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maio 27, 2011

180''

_E então...?
 
A Mia me encarou, impaciente com o meu silêncio. Merda. Eu não vou conseguir. Tinha os braços cruzados, em pé na minha frente. Sequer pareciam os mesmos braços que me abraçaram semanas antes. Sua boca já não era a mesma, o seu corpo parecia não me conhecer mais. E por um instante, a observando ali, num par de calças largas demais e com uns fios de cabelo se soltando dum rabo frouxo, me ocorreu que eu nunca tinha amado ninguém daquele jeito. Completamente idiota por ela. E eu, eu estava cansada.
 
_Olha, eu... e-eu sei o que cê tá pensando... mas as... as últimas semanas não... não foram... – ela começou a se enrolar numa desculpa não solicitada – ...não é como... como se...
_Mia, na boa... – a interrompi – ...para.
 
Ela se calou, me olhando de volta.
 
Agia como se não fôssemos eu e ela, a uma distância estranha de si mesma. Mas a sua presença ainda me amolecia, ia tirando a força dos meus joelhos. Cacete. E eu tentava, insistia, me forçando a parecer mais forte do que eu realmente era naquele momento –contraditoriamente feliz por estar perto dela e com uma dor maldita no coração. As palavras sumiam de mim e eu restava ali, impregnada pela dúvida. Hesitante. 
 
Não. Eu, e-eu preciso fazer isso. 
 
Engoli seco e respirei fundo:
 
_Escuta, é simples assim... – a encarei, séria – ...você sente alguma coisa por mim?
_... – suspirou – ...não faz isso.
_Sente, Mia?!
_Eu... e-eu... – abaixou o olhar para o chão, meio pega de surpresa – ...não sei, e-eu...
_Não amor, Mia – a interrompi – Qualquer... qualquer coisa, porra. Sente? – a observava, com um nó no estômago – Já sentiu?!
 
Podia ver os seus olhos formarem um “sim” machucado – as sobrancelhas franzidas, consternadas. Me observando de volta, apenas me olhando, em pé na sua frente. Fica comigo, garota, meu coração imploravaE as lágrimas já começavam a apertar a minha garganta. Tinha vontade de a alcançar, de a beijar mais uma vez. Mas me continha. Será que era eu que imaginava, que via o que queria? A sua boca continuava em silêncio, na mesma covardia de todos aqueles dias. Se omitindo de nós duas. Pelo amor de deus, fala.
 
_Você... v-você tem que entender, e-eu... – murmurou por fim, hesitante – ...eu amo ele.
_Tá bom, Mia.
 
Balancei a cabeça e me virei para ir embora, eu não preciso ouvir essa merda.
 
_Espera! – ela me segurou pela mão – É isso?!
_Mia... – senti o meu peito esmagar e o meu coração endurecer, me irritando – ...e-ele, ele não tá nem aí para você. O Fer, porra, ELE NÃO TÁ NEM AÍ! EU... – a encarei, levantando a voz – ...EU TÔ AQUI!
_É que... – ela suspirou, confusa – ...n-não sei, e-eu...
_Me escuta, por favor... – me aproximei dela, pressionando sua mão contra o meu peito, o meu coração, e falei baixinho – ...eu quero ficar com você, eu... e-eu amo você. E eu quero ficar do seu lado, porra. O q-que a gente tem é tão bom, você sabe que é. E e-eu, eu quero fazer a gente dar certo!
_...
_Mia... por favor.
_E-eu, desculpa... – os seus olhos encontraram os meus, marejados, quase como quem se despede – ...e-eu preciso tentar com ele.
 
Minha expressão mudou, de repente. E eu a senti diminuir dentro de mim.
 
_Bom, então você vai perder nós dois... – respirei fundo, enxugando o rosto de qualquer jeito – ...na boa, cê não vale a dor de cabeça. Não mais, pelo menos.
 
Dei um passo para trás e me virei, me afastando antes que o meu coração partisse ali, bem na sua frente. Não tenho mais nada para fazer aqui.  Não ia exceder os dois minutos que tinha prometido – pra ela e pra mim mesma. Não queria mais arrastar aquela merda. E sim – podia ter falado mais. Ter dito o quanto a amava, me declarado cem vezes, a lembrando de tudo o que vivemos, me humilhando, implorando, podia ter contado da traição do Fer. Mas não importava mais. Você, eu. Ele. Todos nós nos traímos, de um jeito ou de outro. E agora tinha acabado. Finalmente, tinha acabado.
 
