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fevereiro 26, 2011

As maçanetas

Sabe quando se está dormindo tão, tão fundo que se tem a impressão inconsciente de estar submersa? Pois lá estava eu, num túnel escuro de sono, afundada no breu. Uma caverna dentro da minha própria cabeça. E foi quando, bem lá no fundo, ouvi um barulho. Bem distante. Foi de repente, como se fosse algo estalando. Cléc-cléc. Um movimento mecânico. Me virei, pesada, para o outro lado, mas algo continuava em movimento, não muito longe de mim. Eu podia sentir ali, em algum lugar, por ali, mesmo que não prestasse atenção.

Outro ruído.

Começou a me puxar, no sentido contrário do túnel, me tirando do escuro, do sono profundo. Inconscientemente, passei a mão no rosto e o virei mais para o lado, me afundando contra o encosto azul marinho. A textura do sofá contra a minha pele parecia rude, mas estava gostosa, confortável. Então, veio mais algum barulho, de leve. Alguém disse, eu acho, disse alguma coisa. Sem muita vontade de ser ouvido, falou baixo.
 
E aí, de novo, mais um estalar. Cléc-cléc. Recuperei a consciência no segundo deles – abri os olhos e ainda estava no sofá. O cômodo estava bem mais escuro do que quando adormeci. As paredes estavam apagadas, em tons de cinza e marinho, imóveis e silenciosas. Que horas são? Me mexi com preguiça para o lado, tirando o celular do bolso com certo esforço e acendi o visor por um instante. 3:59. Dormi demais, que merda.

Coloquei o telefone no chão, próximo às chaves. Continuava com sono, meu corpo parecia ter sido atropelado por um caminhão. O efeito Augusta. Me ajeitei para a esquerda, virando os braços e encarando mais uma vez o encosto, me preparando para dormir de novo. Só que aí ouvi mais um barulho, um pouco mais ao longe. Deixei os olhos abertos de novo, não resisti – a luz da cozinha estava acesa agora, notei. E a porta encostada, deixando escapar apenas uma fresta, um feixe de luz, no teto da sala. Suspirei, incomodada por ter sido acordada, meio sonolenta. As minhas pálpebras pareciam pesar a todo custo para baixo.

De repente, a luminosidade aumentou, cutucando os meus olhos cansados. E ao reabri-los, notei que a fresta estava bem maior do que antes. A porta, calculei. Uma movimentação quase silenciosa acontecia em frente a ela, no corredor. Tentei segurar a respiração por alguns segundos, a fim de ouvir o que diziam, mas não escutava nada além de passos que pareciam não sair do lugar. A sala estava mais silenciosa do que o comum para uma sexta à noite. Talvez tenha chovido, supus e senti um vento mais friozinho entrar pela janela, encostando nos meus braços. Isso explicaria a ausência de bêbados e baladeiros pelas calçadas da Frei Caneca.

_Mas eu qu... – ouvi alguém sussurrar, do nada.
 
O Fer? Talvez. Não consegui entender a frase toda. E não sabia quem estava com ele, mas estavam conversando. Por favor, desejei, qualquer pessoa menos a Mia. Meu coração acelerou, esquisito. Por favor, por favor. Seguiam cochichando alguma coisa, frente à cozinha, eu não conseguia acompanhar. Estava baixo demais. Pareciam se mover às vezes. Prendi a respiração novamente, em silêncio no sofá, tentando não ser notada ali.

_Não, deixa aí... Amanhã voc... – a outra pessoa cochichou.
_Vai estragar se eu deixar aí!
_Tá, vai lá, mas... – observei a porta se movendo, no teto, e escutei alguém mexendo na geladeira.

Aí nenhum ruído, por um instante.

_Ô... Cê quer o resto da Coca aqui? – ouvi, agora claramente, num tom bem mais alto, o Fer perguntar, aparentemente de dentro da cozinha.
_Não... – aí ela respondeu e, merda, era mesmo a Mia – ...o que cê tá fazendo aí?! Vem logo!

Poucos segundos depois, após mais alguns passos, ouvi o interruptor clicar e todo o cômodo ficou novamente escuro.

_Eu tava guardando lá, meu... – ouvi o Fer dizer, cochichando – ...você largou em cima da pia, porra.
_Shhh!

A essa altura, eu não estava mais conscientemente segurando a minha respiração, mas já não respirava. Os passos se seguiram, um atrás do outro, tentando não fazer barulho pelo corredor. E do nada, um pequeno estrondo. O idiota trombou na porta do quarto. Devia estar bêbado, o que só piorava tudo. Ambos riram, se contendo, e eu ouvi o som vir de longe. Bem baixinho. Escutei, então, a maçaneta se abrir e fechar novamente, no fim do corredor. Aí todo o som sumiu do apartamento. Completamente.

Fiquei sozinha na sala e, por um segundo, não me mexi – não conseguia. Parada, as costas contra o estofado do sofá e os olhos silenciosos no teto, inquieta. Respirei fundo. E então, me levantei. Sentei no escuro e acendi um cigarro, sem pensar. Deixei o maço e o isqueiro em cima da mesa de centro e olhei para a televisão apagada. Eu simplesmente não sabia o que fazer.

Game over

Idiooota, eu me pendurava no galão de água, sofrendo com a minha própria estupidez. Sozinha na cozinha do estúdio, aquele fracasso em plena sexta-feira de manhã. Mas como eu sou idiota, cara. Olhei o ambiente em volta, completamente enjoada. Não me sentia tão mal assim há alguns anos – e olha que eu me esforçava bastante.
 
