“When I awoke
I was alone, this
Bird had flown”
(The Beatles)
A voz do Fernando invadiu os meus ouvidos. Eu estava completamente
apagada, deitada de qualquer forma no sofá da sala. Com a coluna toda torta. Acordei
com as suas mãos me sacodindo o cotovelo, que eu tinha erguido sobre o rosto para
bloquear a luminosidade da janela. Meu braço direito cobria os olhos – o movi alguns
centímetros para baixo, abrindo as pálpebras com certa indisposição, e
encontrei o Fer ali, em pé do outro lado do encosto, bem na minha frente.
A minha cabeça doeu violentamente. Puta merda, me contorci, incomodada – e ele riu da minha careta. O
meu corpo parecia pesar cinco toneladas a mais, afundado contra o estofado, e a
ressaca parecia sugar secas as minhas veias.
_O que cê tá fazendo aí, mano?! – o Fer questionou, rindo – E por
que cê tá sem roupa, porra?
Ahn?, eu o ouvi,
desorientada. Senti a minha camiseta amassada contra a minha mão esquerda e
notei, então, que o meu braço a segurava sobre a minha barriga. Minhas calças
estavam puxadas apenas até a metade das minhas pernas. O quê?, o meu cérebro parecia embaralhado, encharcado em rum e THC,
o que aconteceu ontem? Cada pensamento
doía, argh. E tudo o que me vinha à
cabeça eram os orgasmos da Mia naquele chão, a sua boca contra a minha, o movimento
da sua pele tatuada entre os meus dedos. Inferno.
As mãos do Fernando se colocaram a menos de vinte centímetros de
mim, apoiado com os antebraços no alto do encosto, me observando ali de cima e
rindo.
_Essa é a melhor memória que eu podia ter de você... – zombou – ...no
meu último dia aqui.
Revirei os olhos para ele, ofendida. É – eu numa puta ressaca violenta, com os peitos de fora no meio da
sala. Mas a verdade é que era até que
bem apropriado. Resume toda a porra da nossa convivência nesse apartamento.
Esfreguei uma das mãos contra o rosto, tentando me livrar daquela enxaqueca de
merda, e me sentei. Aí vesti a camiseta de novo, descabelada.
_Sério, velho... O que diabos cê tava fazendo?! – ele achava graça
na minha desgraça e eu só queria que ele calasse a boca, sentindo a minha
cabeça doer a cada palavra que entrava no meu ouvido.
_N-não sei... – murmurei, ainda confusa – ...fiquei com calor à
noite, acho. Não lembro.
Levantei como um cão rabugento e ele riu ainda mais. Começou a
juntar os poucos vinis que restavam no chão, determinado a terminar de empacotar
aquelas caixas todas, enquanto eu subia as calças pelas pernas.
_Devia ter tirado uma foto... – fez graça, com um disco do Alton
Ellis na mão.
Ah, vá. Engraçadinho.
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