E eu... não sentia porra nenhuma.

maio 18, 2011

As reticências

Na quarta-feira, a garota voltou. Dei de cara com a dita cuja de manhã na cozinha, quando estava saindo para o trabalho, e presumi ser a mesma de uns dias antes. Estava com as pernas de fora num camisetão do Fer e os pés descalços, distraída, observando as fotos presas por ímãs na nossa geladeira. As imagens já começavam a desbotar. Bagunçado, o seu cabelo castanho batia na altura do ombro. Tinha tatuagens por todo o corpo e dois alargadores enormes – bem maiores do que os da Mia. Assim que entrei pela porta, ela se virou e me cumprimentou, meio sem jeito. Deve achar que sou uma louca que fica gritando com o Fer no corredor, pensei. Comentei que ia fazer café e perguntei seu nome, tentando ser simpática. “Helena”.
 
Alguns minutos depois, o Fer apareceu na cozinha e a beijou brevemente contra a porta da geladeira. Fiquei olhando enquanto terminava de passar o café na pia. Não sabia onde ele havia arrumado aquela garota, tampouco me importava muito. Passaram mais tempo dentro do quarto do Fer do que pela casa. E ela até parecia gente boa – só não sei como não percebia a indiferença no jeito do meu amigo.
 
Meu bem, lamentei, você é o step.
 
Acabei a minha xícara e saí de casa, sem intenção de voltar tão cedo. De hoje não passa. Tinha passado a madrugada toda fumando um cigarro atrás do outro, angustiada, sentada sozinha na porra do meu quarto. Pensando na Mia e na minha tendência estúpida de machucar todo mundo à minha volta – ela, a Marina, o Fer. Argh. Acordei de saco cheio de mim mesma, eu não aguentava mais me sentir daquele jeito. Um lixo.
 
Fui para o trabalho e esperei o dia se arrastar, entre uma mensagem e outra para a Mia, sendo ignorada. E assim que deu seis da tarde, subi num ônibus para Higienópolis. Que se foda. Assisti as ruas passarem, naquela lentidão do engarrafamento paulistano, até as redondezas do prédio da Mia. Quando cheguei no portão, uma madame estava saindo com um cachorro na coleira. Aproveitei para entrar. “Você vai lá na Mia, num é?”, o porteiro sorriu, me reconhecendo. Pediu para esperar ali, ao lado da guarita, enquanto confirmava se eu podia subir.
 
_Tudo bem, senhora, eu aviso – ouvi ele dizer e imediatamente soube que ela não ia me encontrar – Está bem, está bem. Sem problemas.
 
Nem a pau.
 
_Dá isso daqui, deixa eu falar eu com ela... – peguei o interfone da mão dele – ...Mia?!
_...
_Mia!
_Oi...
_Olha, eu não vou fazer uma ceninha. Só quero falar com você, mano!
_E-eu não tô bem, eu... – murmurou baixinho, do outro lado – ...por favor, n...
_Que custa, porra?! – a cortei, sem paciência – Dois minutos e eu vou embora, eu prometo. Já vim até aqui, pô... Desce aí!
_... – suspirou – Tá.
 
Estiquei o interfone de volta para o porteiro, que agora já não sorria mais para mim, resmungando que eu podia ter causado um problema para ele. Tentei me desculpar e fui expulsa da guarita. Cacete. Só faço merda. Esperei por longos quinze minutos com os antebraços apoiados na grade do jardim do prédio, fumando um cigarro.
 
Ao ouvir seus passos atrás de mim, me virei. Ela estava maravilhosa – inferno. Senti como se eu não a visse há meses. Dei a última tragada, jogando a bituca no chão. A Mia estava num moletom cinza, desses de ficar em casa, com cara de quem também tinha passado semanas chorando e, provavelmente, sem qualquer intenção de estar bonita. Mas estava. Puta merda.

maio 17, 2011

Ou ama?

E-eu, decidi, eu preciso dar um jeito de falar com a Mia.

maio 16, 2011

O ponto final

A linha incandescente de brasa já se aproximava do filtro do cigarro. Mano, por favor, vai embora, pensei comigo mesma. Mas a Marina continuava lá. Me olhando, quieta, com um carinho que eu não merecia. Dei um último trago, observando a brasa se acender ainda mais brilhante, e então amassei o cigarro contra o parapeito, o jogando janela afora. Me virei e apoiei contra a parede, a Marina estava na minha cama.
 
