novembro 15, 2012

“You met Mia yet?”

(Pulp Fiction)

Girei a maçaneta. E com suas mãos apoiadas no batente de madeira, lá estavam eles – os meus incontáveis meses de erro consciente, agora batendo à minha porta. Literalmente. A Mia sorriu para mim, num camisetão preto do Misfits que ela cortou as mangas para transformar em regata. Meio vestido. Sem perceber a inconveniência da sua presença ali, naquele instante – com as pernas de fora naquela desgraça e com seu coturno surrado nos pés, os cabelos castanhos soltos –, enquanto minha lasanha queimava no forno e eu metia a carteira no bolso de trás da calça, já pronta para sair.
 
_Mia? – ri, surpresa – O que... cê tá fazendo aqui?
_Tô atrapalhando?
_Não. É que, ahm...
_Bom, cê disse que eu podia vir te visitar... – ela arqueou as sobrancelhas, com um sorriso imprestável, e os meus olhos se perderam por um segundo ali, indefesos – ...quando eu quisesse, não?
 
Droga.
 
Eu tinha mesmo dito. Dias antes, alcoolizada como um gambá e sem um pingo de autopreservação, no chão da sala, tagarelando sobre o quanto “claro” que ela podia “aparecer” quando bem entendesse. Mas que inferno. Eu tinha causado aquilo na minha própria vida. Comecei a pensar em como ia me livrar daquela cilada. Tinha passado a semana inteira com a Clara e queria fazer as coisas direito – mas também sabia o que meu coração tinha sentido naquela madrugada na sala com a Mia e não confiava inteiramente em mim mesma para ficar sozinha, assim, com ela. Cacete.
 
_Na real, e-eu... – passei a mão na nuca e a olhei, parada espontaneamente na porta do meu apartamento numa sexta à noite – ...tava pra sair, ia... só jantar ant...
_Ah, tudo bem... – ela piscou para mim, como quem não vale um centavo, e foi entrando – Te faço companhia!
 
Merda. Empurrei a porta de volta e fechei a maçaneta, enquanto a Mia caminhava sala adentro. Isso não tá acontecendo, argh. Ela largou a mochila sobre o sofá, como se tivesse vindo direto de algum outro lugar, e foi em direção ao corredor. Assim que pisei na cozinha, logo atrás dela, o meu celular apitou em cima da mesa. Peguei-o rapidamente e chequei a mensagem no visor – “é o Gui”, murmurei, “preciso me apressar”. Larguei o telefone de novo e fui até o fogão, abrindo a porta do forno.
 
_Hum, então cê tava mesmo de saída... – a Mia fez graça, sondando.
_Ainda tô – me agachei na frente para checar a lasanha.
 
Ela me olhou, abaixada a alguns metros dela, e riu. Podia senti-la no cômodo, movendo-se milimetricamente atrás do meu ombro. Caía a minha ficha agora de que, sem o Fernando no apartamento, as minhas desculpas para fugir da Mia se tornavam escassas. Fechei a porta do forno e coloquei a travessa quente sobre uma das bocas do fogão, erguendo-me do chão. A Mia me observava, apoiada contra a mesa da cozinha. Perguntei se tinha fome e ela disse que já tinha comido, que estava vindo da casa da Michelle.
 
_Hum – ri e alcancei um prato no armário sobre minha cabeça – Aquela sua amiga que me adora?
_Essa.
_E você contou... – a olhei de relance, colocando um pedaço no prato – ...que tava vindo aqui?
 
A Mia sorriu, sem responder, arqueando as sobrancelhas com os braços cruzados em frente ao corpo. Isso é um sim ou um não?, achei graça. Caminhei até a geladeira para pegar uma garrafa de Coca. E quando virei de novo, notei que a Mia tinha desviado o olhar para os próprios pés, ainda sem me responder, então comecei a rir. “Está certo”, disse para ela, balançando a cabeça, antes de sairmos para sala.
 