Acontece que a falsa impressão de que eu conseguia aguentar o tranco, alimentada pela arrogância de quem tinha bebido e cheirado mais do que devia, rapidamente se transformou, como já era de se esperar, em uma bad fenomenal. E toda aquela disposição de merda foi para o espaço. Virada há dois dias, o meu estado atual era deplorável. Que ideia mais imbecil, mano, eu me condenava, odiando cada neurônio cego dentro da minha cabeça oca, acorrentada ao trabalho e com o expediente todo ainda por vir.

Quinto copo de água. O café estava me embrulhando o estômago e agravando aquela minha dor aguda de cabeça – não, fora de cogitação. Tudo se misturava na minha barriga e eu sentia cada gota de líquido ingerido naquela manhã e na noite anterior rodando dentro de mim, como numa máquina de lavar roupas. E a cada volta, me dava uma vontade desgraçada de vomitar. Peguei o celular, na esperança de já terem se passado ao menos cinco minutos. Mas, como se já não me sentisse mal o suficiente, toda maldita vez que olhava para o visor, via mais uma chamada não-atendida da Marina e me sentia uma amiga de merda. Não estava em condições de atender.

Enfiei a testa na lateral do galão de água, apertando-a contra aquele plástico azul para ver se eu conseguia sumir do planeta. Nada. Então abri os olhos e o movimento denso da água ali dentro me deu ânsia, de novo. Que bosta. Me sentia mal fisicamente, mas também me sentia um lixo de pessoa. Eu sabia – sabia – que a bad ia passar. Uma hora ou outra, aquele sentimento autodestrutivo de eu-não-faço-porra-nenhuma-decente-com-a-minha-vida ia desaparecer e ser substituído por alguma forma qualquer de anestesia, de catatonia.

Contudo – e eu tinha uma certeza terrível disso –, a droga do enjoo e aquela fraqueza insuportável não iam me abandonar tão cedo. Ahh, não, não... Eu ia me sentir doente pelo resto do dia e, pior, seria obrigada a manter os meus olhos abertos durante cada minuto de merda das próximas horas. Mas eu sou uma imbecil mesmo, eu enchi o sexto copo d’água e tive vontade de chorar, por que diabos eu apareci nessa porra?! Argh. Minha cabeça se comprimia, doendo dentro de si, e minhas pernas imploravam para que eu parasse de forçá-las em pé no chão. É, como eu disse, estava num estado deplorável.

E o dia levou uma eternidade excruciante para passar. Cada olhada no relógio me indicava o quão longe eu ainda estava da reta final – e eu lidei com isso da pior maneira possível, evidentemente. Quando, enfim, o ponteiro alcançou as 18 horas, me arrastei da cadeira onde eu estava até a recepção do estúdio com um entusiasmo nada aparente e me pus a caminho de casa. Me sentia como uma zumbi.

Pensei em ligar para a Marina, retornar as ligações, mas não tinha a mínima vontade de fazer qualquer esforço mental. Ela perguntaria o que eu queria na tarde de quinta e eu teria que contar da Mia e do Fer e ia ser um porre. Sem contar que ela vai falar daquela Bia, certeza, e de como elas estão bem e como reataram e que agora estão namorando e que o sexo foi ótimo e que elas vão casar e ter filhinhos e uma casinha no campo e serem felizes para sempre, reclamei para mim mesma sentada no metrô, e eu não quero ter que ouvir essa merda. Saí da estação da Consolação mais rabugenta do que nunca.

Fumei um último cigarro, enquanto caminhava até meu prédio, tomada por um sono violento. A Frei Caneca nunca me pareceu tão longa e inclinada quanto naquele momento. Passo por passo, com um certo esforço, eu procurava não tropeçar em mim mesma. Até que não seria má ideia, sei lá, de repente ir rolando até lá embaixo. Argh. Tirei o lenço palestino do pescoço – essa merda tá me sufocando – e senti um alívio em ter o vento correndo na minha pele. Agora não tinha nenhum colega de trabalho engraçadinho para me encher o saco sobre os chupões. Lembrei da Isa, do nada, por um instante. Devia ter feito ela parar, pensei, sem fazer muito sentido comigo mesma, e joguei o cigarro na sarjeta.

Virei a maçaneta. Chegar inteira em casa era quase um triunfo. Dei dois ou três passos para frente e capotei de qualquer jeito no sofá da sala. Com a cara afundada naquele estofado azul marinho, delicioso. Larguei as chaves no chão e minha mão permaneceu pendurada ali mesmo. Aquele foi o último som que ouvi antes de cair em sono profundo, o do meu chaveiro contra o nosso piso de madeira. Depois disso, toneladas e toneladas de ar – ou seja lá o que fosse – pareciam me pressionar, agradavelmente, me afundando naquele tecido grosso. Apaguei.
 
E apaguei mesmo – nenhum sonho, nenhuma ajeitada de corpo ou tirada de cabelo sobre a cara. Blackout instantâneo.

fevereiro 23, 2011

7:42

Fechei a porta da frente e senti a luz da manhã refletir pela sala, vindo direto na minha cara. Minha mão continuava na maçaneta e eu respirei fundo, a caminhada de volta tinha me deixado levemente mais sóbria. Bem levemente. Parecia não estar no meu apartamento há dias, conforme me virei para dentro, com aquele sentimento estático de voltei-de-viagem – depois de passar a noite inteira fora. Tudo continuava igual. Tudo, isto é, menos aqueles lençóis no sofá. E um colchão, fiquei parada, por alguns segundos, olhando para a sala bagunçada, sem entender. Quem diabos dormiu aqui?

A minha cabeça rodou, toda tonta – já meio afogada em inúmeras doses e o que restava de substâncias ilícitas em mim. Era a terceira ou quarta rodada, dessas que parece que você vai desmaiar, desde que saíra da casa do moleque da Outs. Inferno. Contei até três, respirando. E só aí comecei a andar, me sentindo ligeiramente mais estável. Passei pela sala e me deu uma vontade imensa de me jogar naquele sofá, assistir desenho animado a manhã toda e não ir trabalhar. Por mera inércia, entrei na cozinha.