_Senta aqui...
 
Ela pediu, me olhando de volta com o seu par de olhos castanhos bem-intencionados – por detrás daqueles óculos pretinhos de aro fino. Não me movi, apenas a encarei por alguns segundos.
 
_Deixa de ser criança... – ela inclinou a cabeça, em desaprovação – ...larga a mão e vem logo aqui, meu.
 
Respirei fundo, sem muita paciência, e descruzei os braços, me sentando ao seu lado. Argh. Por mais que a Marina tivesse certa habilidade de colocar os meus pensamentos no lugar, tem vezes que a única coisa que se quer é não fazer sentido algum. Sair por aí, irracional, com as emoções desenfreadas. Doa a quem doer – e via de regra, era a mim que doía. Mas eu queria, puta merda, queria que doesse. Que me machucasse. Queria sentir cada miligrama daquele sofrimento, me afundar em cada segundo de dor, e que se foda. Olhei para a Marina à minha frente. E é – esta era, definitivamente, uma dessas vezes.
 
_Fala, vai.
_Se comportar assim não vai ajudar – ela se ofendeu pelo meu tom.
_Má, não tô afim de ouvir bronca, meu...
_Não é bronca – ela me cortou – Mas você precisa querer ser ajudada, cê sabe que eu não gosto de te ver assim. Eu quero você feliz...
_Feliz como, porra?! – balancei a cabeça, como se me pedisse o impossível – Eu tô na merda, Má.
 
Dobrei as pernas em frente ao corpo, com os pés descalços sobre a cama, e me afundei contra a cabeceira. Então os meus olhos se depararam com o pequeno raio tatuado acima do meu joelho. Olhei as suas linhas tortas e senti falta delainferno. Num incômodo que brotava doído no meu peito e ia contaminando cada pedacinho de carne dentro de mim, naquela mesma tristeza sobre a qual eu não conseguia podia devia aguentava mais falar.
 
_Ela precisa me perdoar, Má – passei a mão no rosto, angustiada – Precisa.
_Te perdoar pelo quê, flor? – a Marina apoiou a mão sobre meu joelho e os seus dedos acidentalmente cobriram a tatuagem – O que você acha que fez de tão errado pra Mia, meu? Por que você tá se culpando?
_Sei lá, eu... e-eu pressionei ela... foi... informação demais... na hora errada, eu... e-eu devia ter esperado, eu... – respirei fundo, me frustrando – ...eu não sei, Má, eu... eu fiz as coisas errado. Eu, e-eu não devia ter falado daquele jeito e não devia ter saído com a porra da Isa, não devia ter ligado pra ela de manhã, n...
_Espera – a Marina interrompeu – Quem é Isa?
_Não, ninguém... – resmunguei, sem querer falar a respeito – ...o ponto é que eu fiz merda. E não devia ter feito. Não devia ter desligado a droga do telefone hoje, eu devia ter atendido, porra, enquanto ela... e-ela ainda queria falar comigo, mas... esse meu... orgulho de merda... – suspirei – ...eu não atendi a porcaria do telefone quando ela me ligou, Marina. Não atendi e agora quem não me responde é ela! Puta, mano, que ódio – me desesperei – Por que eu não atendi, inferno? Agora a Mia vai cair na real e... e ficar aí... achando que a opção dela é a porra do Fernando! Ela não vai mais me perdoar!
_Mas, linda, você não pode forçar ninguém a te amar de volta. As pessoas não escolhem o que sentir. Não vai acontecer a não ser que, por si só, a Mia veja você como uma opção para a vida dela, meu... Cê não fez nada errado! Esquece a Mia um pouco... Deixa ela ir atrás do que quer, deixa ela quebrar a cara, tomar as próprias decisões. Não depende mais de você.
_Não dá. Não dá, Má... Eu... e-eu não aguento... – a minha cabeça doía só de pensar – Eu... – comecei a sentir vontade de chorar de novo – ...eu amo ela demais. Demais, Má. E não é só isso... Cê não entende! O que cê faria, porra?! Se soubesse que a pessoa que você ama tá sofrendo, tá mal pra caralho?!? E eu não posso fazer nada! Não posso falar com ela, não posso estar com ela, cacete. Não. Não dá. Eu não consigo deixar pra lá, não pensar nessa merda toda...
_Tá. E... – a Marina suspirou, com pesar – ...e o que a Mia está fazendo por você?! Você não tá sofrendo também??
_É diferente.
_Diferente como?!
_É diferente, caralho – me irritei – Não é a mesma coisa, a Mia não me am...
 