Nos sentamos no sofá, numa cumplicidade de quem nunca realmente se afastou. Em todos aqueles anos. E eu comecei a comer – mas por trás de toda aquela conversa jogada fora, uma garfada atrás da outra, a sua presença me inquietava. Era estranho. É. Tê-la sentada ao meu lado, ali, tão abertamente, em plena sexta-feira à noite. No meu apartamento vazio. E como alguém que ainda sente coçar uma mão ou perna que perdeu, sentia que a qualquer momento o Fer entraria naquela sala. E nos veria. Ainda que o seu quarto estivesse vazio e todas as suas coisas tivessem sido levadas, era difícil me sentir totalmente confortável.
 
E não é nem como se estivesse fazendo qualquer coisa errada – estava só comendo meu jantar. Já a Mia, sentada a certa distância de mim, comentava revoltada sobre uns colegas de classe que tinham virado discípulos dum professor babaca no Mackenzie e eu ria da sua indignação. Nada acontecia ali. Mas a questão, com nós duas, é que sempre estava lá. Algo. Nas entrelinhas. Eu simplesmente não podia baixar a guarda.
 
O problema foi que, aí, ela levantou as pernas. Abraçou os joelhos em frente ao corpo e pisou com os coturnos sobre o sofá. E o meu olhar escapou para o lado, num reflexo, a vendo ali, naquele pouco pano todo – é. O tecido da camiseta escorregou pelas suas coxas e juro, não tinha porra de shorts nenhum embaixo. Me arrependi imediatamente de tê-la deixado entrar.
 
Céus.
 
Foi um descuido que durou só um segundo. Nem isso. Mas os olhos da Mia cruzaram com os meus, conforme eu desviava da porra das suas pernas, como se nada tivesse acontecido. E ela sorriu, meio em silêncio, interrompendo o que estava dizendo. Se dando conta. Merda.
 
_Hum... – se divertiu – ...tô achando que você não quer sair, não.

35 comentários:

  1. Ahhhhhhhh, mel... não existe blogueira igual a vc! ♥ fico impressionada. PULP FICTION!

    A citação foi perfeita pra cena, cara.

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  2. Ai sem or, que lindaaaaaaas <3

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  3. Nossa... mandou muito no final com Pulp Fiction!

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  4. Que lindas *-* o meu coração vai e vem entre a Mia e a Clara. Lindo post!

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  5. GSJSBHSKANSGSKZJGAUQKANGYSJSJSHSOSJSGAG reli o final mil vezes! Que coisa mais lindaaaaaaa hahahahah ai, gente. Ai :')

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  6. meu comentário se reduz a "porraaaaaaaaas"

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  7. Esse é o post mais perfeito de todo blog. Apenas.

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  8. Status: vomitando arco-íris.

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  9. Meu essa Mia é demais cara, demais, não acredito nisso. Eu adoro Pulp Fiction tbm é ótimo mano. Ótimo post, agora quero só ver como ela vai se livrar da Mia, toda facil assim, cheia de atitude. Está sendo ótimo acompanhar toda essa mudança e amadurecimento da Mia ao decorrer da história. Está ótimo Mel! Continua.

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  10. Me impressiono com o realismo do blog...

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  11. hahhHHHAHAHhhhaa CA-RA-LHO!!!!

    "Silêncios desconfortáveis. Por que sentimos a necessidade de tagarelar besteiras para ficar confortável?"

    Eu amo de paixão essa parte!!!
    Sempre levei isso pra mim a ferro e fogo... porque tagarelar tanto só pra se sentir confortável!?!?!? PORRA MEL!!

    ai caralho não to acreditando nesse post! foda!! é por isso que eu sou #TeamMia

    Sem mais................

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  12. Ain... Como a Mia amadureceu, tão segura, tão linda. Ahhh!
    Simplesmente adorando essa nova e confiante Mia.