_Mano, cê tá chegando só agora?! – o Fer riu, a uns metros, encostado na pia.
_Bom dia... – murmurei, sem querer ser notada, com a maior cara de acabada.

Sorri amarelo, deixando as minhas chaves na mesa. Atrapalhadamente. O barulho do metal contra a superfície pareceu ecoar bom meio do meu cérebro. Nossa cozinha estava cheia de homens – o que não era nada comum naquela casa. Estranhei. Argh. Estava acostumada a ver os moleques, mas não assim, tão já de cara, àquela hora da manhã. O Rafa passava sem camiseta ao longe, todo branquelo, me dando um “alô” com a cabeça antes de entregar um cigarro do seu maço para o Fer. De costas para mim, sentado à mesa, o Marcos comia o que me parecia ser um pão com presunto – e não se deu ao trabalho de virar para me cumprimentar, me ignorando.

_Vieram só vocês ontem? – perguntei, arrastando as palavras, sem muito interesse.
_Não... o outro Rafa também tava aí e o Igor – o Fer comentou, em frente à pia, acendendo o isqueiro – Mas foram embora ontem. E você, tava onde até essa hora?
_Nossa, meu, sei lá, na casa de um maluco aí... Amigo do cara que o Gui tá pegando, lá do Vegas – suspirei, sentindo o peso daquela noite inteira nas costas – Eles tão lá ainda, mas eu vim pra casa – sentei numa das cadeiras – Preciso trampar hoje ainda, mano...
_Cê vai virada assim pro estúdio?!
_Vou, meu, num posso mais faltar.
_Sei – o Fer riu, me olhando, e se aproximou, passando a mão em cima da marca que a Mia deixou no meu pescoço – E esse chupão aí, hein, não saiu ainda?!
_Sai, Fernando... Não enche! – tirei a mão dele, virando o rosto pro outro lado.
_PORRA, TEM MAIS UM?!?!

Espera, arregalei os olhos, como assim?!

_Mais um?? – perguntei, assustada – Onde??
_Aqui, mano, desse lado – ele começou a rir mais ainda e colocou a mão no meu pescoço, indicando onde estava – Tá mandando bem, hein, fia... É um por dia agora?

Desgraçada, a memória da Isa grudada em mim na kitnet do cara voltou à minha mente – afundei o rosto nas mãos, com os braços apoiados na mesa. Não estava acreditando naquilo. Não é possível que eu não tenha percebido, porra. Escorri as mãos para baixo, as tirando do rosto, e olhei para frente. Em meio à toda minha agonia, dei de cara com o Marcos, me julgando do outro lado da mesa.
 
Que foi, me irritei, quer falar alguma coisa, babaca?!
 
_E cês foram no Vegas, então? – o Fer perguntou e eu acenei com a cabeça, com os olhos ainda fixos no Marcos.
_Fomos.
_O que era lá ontem?
 
O Rafa passou ao meu lado e eu estiquei o braço para que ele me oferecesse o seu cigarro. Dei um trago rápido.

_Nem sei... – soltei a fumaça e ri, devolvendo o cigarro – Só fui porque o cara lá que o Gui tá pegando ia tocar. Mas foi bom pra caralho, meu.
_Se divertiu, então... – o Marcos resmungou, do nada, com uma certa antipatia.

Qual é, porra?!, o encarei de volta, bêbada demais para desviar o olhar e sem paciência com aquela atitude de merda dele. O clima estava nitidamente desagradável entre nós. Algum problema?!
 
_Sim – respondi só de afronta, olhando para a cara dele, e então me virei para o Fer – E vocês, fizeram o quê aí?
_Ah, ficamos jogando...
_É?! Quem ganhou?
_O Fernando – o Marcos se intrometeu.

fevereiro 18, 2011

Sexta-feira, baby!

A small Jean Genie snuck off to the city
Strung out on lasers and slash back blazers
Ate all your razors while pulling the waiters
Talking ‘bout Monroe and walking on Snow White
New York’s a go-go and everything tastes nice

(David Bowie)

After party II

O apartamento do cara era um quarto-sala bagunçado com uma cozinha até que razoável e um banheiro apertado. Nada excepcional. Entramos no escuro, pisando em tudo, sem prestar atenção, até que alguém acendeu uns abajures que ficavam no canto, iluminando bem mal os arredores. O cômodo estava uma zona, mas de um jeito até que cool. Nos sentamos todos no chão, encostados nas paredes e num sofá-cama, ao redor de uma mesinha de centro. Cada um cheirou um pouco de pó que o cara tinha e, na primeira oportunidade que teve, o Gui se trancou no banheiro com o DJ – e eu me lembrei com desgosto da bunda. Argh.

Depois disso, perdi completamente a noção da hora. Parecia estar ali há uma eternidade, discutindo entusiasmada com um dos caras do casal, amigo da Isa, brisando sobre o documentário de peixes-bois que vi uns dias antes. Ele era biólogo e tinha acabado de sair da faculdade, tinha uns 25, no máximo. O céu começava a clarear. A Isa se acomodou no meu ombro, completamente chapada. Ela tinha alargadores pequenos, pretinhos, e o cabelo quase tão desbotado quanto o meu, na altura dos ombros. Passou a mão pela minha barriga algumas vezes, encostada em mim – e eu sequer notei, distraída pela conversa –, aí a colocou por baixo da minha camiseta, lentamente, deslizando a palma por cima do meu umbigo, de um lado pro outro da minha barriga, numa linha horizontal. Achei gostoso até – o frio do amanhecer entrava pela janela do apartamento e a mão dela era morna, sei lá.