Segurei as minhas palavras, de repente, antes que se tornassem reais. A Marina ficou me encarando, à espera da conclusão – mas aquela era uma frase eu não conseguia terminar.
 
Droga.

maio 09, 2011

Intervenção

_Você tá com uma cara péssima.
_Ah, Marina, na boa, não enche.
_Alguém precisa te dizer isso... – foi entrando no meu quarto, sem que eu a convidasse – ...e cê tava dormindo até agora?!
 
É, né. Estava.

_O que cê tá fazendo aqui, meu?! – resmunguei, enfiando a cara no travesseiro, enquanto ela abria a porra da janela.
_Eu vim ver se consigo te salvar de você mesma...
_Deixa de ser ridícula, mano. Nada a ver.
_Eu?! – ela me observou, irônica, e eu revirei os olhos – Olha, cê me desculpa, mas a ridícula nesse quarto é outra...
_Eu não preciso ser “salva”, Marina.
_Não?! E quando foi a última vez que você saiu?
_Ontem e já me arrependi – levantei da cama, a contragosto, com o cabelo terrivelmente amassado – Quem te deixou entrar, afinal? O Fer?!
 
A Marina não respondeu, com metade do corpo já dentro do meu armário, vasculhando a pilha bagunçada de roupas que se acumulava sobre as gavetas. Fiquei parada em pé, amolada, numa camiseta desbotada dos Strokes e com a mesma cueca que estava usando no meu encontro fracassado da noite anterior, sem vontade alguma de socializar com a porra da minha ex naquele momento.
 
Inferno. Eu odiava as “intervenções” da Marina – na época em que a gente namorava, ela costumava invadir a minha casa contra a minha vontade, no meio da tarde, e “salvar” o nosso relacionamento das nossas muitas brigas. Era sempre assim e, uma hora ou outra, eu cedia. Naquele fim de tarde infeliz, todavia, eu não estava com saco para aquilo.

_Tem alguma coisa aqui que esteja passada?! – disse, falando sozinha, enquanto mexia no bolo de tecido.
_Sei lá – murmurei – Preciso mijar...

Larguei ela ali e arrastei os pés até o banheiro. Sentei na privada, sem me dar ao trabalho de fechar a porta, e fechei os olhos enquanto fazia xixi. Exausta. Minha cabeça doía, meu corpo todo doía depois de me apertar no banco de trás de um Gol velho com a Isa por meia hora e aí andar quatro quilômetros até em casa, bêbada. Argh. Dei descarga e encarei os tons arroxeados, cansados, que se camuflavam sob a minha pele ao redor dos meus olhos. Frente ao espelho do banheiro, destruída. A Marinha tinha razão – eu tô com uma cara péssima mesmo, puta merda.
 
_Marina, nem pensar.
_Só veste logo!
_Meu, eu não... – me joguei na cama, por cima das roupas que ela tinha separado e deixado ali – ...n-não vou pra lugar nenhum, caralho.
_Ah... você vai, sim! – ela me puxou pela mão – Vem! A gente pode só jantar rapidinho...
_Má, por favor... – choraminguei, passando as mãos no rosto.
_Você não tem escolha – continuou, começando a me irritar.
_Marina, é sério, eu não quero.
_Não tô perguntando.
_Má... – sentei na cama e a encarei nos olhos para resolver aquilo de vez – ...pára. Me deixa em paz!
_E qual é a alternativa, hein?! – ela me enfrentou de volta, levantando a voz – Me diz! Vai ficar aqui sentindo pena de você mesma?!
_Ninguém tá sentindo pena de ninguém! – cortei ela, indignada, aumentando ainda mais o tom da discussão – Eu tô pedindo ajuda por um acaso?! Hein?! Te disse alguma coisa esses dias? Fui chorar no seu ouvido?? Fui?!? – levantei da cama, irritada – Não, não fui!! Não fui, Marina! Então não enche, porra!!
 
Desgraça. Eu não aguentava mais brigar com todo mundo ao meu redor. Puta que pariu.

