“Você tá bem?”, a Mia perguntou baixinho, me abraçando pelas
costas. E eu suspirei, procurando recuperar a sanidade. “Não”. Maldição. A realidade parecia escorregar
entre os meus dedos, se misturando a contragosto com as linhas do poema. Estava
embriagada demais para evitar seus perigos sorrateiros, machucada. O meu coração não aguentava mais; e
eu sabia. Num momento de lucidez eu soube. Por isso, não conseguia continuar.
Ela também sabia. Eu
estava exausta, exaurida – dos meus erros, da forma como vivia a minha
vida. Cansada de não a ter. E de nunca realmente ter ninguém. Por culpa minha
ou dos outros, das circunstâncias. O
meu coração fora se desgastando. Naqueles anos todos. E eu destruí as pessoas
que amava pelo caminho. Não, mano, não entra
nessa brisa, implorei a mim mesma, sabendo que a bebida e o contexto me
induziam ao pior, não faz isso agora,
porra. Mas o sentimento me tomou, subindo pela minha garganta.
A Mia sabia que cada linha tinha intenção – e é, talvez não fossem as melhores linhas para se dedicar a alguém, mas eram a verdade.
Eram a gente. E me dilaceravam dum jeito. Porque yo te tengo y no,
foi o que faltou dizer. Sentia toda aquela madrugada, aquela semana de
merda pesarem de uma só vez no meu corpo. E uma vontade idiota de chorar, por que, p-por que diabos fui ler essa merda?
Perdi o rumo por um instante, deitando no colchão. E a Mia deitou ao meu
lado.
Eu perdi tudo, senti a ansiedade me sufocar. Suas mãos me envolveram
a cintura, acariciando a minha pele, passando pela costela e depois por todo o decorrer
do meu braço. Até segurar, por fim, na minha mão. E aí eu entendi, contendo as
lágrimas silenciosamente nos meus olhos. Que aquilo não era pra sempre. Que
íamos dormir e íamos acordar e que nada mudaria. Como não mudou em todo aquele
tempo. E toda vez que ela me deixasse por ele, de novo e de novo, ia me
machucar. Não importava o combinado entre nós. Eu, também, machucaria os outros
– como já tinha machucado por tempo demais. “Fica comigo”, lhe pedi então, num
sussurro, o que milhões de vezes antes eu não tive coragem de dizer, e a Mia me
beijou o rosto, sem entender plenamente o que meu coração pedia.
Por favor.
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