Segui conversando, cheia de droga empolgada, e o assunto não acabava nunca. O namorado do cara estava fritando, sozinho na sua, deitado ao lado no chão. O dono da casa parecia estar há horas preparando qualquer merda na cozinha, sei lá eu – achei que fosse um narguilé, a princípio, de tanta fumaça, mas depois senti cheiro de comida. Não olhei bem, pouco me interessava. Estava absolutamente focada em tagarelar sobre mamíferos aquáticos com o cara, me sentindo excepcionalmente animada. Antes que pudesse perceber, a porra da garota já estava com o rosto afundado no meu pescoço, brisando, e começou a me dar uns beijos de leve. Bem de leve, pouco a pouco.

Continuei falando. Falando e falando, sem fim, o papo estava realmente bom. Não parecia ter importância, digo, todo o resto. Mas aí ela insistiu, me beijando ainda no pescoço – e só no pescoço –, cada vez mais intensamente, me apertando a cintura por baixo da blusa. Cacete. Não estava realmente me dando conta do que acontecia, sei lá, só fui deixando. E a conversa continuou. Continuou e continuou até que, uma hora, não sei bem quando, de repente, não estávamos mais conversando. Ou estávamos? Não sei, só sei que parei de falar em algum momento. Não percebi que parei, só parei. Sentia a boca da Isa no meu pescoço, agora com mais vontade, e fui perdendo a consciência das coisas.

A sua mão contra a minha pele, na minha cintura, ia me envolvendo, aos poucos. A sua língua subia e depois descia, entre os seus lábios, com a boca encostada na curva do meu pescoço, me dando arrepios. Um atrás do outro – puta que pariu. Continuou, foi continuando, se empurrando pra cima de mim. Não sei o que o cara estava fazendo a essa altura, talvez falando com o namorado ou esperando, parado ali, que eu lhe respondesse alguma pergunta que sobrou no ar. Não faço ideia. Talvez ele mesmo tivesse parado de falar comigo. Que se dane, não sei mesmo. Entrei na minha própria cabeça por um instante, imersa nos beijos da Isa, enquanto olhava para lugar algum em particular. Durou dez segundos – ou dez minutos.
 
E eu comecei a sentir o perigo... é, mas não conseguia me mover.
 
Até que ela começou a me dar mordidas, entre um beijo molhado e outro, de um jeito realmente excitante. Puta merda. Senti minha respiração pesar. Por um momento, fechei os olhos e me deixei levar, quase virando para beijá-la de vez, enroscando os dedos no seu cabelo, sem pensar direito.

_Não, vai... – murmurei, meio hesitante, sem muita convicção no que estava dizendo para ela – ...não faz isso, meu.

Parte de mim queria continuar, por mais que eu não quisesse arranjar pra minha cabeça – e não queria mesmo, só que eu já estava invariavelmente na dela. Ainda assim, por um segundo, um mínimo segundo, eu hesitei. Cara, não, não posso. Eu sabia que ia me arrepender... e muito. Preferia evitar a ressaca moral no dia seguinte. Já tinha muito rolando na minha vida, naquele momento, muito mais do que eu conseguia processar. E a última coisa que eu precisava era de mais um peso na consciência. Toda a minha pouca razão sabia disso.

Mas ela me ignorou, como se não tivesse me ouvido – e continuou no meu pescoço. Seguiu me beijando, insistindo, agora com uma lentidão. Dessas intensas, ô inferno. Respirei fundo, ainda com uma vontade desgraçada, e aí puxei a cabeça para o lado de forma bem sutil, quase envergonhada de estar difícil assim. Ela me olhou e eu justifiquei, meio lenta de tão bêbada, dizendo que não estava no clima. Olhei de volta para ela, com certo esforço, e então, ela pareceu entender – aí sossegou. Coloquei o meu braço atravessado por cima dos seus ombros, atrás da sua cabeça, mais uma vez, e ela encostou o rosto em mim. Eu não sentia sono algum. Virei e vi o céu já quase azul na janela, achei bonito. O cara do casal cruzou o olhar comigo, no meio da sala, e eu sorri pra ele.

_Olha aí, meu, já é de manhã... – comentei, fazia tempo que não via o sol nascer, sentia falta de baladas intermináveis assim – ...e eu, eu vou trabalhar daqui a pouco, meu.

After party I

Uma bunda. A última maldita coisa que eu gostaria de ver passar diante dos meus olhos ao final de uma noite que parecia ter durado pra sempre na pista de dança – e que agora prosseguia, interminável, na calçada suja da Augusta – era uma bunda. E não digo uma bunda bonitinha, de mina. Não, não, senhoras e senhores. Estou falando de uma bunda realmente bunda, bunda mesmo, do tipo branca e de homem. Eca.
 
Mano, ah, mano, mano, não dá.

E só de pensar que o meu infeliz amigo ia, de fato, por livre e espontânea vontade, sem a menor sombra de dúvida, passar o resto daquela noite desfrutando prazerosamente daquela peça lastimável que agora desfilava descoberta e embriagada metros abaixo da saída da balada – ai, que depressão. Era nessas horas que me batia, independente do tanto de álcool já ingerido, uma convicção tremenda de que o que eu gostava mesmo era de mulher. Mulheres, cara, mulheres e as suas bundas maravilhosas, eu divagava, caindo de bêbada, enquanto o assistia ali, seminu na minha frente.

_O que diabos cê tá fazendo, sua bicha doida?!

