dezembro 19, 2009

Medidas drásticas

40 minutos e 3 refrigerantes e 2 sanduíches e muitos cigarros e risadas depois e nós estávamos de novo no apartamento. A fome da Roberta foi embora, levando junto alguns dos meus poucos reais restantes, que gastei num novo maço no caminho de volta. Mas finalmente, sim, de volta.
 
O apartamento dela quase não tinha móveis. Numa pegada meio industrial, minimalista. Eu observava a Roberta dançando distraída de calcinha pela sala, lentamente. PJ Harvey, "Beautiful Feeling". A música pesada, de alguma forma, se misturava com a sua personalidade. As cortinas escureciam todo o cômodo, mas eu conseguia vê-la, de costas para mim, movendo-se de um lado para o outro. Com os pés descalços soltos no chão. Ela tinha uma linha reta tatuada no meio do indicador, que subia por todo o braço e até a nuca. Outra vinha do seu calcanhar até o meio da coxa. Ela se virou e sorriu para mim, de longe. Puta que pariu, pensei, eu podia me apaixonar por você, garota. E por um instante, me esqueci do que me levara até a casa dela mais cedo naquele dia. Me esqueci dos motivos, do meu único motivo. Me esqueci dela.
 
A Mia.
 
E assim, do nada, ela voltou. Por que eu fui pensar nisso, porra?! Mia. Mia. Mia – argh. De repente, a desgraçada tomou conta de todos os meus pensamentos. De novo e de novo. Contra a minha vontade. Você tá estragando isso, que inferno, me irritei. E ela estava. A Mia estragava a Roberta, estragava tudo. E sabe, se a namorada hétero do seu amigo é capaz de arruinar uma garota tatuada dessas dançando sem roupa numa sala vazia, meu bem, você tá perdida. E eu já era. Droga.
 
Larguei o cigarro, incomodada, e me levantei do sofá. Vamos lá. Eu consigo fazer isso. Fui até o meio da sala e segurei a Roberta com todas as minhas melhores intenções. As suas mãos subiram a camiseta pelas minhas costas. Mordi seu queixo e subi a minha boca até a sua. No entanto, quanto mais eu a beijava, mais a Mia invadia a minha cabeça. Os meus dedos seguravam a Roberta com vontade e apertavam a sua pele, numa tentativa de que a porra da Mia desaparecesse. Eu queria que ela desaparecesse. Que sumisse de todas as extensões do meu corpo. E do meu coração – sobretudo do coração.
 
Mas não. Nada. Ela continuava lá. Em mim. Insistentemente. Mia. Mia. Mia. Mia. Mia. Argh. Senti minhas emoções se descontrolarem, aquilo estava me dominando – mas resisti.
 
Eu vou fazer você sumir, porra.

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