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  13. amo pulp fiction caralho kk serio msmo, melhor blog do univesro aff

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  14. a Mia é mto sedução, cara s2 haahaha

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  15. Oooh, my God!
    Um post LINDO desses com Mia toda cheia de atitude, FM se derretendo e pra terminar Pulp Fiction...
    Obrigada Mel!!!!

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  16. ownnnnnn coisa mais linda essa Mia, essa Fm, tudo tão lindo

    <3
    Mel me salvando nesse feriado

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  17. HAHA,que feliz coincidência,assisti Pulp Fiction esta madrugada pela primeira vez..quando a mia citou eu pensei"eu ouvi exatamente isto em algum lugar". ;).Maaaaãs vamos falar do post" NOTA DEZ!"

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  18. não tem como não amar neah ... espero a continuação hihihi

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  19. Ai Mia² <3

    Quando é que a Mel vai parar de só escrever sobre essas mulheres incríveis e começar apresentá-las pra gente?

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  20. Pooorra, o melhor filme do melhor diretor no melhor blog já existente????????
    hahahaha
    é demais pra mim!
    please, não pare!
    ♥-♥

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  21. Ai quero mais *-*
    Diálogo delas sempre dá vontade de ler e ler,reler e reler...muito bom.

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  22. Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhh como eu queria uma Mia dessas na minha vida monótona.
    Continuação p/ ontem, Mel.. PLEASE!!!

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  23. Taraantinoooooo *--------------*
    Como não amar "Fucking Mia"??

    Porraaaa!!

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  24. Aiaiai esse blog é só amor. Que post delicioso, que Mia deliciosa. Acho que to me apaixonando.
    Quanta atitude dessa nova Mia. Todo esse avanço... É um prazer fazer parte acompanhando este blog.

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  25. Foda! A Mia é demais!


    Será q rola double post no feriadão?

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  26. já li esse post 4 vezes, nem costumo reler postagens, mas essa está DEMAIS!

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  27. Perfeito! Perfeito!
    Que bom q vc voltou a escrever! =]

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  28. Aaaaah Mia,Mia...
    Lido e relido, tá uma delicinha este post Mel!
    Deixa a lasanha esfriar de vez, tem coisa muito mais quente por vir hahaha

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  29. " E com suas mãos apoiadas no batente de madeira, despreocupadamente do lado do corredor, lá estavam eles. Os meus incontáveis meses de erro recorrente e amor não correspondido. Agora batendo, literalmente, à minha porta. Caralho. Num vestido preto soltinho, com pontinhos cinzas. A Mia sorriu genuinamente para mim, ..."

    " _Sei. É a Clara?
    Não faz isto com nós duas, garota.
    _Mia... – suspirei.
    _Liga lá, vai. Cancela.
    _Não posso – ri.
    _Claro que pode. "

    Consigo recriar perfeitamente essas duas cenas na minha cabeça velho. Nooossa, perfeito demais.
    Mia tao segura, cheia de si, tao confiante. Estou adorando essa nova fase avassaladora dela. Uma dessas na minha vida abala todas as minhas estruturas, de booooa.

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  30. Bem que eu queria a minha Mia, batento em minha porta agora. Tão linda, tão cheirosa, garota vc me faz tão bem e nem seguer desconfia disso.

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  31. "Paul: So, I hear you're taking Mia out tomorrow.
    Vincent: At Marsellus's request.
    Paul: Have you met Mia yet?
    Vincent: Not yet."

    (...)

    ;)

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  32. " _Sei. É a Clara?
    Não faz isto com nós duas, garota.
    _Mia... – suspirei.
    _Liga lá, vai. Cancela.
    _Não posso – ri.
    _Claro que pode. "

    Como já disseram antes, tudo perfeitamente recriado na minha cabeça!

    "How you met Mia yet?"
    Sinceramente, esse é um dos poucos blogs que prestam!


    Mariah

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