Ouvi gritarem, pouco mais acima, e do nada vi o Gui passar correndo rua abaixo, bem na minha frente, escandalizado e rindo aos montes, indo com pressa em direção ao seu pseudo-affair exibicionista. Eu estava parada, fumando sozinha na minha, após longas horas suando numa balada lotada sem tocar em um cigarro sequer, apoiada contra um muro do lado de fora. Sagrada nicotina. Já passavam das cinco da manhã e eu mal me aguentava em pé, bêbada como nunca, tentando não fazer xixi nas calças de tanto rir do pobre Gui, que agora puxava o jeans do outro pra cima, refutando seus argumentos de que ele era “um cidadão livre” e que tinha “direito sobre o seu corpo”. Os dois tagarelavam numa cena tão engraçada que eu tinha que me apoiar nos lambes imundos da Augusta para não cair.

O nosso grupo havia ganhado três novos integrantes. Um outro casal – também gay – se agregou à nossa excelente companhia já quase no fim da noite, assim como um amigo estilosinho do DJ, que eu conhecia de vista da Outs. O plano era ir pra casa desse último, que estava nos acelerando a cada dois minutos. O problema é que eu mal era capaz de andar, tentando não escorregar para o chão enquanto perdia o fôlego num ataque de riso involuntário causado pelo Gui e as calças abaixadas do seu homem da vez. Mano, não dá, eu vou cair..., pensei já agachada, me apoiando contra o muro para não tombar mais, ...eu vou cair, eu vou cair, eu vou cair..., olhei então para o cigarro aceso na minha mão, na dúvida se o largava e me segurava ou se, puta merda, é agora, vou cair mesmo.

_Vem, sua bêbada! – a garota da pista, que até então estava ocupada conversando com o casal, ambos amigos dela, apareceu rindo na minha frente, oferecendo as suas mãos para eu segurar – Eu te ajudo...

Estou salva. Meti o cigarro na boca – como não pensei nisso antes? – e dei as minhas mãos para ela, me levantando pouco antes de encostar no chão imundo da Augusta. Ufa. Agora em pé, a abracei por cima dos ombros e terminei de tragar, tirando o filtro da boca. Eu estava andando mais torto do que um gambá. Descemos a rua apoiadas uma na outra, não muito mais sóbrias do que o restante. O Gui voltou empolgado até nós, passos acima, tagarelando qualquer besteira, e me abraçou do outro lado. E aí, sim, começamos a andar torto mesmo. Disse que a casa do cara não ficava longe, que já tinha ido lá e que era logo ali, na próxima esquina, e eu achei graça – estava rindo de qualquer merda que me dissessem, não é, àquela altura. Aí ele me deu um beijo, num gesto de carinho.

_Ah! Então... ele pode? – a garota contestou na mesma hora, injustiçada.
_Meu bem... Eu posso tudo! TUDO!

O Gui pulou para a nossa frente, repetindo mais algumas vezes a palavra “tudo”, de um jeito bem viado, e eu continuei rindo, sem querer discutir. A garota – que tem um nome, com certeza, e é, ela deve ter me falado, acho, em algum momento, na balada – nos olhava indignada. O Gui deu risada e aí seguiu para frente, descendo a Augusta nitidamente aos trancos, todo tonto de tequila, até esbarrar no seu affair e grudar nele com um abraço apertado.
 
Ah! Isa, lembrei, esse é o nome dela. Isa!

_Mas você é... é... – ela ainda se revoltava, bêbada – ...sapatão!
_Hum.
_É! Não é?!
_Sim... – eu ri.
_Então, porra! Você, você não pode beijar ele!
_Ah, meu, pelamor. Aquilo não foi nem um beijo!
_Sei... – a Isa me olhou, mal-intencionada – ...se é assim... – sorriu – ...não quer me dar um não-beijo, então?
_Não é a mesma coisa!
_Não?! – riu.
_Se eu dou um beijo no Gui, é... é... sei lá, bicha. Não significa porra nenhuma! Mas você, você é uma mina, né, meu... – me enrosquei na lógica, bêbada – Se a gente se beijar já é... tipo... já significa alguma coisa.
_Hmm... – ela saiu debaixo do meu braço, me pegando pela mão, e achou graça – ...mas e se não significar nada? Nem pra mim, nem pra você? Hein, e se for só de bobeira?

Não fala, porra... Não fala essas coisas pra mim, garota.

_Tá. Mas isso é... – tentei achar qualquer argumento, dando o último trago, antes de jogar a bituca no chão – ...é o que todo mundo diz, né, até que, de repente, começa a significar.
_Escuta... – ela me parou na rua e eu já comecei a rir, prevendo os próximos segundos de conversa embriagada; ficou na minha frente, apoiou os braços em cima dos meus ombros, fazendo questão de me olhar nos olhos, e eu coloquei as mãos na sua cintura, meio sem pensar – ...olha, eu prometo, prometo... – fez graça, revirando os olhos – ...prometo mesmo, que não vou me apegar. Tá bom assim?

A observei, realmente tentada, de repente.

_Um beijo, vai. Só um.
_Não... eu... – passei a mão no rosto, me livrando daquela vontade repentina, e suspirei – ...eu tô... é... é complicado.
_Credo, hein. É pior do que eu imaginava! – ela riu e me olhou como se simpatizasse com o meu sofrimento – Meu... – achou graça – ...não sei nem se eu quero saber.
_Não, vai por mim, você não quer.

Ri também, de novo, achando graça na minha própria desgraça, e dei uns passos mais pra frente. Ela seguiu caminhando junto comigo, ainda de mãos dadas nas minhas. Fui brincar e coloquei ela nas minhas costas, já quase no prédio do cara, montada com as pernas ao lado do meu quadril e os braços no meu pescoço. Clássica ideia de bêbado idiota. E aí nós quase caímos, óbvio. Rindo até não poder mais, sem poder evitar, enquanto os outros nos olhavam como se fôssemos loucas e o Gui gritava qualquer coisa na nossa direção. Os vizinhos deviam nos odiar, tenho certeza, acordando para ir trabalhar – mas que se dane.

fevereiro 16, 2011

"Electro Gang Bang!"

