você não estivesse, sei lá, a flor da pele, envolvida pra caralho, ou mesmo bêbada (hahaha!) para escrever esse post. foi lindo, lindo. senti o sangue nas minhas próprias veias... e essa sensação, putz! me lembra a sala da casa da Bu, hiuaHUAihuiaHIUahIUH, porque foi quando eu fiquei com a Isa pela primeira vez (L)

    besos =**

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  19. putz...eh lindo como ela descreve a Mia ♥
    Mas tipo, como fica o Fer? é mt complicado a decisão que ela vai ter que tomar...

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  20. WOW!

    Meu, sem palavras, que post PERFEITO!!!

    Quando o Fer vir o que clima que está rolando entre elas pode ser que role 1, 2, 3??? hahaha

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  21. Você mostra seu talento para a escrita dessa forma Mel, na descrição dos sentimentos em palavras de forma tão delicada, tão real. Parabéns, realmente um dos melhores posts até agora.

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  22. foi um post tão envolvente que eu quase beijei a tela do computador hahahahahahaha

    muito bom!

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  23. Esse eu vou ter que concordar que foi um dos melhores até agora.
    Acho que eu li umas três vezes, porque a descrição tá muito delicada, muito bem construída.
    Porra, tá do caralho.

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  24. geente! que post mais lindo esse!
    eu to snetindo que o proximo vai ser muito tenso, pq se o fer nao se tocou agora ele é MUITO lerdo, né?




    p.s: estava no banho agora e vi uma formiga caindo!!!!! o.O e ela nao estava de ponta cabeça!
    fiquei chocada, e ri muito!

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  25. ahhh eu gosto assim..
    post assim bem fodão
    todo mundo comentando
    420 seguido de muito amor..

    awww..
    gatiita ♥
    RrRrrRr!

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  26. Mais um post daqueles que a gente lê, pensa e a barriga: Que sesação filha da puta!

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  27. meeu, perfeito.
    Você é minha ídola, sério.

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  28. Speechless! Você é minha ídola, sério. [2]

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