_E PRECISA?! – a Marina reclamou, insistente – FAZ DUAS SEMANAS QUE A ÚNICA COISA QUE EU ESCUTO É “AH, NÃO TÔ AFIM...”, “AH, SEI LÁ, FUI NO ESTÚDIO”, “AH, DEIXA PRA LÁ, JÁ JANTEI”!!
_E CÊ QUER QUE EU FALE O QUÊ, PORRA?!?
_QUALQUER COISA! ME LIGA, CARAMBA! CONVERSA! FALA COMO VOCÊ TÁ! ME DIZ O QUE TÁ ACONTECENDO! DAQUI A POUCO VAI FAZER UM MÊS E VOCÊ CONTINUA AÍ, NA MERDA!
_PROBLEMA MEU, MANO! O QUE VOCÊ TEM A VER COM ISSO??
_Linda, não faz assim – baixou o tom, tentando mudar o rumo daquela discussão – Por favor. Eu tô preocupada com você.
_Eu tô bem, Marina... – balancei a cabeça, respirando fundo – ...eu só preciso de um tempo.
_Meu amor, as coisas não vão se resolver se você...
_Já disse que tô bem, porra – a interrompi.
_Flor, pelo amor de deus, cê sabe que não é verdade – insistiu, segurando na minha mão – Você acha que isso é vida?! Ficar assim por causa de uma garota que...
_Eu tô bem! Eu... estou... bem! – a cortei de novo e soltei a minha mão da dela, irritada – Quer que eu repita? Não tem nada rolando, caralho!! Eu tô bem!
_Mas você não tá! Você sabe que não tá!!
_E VOCÊ QUER QUE EU DIGA O QUÊ, CACETE?!? – gritei com ela, do nada – HEIN?!? O QUE VOCÊ FARIA NO MEU LUGAR, PORRA?! SE FALASSE PRA UMA MINA QUE AMA ELA E... E A GAROTA SIMPLESMENTE SUMISSE DA SUA VIDA?? NÃO TE RESPONDESSE?? SE VOCÊ FICASSE SE HUMILHANDO, PORRA?! MANDANDO MENSAGEM? LIGANDO?! QUE NEM UMA LOUCA?? SENDO IGNORADA?! VOCÊ QUERIA QUE EU DISSESSE O QUÊ?!? QUE EU NÃO TÔ BEM, CARALHO?! QUE EU TÔ MAL? QUE EU TÔ SOFRENDO?! QUE EU NÃO CONSIGO PARAR DE PENSAR NELA?? – fui aumentando a voz, cada vez mais – É LÓGICO QUE EU NÃO TÔ BEM, CARALHO!! PRECISA VIR AQUI E ME ENCHER SACO?!? EU NÃO QUERO SAIR! EU NÃO TÔ AFIM! ME DEIXA, PORRA!!
_É ISSO! É ISSO QUE EU QUERO OUVIR!! SÓ ISSO, MEU, A VERDADE!!
_BOM, A VERDADE NÃO ME FAZ SENTIR MELHOR!!
 
Dei dois passos e bati a porta, nos fechando ali antes que o Fer escutasse a discussão, me sentindo realmente um lixo. Caralho.

_Mas, linda, pelo menos você está falando. Isso já ajuda, voc...
_E QUE DIFERENÇA FAZ?!? – me irritei mais ainda, perdendo o controle – EU CONTINUO AQUI, PORRA, ENFIADA NESSA MERDA DESSE APARTAMENTO! SEM ELA!! NÃO FAZ NEM UM MÊS QUE A GENTE TAVA AÍ SE VENDO, CACETE, ELA TAVA ME PROCURANDO, FINALMENTE, DEPOIS DE TANTO TEMPO! A GENTE TAVA BEM! E DE REPENTE, EU CAGO TUDO E ELA VAI EMBORA, FICA ATRÁS DO FERNANDO O DIA TODO, LIGA QUINZE VEZES POR DIA E ELE SÓ BRIGA COM ELA E NINGUÉM MAIS SE FALA NESSA PORRA DESSE APARTAMENTO, MINHA RELAÇÃO COM O MEU MELHOR AMIGO TÁ UM LIXO... E EU... EU... – comecei a me sentir sufocada com aquilo – ...EU SINTO FALTA DELA... EU SINTO TANTA, TANTA FALTA DELA! PUTA, MANO! QUE INFERNO!!

Enxuguei o rosto de qualquer jeito, com as costas das mãos, aí andei até a porcaria da janela e a abri. Eu não aguento mais. Não aguento mais. Tirei o maço do bolso, ainda com raiva, coloquei a droga do cigarro na boca e acendi. Primeira tragada e a Marina continuava lá, parada, me observando com aquele olhar de pena insuportável.
 
Maldição.