(M.O.N.T.A.G.E.)
 
_Ela tá te... – o Gui se debruçava bêbado sobre mim, rindo, tentando falar no meu ouvido, ambos fervendo naquela pista lotada, e eu o ignorava, dançando, inebriadíssima – Não, sério... Olha, olha... – ele continuava, se divertindo.
_Para de...
_O quê?! – ele ria mais ainda, já fora de si, sem entender porra nenhuma do que vinha da minha boca, ao lado daqueles amplificadores imensos – Que foi??
_Para de apontar pra mina, cacete! – gritei, abaixando o seu dedo, acidentalmente empurrando o meu corpo contra o seu, e comecei a ter um ataque de riso, com o rosto colado no dele, ambos consideravelmente alcoolizados.
_...mas ela tá! – ele prosseguia, insistindo, e eu ria tanto que meu estômago doía.
 
Eu realmente me divertia com o Gui. Toda maldita vez, porra, cambaleando entre um passo de dança e outro, completamente chapados e nos abraçando a cada dez segundos, ao som de Joan Jett, na tentativa de não cair no meio daquele monte de gente no Vegas. Ele me puxava com força pela cintura, numa indecência que fluía para fora dos seus poros, e eu sacudia a cabeça de um lado para o outro, num orgasmo rock ´n’ roll violento, acompanhando a letra de Do You Wanna Touch Me, aí nós ríamos e ele escorregava pelo meu corpo, rebolando até o chão, quase caindo juntos no piso sujo da balada.
 
Puta clima entre nós. E ninguém entendia quando, aí, o affair dele, um DJ de uns quase trinta, resolvia se juntar a nós e os dois se agarravam loucamente. Comigo logo ali, ao lado, sobrando entre os braços másculos e os beijos de língua exagerados, aquela viadagem, sendo que dez segundos antes qualquer um ao redor poderia jurar ser eu a peguete da vez. Sozinha, agora, na minha na pista. Eu gostava de foder com a opinião alheia, de dançar atracada com os meus amigos viados a noite toda e depois ir lá mostrar algum canto escuro da balada para alguma garota. Eu adorava – e o Gui não era diferente.
 
_Ei... – ouvi, sentindo uma mão em mim – ...posso dançar com você?
 
Estava viajando, o rosto suado virado para cima e os olhos fechados, alucinando no setlist que saía das caixas altíssimas de som, tanto que sequer a notei aparecer na minha frente. Desci o queixo, já atrasada, e a encarei, ainda meio fora de mim. A mesma loira que o Gui me apontou, minutos antes; a tal garota que tanto me queria, segundo ele. Ah, é. E sem querer, mas completamente alcoolizada, olhei para a cara dela e comecei a rir de novo.
 
_O que foi? – perguntou algumas vezes e aí eu ria ainda mais, apoiando a cabeça no seu ombro, e sem entender nada, ela começou a achar graça na minha reação – O que foi, meu?!
_Nada... – tentei recuperar o fôlego, um tempo depois, ainda rindo – ...nada. Pode.
 
Coloquei minhas mãos na sua cintura e ela continuou me olhando, intrigada. Puxei-a mais para perto. O set mudou para qualquer electro-funk moderninho. E aos poucos, os nossos quadris acertaram o ritmo um do outro. Só uns vinte minutos depois, enfim, o meu amigo soltou da boca do DJ para respirar e o seu encontro daquela noite se virou para enfrentar a multidão até seja-lá-onde-que-ele-ia. Quando o Gui se juntou a nós duas, as pernas da garota já estavam metidas no meio das minhas, os meus braços ao redor dela e nós três, bêbados, perdendo a linha nas batidas do Vegas. Sentia o ar entrando quente e abafado nos meus pulmões. Qual é a das baladas e a ausência completa de ventilação, mano?, pensei, meio revoltada e embriagada. Puta calor desgraçado.
 
_Meu, vou pegar alguma coisa pra beber... – avisei, ofegante, no ouvido do Gui – ...não tá dando.
_Ô... – me segurou, antes que eu me virasse – Quer que eu dou um perdido na mina?
_Não, meu... de boa.
_Vai pegar?
_Claro que não! – olhei para ele, sem entender.
 
Cortei caminho pelo meio das pessoas que lotavam o espaço mínimo do Vegas – o que, para uma quinta-feira, era impressionante – e me apoiei contra o bar, pedindo uma dose de vodka e uma Coca-Cola. O Gui apareceu pouco tempo depois ao meu lado, me olhando esquisito, como se tivesse algo para falar. Alguns passos atrás, surgiu a garota da pista, meio de gaiato na história, e cada um deles encostou no balcão em um lado oposto de mim – ela, na direita e ele, na esquerda. Ambos pediram uma tequila, achando graça na escolha, e eu recebi a minha dose, virando-a sem esperar. Abri a minha latinha em seguida, ansiosa por qualquer coisa gelada, e o Gui seguiu me olhando.
 
Aí grudou no meu ouvido, enquanto eu sentia o refrigerante descer pela minha garganta:
 
_Dá pra você... – argumentou, bravo – ...esquecer essa filha-da-puta? Hein?! Só por uma noite?
_... – tirei a lata da boca e o fuzilei com os olhos, em silêncio.
_O quê?! – se irritou – Não quer ouvir a verdade, é?!
_Ela não é filha-da...
_Do que cês tão falando? – a garota se intrometeu.

fevereiro 14, 2011

Foda-se

Que venha o Vegas e a dor de cabeça!
.

