Voltamos do supermercado 80 reais mais pobres cada. Com comida
suficiente para quase um mês, considerando que nos alimentávamos terrivelmente
mal. Bastava uns pacotes de macarrão e pizza congelada. Os engradados de
cerveja davam para o fim de semana – ou talvez só para aquela noite, dependendo
da nossa disposição. O Fer deixou todas as compras comigo e enquanto eu
chutava, digo, carregava cuidadosamente todas as sacolas elevador
adentro, ele deu um pulo na boca da Paim para arranjar o estoque da semana.
Cheguei no nosso andar, atolada de sacolas, empurrando um dos
engradados com o pé. Completamente sobrecarregada. Por que fui insistir pra irmos no mercado?, resmunguei mentalmente,
atribuindo a culpa a mim mesma. Virei o corredor com certo esforço, destruindo
as compras pelo chão, e dei de cara com a Mia. Parada ali, em frente à porta do
nosso apartamento. É claro, respirei
fundo, com quem mais essas merdas iam acontecer?
_Oi – ela disse, enquanto eu equilibrava as compras e tentava
virar a chave na porta.
_Oi, Mia...
Respondi, indiferente.
_O porteiro me deixou subir, mas cheguei aqui e cês não tavam. O Fê...
– me olhou, desconfortável, como se o nome dele fosse proibido de repente – ...n-não
foi com você?
_Como cê pode ver... – falei, ainda tentando virar a chave – ...a gente foi no mercado. Mas o Fer quis passar lá na Paim, já, já ele deve chegar...
_Cê quer ajuda aí? – me perguntou, como se eu estivesse prestes a derrubar todas as sacolas.
_Não.
Respondi e, enfim, consegui virar a porra chave.
_Só traz o engradado, por favor – pedi, entrando no apartamento.
Fui direto para a cozinha e deixei todas as sacolas sobre a mesa.
A presença da Mia ali me irritava. Alojamos todas as compras em seu devido
lugar, a começar pelas de geladeira. Ela tentou iniciar a conversa várias
vezes, mas eu cortava todas as suas iniciativas. Não tô afim dessa merda. A verdade é que eu não queria falar com
ela. Não depois de passarmos uma noite daquela juntas e ela ter a cara de pau
de aparecer na casa do namorado, no instante seguinte, como se nada tivesse
acontecido. Vai se foder, na moral.
Terminei tudo numa velocidade impressionante, disposta a sair logo dali.
E aí me fechei no quarto.
A Mia ficou sozinha na cozinha, por um tempo – mas não demorou
muito, claro, até vir bater na minha porta. Por favor, só vai embora. Eu não queria atender, não queria abrir a
droga da porta. Segurei a maçaneta com uma das mãos, relutante, mas sabia que
não tinha escolha – eu já tinha a deixado entrar, antes mesmo dela sequer bater.
_Oi, Mia...
_Como cê pode ver... – falei, ainda tentando virar a chave – ...a gente foi no mercado. Mas o Fer quis passar lá na Paim, já, já ele deve chegar...
_Cê quer ajuda aí? – me perguntou, como se eu estivesse prestes a derrubar todas as sacolas.
_Não.
3 comentários:
Sensação estranha. Misto de frio na barriga com vontade de bater em alguém ou sair correndo. O.o iiirgh
eu gosto taaaaaanto das suas metaforas :}
Meeeeeeeeeeeu deus...........
Postar um comentário