Impertinência

O silêncio do outro lado da linha fazia eu me arrepender de sequer ter ligado. O que eu tô fazendo, meu deus? Minha mão apertava o celular, com os olhos fechados, e os meus ouvidos escutavam o impasse na garganta da Mia. Nenhuma palavra. Ela hesitava em me responder a mais simples das perguntas. Como se qualquer coisa entre nós fosse simples.
 
_E-eu só liguei... – murmurei, interrompendo o silêncio e encarando o maço vazio entre meus dedos – ...porque queria saber como cê tava. E pra te dizer que, sei lá, q-que aquele dia foi...
_Eu sei.
_Não, eu não sei se você sabe de verdade, Mia – quis confessar meu amor por ela, num impulso, mas ela me interrompeu.
_Não vamos falar disso agora...
_Você não tá bem, meu.
_Eu não disse isso.
_Mas também não disse nada, porra...
_É porque eu... e-eu não sei, não sei mesmo. Eu... – respirou fundo – ...não sei.
_Não sabe se tá bem ou não?!
_Não. Quer... q-quer dizer, sim.
_Mano, por favor... não faz isso – implorei – Me fala, conversa comigo, não me deixa sem saber o que tá passando pela sua cabeça.
_Não tem nada passando pela minha cabeça, meu...
_Ah, não?! Então, nós estamos bem?
_“Nós”?
 
E aí o som sumiu de mim, garganta abaixo – senti escorregar para dentro do meu estômago, o revirando, enquanto eu permanecia subitamente machucada, muda. Como assim? Nós, oras!, a ausência de voz me secava a boca e a minha cabeça foi a mil, acelerando o meu coração. Nós duas, porra. Por quê? Disse alguma coisa errada?! Nós duas, se pegando e fodendo e tatuando e saindo e se beijando por aí esse tempo todo, caralho. Ou não somos “nós”?! Não temos nada?! Tive vontade de desligar o telefone. Mandá-la à merda. Tirar de mim toda aquela angústia emocional ridícula que vinha carregando nos últimos dois dias. Surtar, sei lá, ser realmente grossa de repente. Mas não – respirei fundo. Sabia que eu estava mais instável do que o normal com a situação e não queria despejar tudo que sentia em cima dela.
 
_Escuta... – falei – O que cê vai fazer hoje?
_...
_Cê vai ver ele?
_Não.
_Não?
_Não, os... os meninos vão lá. Aí. Na casa de vocês, quer dizer. E eu... – hesitou – ...e-eu ainda não sei o que vou fazer.
_Eu quero te ver.
_Não, eu... e-eu não sei. Eu acho melhor eu... – suspirou – ...sei lá, ficar sozinha um tempo. Eu preciso pensar, sabe. Na minha vida, em tudo isso. Não sei se é a melhor coisa você vir aqui e...
_Mas eu não preciso ir aí, meu... a gente... a, a gente não... n-não precisa nem... – me enrolei para falar – ...olha, eu só quero te ver, Mia. Ver que cê tá bem, meu. Eu sei que rolou muita coisa essa semana e na semana passada, que você quer ficar sozinha, mas vamos... vamos só... só sair, meu. Ficar de boa, é sério, sem segundas intenções, nem... n-nem nada – continuei – Eu combinei de ir no Vegas hoje com um amigo. De repente, cê podia ir também e, sei lá, a gente só toma umas e dança um pouco, esquece desse rolo todo. Aí amanhã... – passei a mão no rosto, ansiosa – ...a-amanhã cê pensa nisso, vê o que quer fazer.
_Amanhã eu vou sair com o Fer, eu...
 
Fantástico.
 
_Mia, olha, eu não quero complicar a sua vida – disse, tentando ser o mais sincera e racional possível – Eu gosto de estar com você, mesmo que a gente não esteja juntas. Gosto mesmo! E eu ia ficar feliz se cê fosse hoje, eu... só queria te ver, meu, só isso.
_Ah, mano, eu... não sei. Não sei mesmo.
_Por quê?
_Porque... Não sei se é uma boa ideia e... e eu não tô legal, sabe, não queria ir pra Augusta e nem...
_A gente não precisa ir pra Augusta! – a interrompi, na mesma hora – Eu desmarco, não tem problema! A gente vai pra outro lugar, meu...
_Não, escuta – respirou fundo – Sai com o seu amigo, vai lá hoje, se diverte e, sei lá, a gente se vê no fim de semana, quando eu me resolver direito com o Fê. Eu quero te ver também, só preciso de um tempo. É... é, é muita coisa de uma vez só.
_Eu sei, mas...
_Não esquenta com isso, meu. Sério, tá tudo bem... eu acho.
 
Ahh... Você acha?

fevereiro 11, 2011

Ostras, ostras

A quinta-feira chegou e eu ainda não tinha recebido notícia da Mia. Ou do Fer, por sinal. Aquilo estava acabando comigo. Só não tinha perdido a cabeça de vez, porque sabia que ele tinha dormido em casa – e sozinho. Estava acordada quando ele chegou de madrugada. Não tinha conseguido dormir porra nenhuma, claro, fumando um cigarro atrás do outro. E ao ouvi-lo chegar, não me aguentei: abri a porta do quarto para perguntar como havia sido por lá. “Foi bem”, disse, cansado, e foi direto para a cama sem comentar o assunto.
 
Ótimo.
 
Mais uma série de cigarros começados e esmagados no cinzeiro antes do fim. Nada na internet, nada pra fazer naquela merda de apartamento. E como a minha cabeça se recusava a pegar no sono, repetidamente, acabei acordando atrasada no dia seguinte. Por muito pouco, perdi o meu colega de apê – e o relatório completo do encontro – no café-da-manhã e, para piorar, ainda ganhei uma bronca do meu chefe. Óbvio. Aquela caminhava para ser a pior quinta-feira de todos os tempos.
 
Contando com uma mensagem na madrugada anterior e uma de manhã, a Mia já havia ignorado dois SMS meus perguntando se estava tudo bem e, agora, eu me sentia uma neurótica descontrolada por tê-los sequer enviado. Fora isso, a Marina se recusava a dar sinal de vida e a única mensagem recebida no meu celular era do Gui, completamente alheio à situação, me lembrando do nosso combinado de ir ao Vegas naquela noite.
 
Ao voltar do almoço, sem ter comido nem meio prato direito e me deparando com a caixa de mensagens vazia, de novo, senti como se fosse a pessoa mais sozinha do mundo. Por que ninguém fala comigo, porra?!, empurrei o celular na mesa do computador, me deixando chatear por aquilo. Que inferno, mano. Estava quase ligando para o Fer para perguntar o que diabos estava acontecendo. Quase.
 
Atende, Marina, atende, tentei mais uma vez, algumas horas depois, numa insistência desesperada. E – nada. Caixa postal. Larguei o telefone na mesa à minha frente, com desgosto, e subi para buscar a minha vigésima xícara de café do dia na cozinha. Aproveitando o rolê dos maus hábitos, dei uma passadinha do lado de fora, em frente ao estúdio, onde fumei mais um cigarro. Preciso comprar um maço novo, encarei o meu já quase vazio nas minhas mãos, não posso esquecer. Aí troquei três palavrinhas com a mina da recepção, acerca de nem-lembro-o-quê, e desci novamente.

Nada ainda no celular. Mas que droga.

O relógio já marcava quatro-e-vinte passadas, quando resolvi ligar de uma vez por todas para a Mia e perguntar o que diabos estava rolando. Não é como se me sobrasse vergonha na cara, não é? Só que... Não. Não, meu, eu não posso fazer isso, repensei no mesmo instante, certa de que ela ia sacar o quanto eu estava surtando com a história toda. Tá. Mas eu tô surtando mesmo, porra. Sentia que algo não estava bem. Ou estou imaginando tudo isso? Esfreguei as mãos na cara, frustrada. As duas últimas semanas tinham sido diferentes entre nós e agora parecia que eu podia perdê-la, num piscar de olhos, a sentindo escorregar por entre os meus dedos de volta para ele. Argh.

_Oi? Mia?

fevereiro 09, 2011

À labuta

Responde. Responde. Responde. Eu olhava fixamente para a tela do celular, apoiado na mesinha de provas, mordendo a ponta do meu pobre dedo polegar. Sabia que ela já havia saído da faculdade há horas, tempo suficiente para voltar para casa e almoçar dez vezes junto com a família, se quisesse – o que evidentemente acabava com a brilhante teoria à qual me apeguei a manhã toda de que ela não tinha levado o celular para a aula ou o deixara desligado o tempo todo. Puta que pariu, pensei, por que ela não me responde?

_Não tem trabalho pra fazer, não? – um dos fotógrafos freelancers do estúdio passou por mim e riu.
_Não – murmurei, obcecada, sem tirar os olhos da mesa ou a mão da boca.
_Tá fácil essa vida de assistente, hein...
_Não enche... – curvei as sobrancelhas em desaprovação.
_Ô, bravinha... – jogou um cartão de memória na minha frente – ...descarrega isso aqui pra mim, vai!

A contragosto, peguei o cartão, levantando da cadeira, e o coloquei para baixar num computador a poucos metros dali. Assim que comecei a passar os arquivos, ele me chamou – “seu celular piscou aqui”. Voltei no mesmo segundo em direção à mesa, apressada, e peguei o telefone. Ouvi-o me zombar, ao fundo, sem prestar realmente atenção, conforme lia a resposta tardia da Mia, virada de costas para ele com o celular em mãos.

Ah. Vai se foder, mano!
 
Respirei fundo e olhei de novo para a mensagem, sem acreditar. Que absurdo. Caminhei, irritada, de volta à mesa do computador, enfiando o celular no bolso, e chequei se as fotos já tinham descarregado. Retirei o cartão de qualquer jeito do leitor e o devolvi na mão da porra do fotógrafo, saindo em direção à escada. Subi e me refugiei na cozinha, ligando para a Marina. Deu caixa postal, duas vezes. Inferno. Aí liguei para a segunda mais inteirada do assunto, a Lê, que atendeu no terceiro toque.

_Escuta. Quanto tempo demora pra digitar quatro letras no celular?!
_O quê?
_Quatro letras, no celular. Quanto tempo demora, Lê?!
_Ihh... já tá brigando? – ela riu – Que foi que eu fiz, meu?!
_Você, nada. A Mia... – passei a mão no rosto, indignada, sem conseguir continuar – ...mano, eu mandei uma mensagem pra ela faz... – olhei rapidamente no visor e calculei de cabeça – ...meu, mais de seis horas e sabe o que ela me manda de volta?! Quatro letras. Quatro!! – me alterei – Mano, eu vou dar com a cabeça na parede! É sério. Cê tem noção? Eu passei a manhã inteira grudada nessa porra desse celular, surtando, e pra quê?! Pra receber quatro... Ok, sete, se contar as reticências... Mas que se foda, sete míseros dígitos. Sete, mano. Eu vou matar a Mia, tô te falando. Você vai me buscar na droga da DP, cara, eu vou matar ela!
_Não entendi nada, calma. Qual era a mensagem?
_“Eu também”.
_Isso dá mais de quatro letras...
_Abreviado, né, porra. E ainda por cima foi abreviado!
_Ok – ela riu – Mas ”eu também”, o quê?
_...estou pensando tanto em você.
_E isso não é bom?
_Não! Claro que não! – discuti – Cara, ela vai ver o Fer hoje, mano, isso... i-isso é péssimo! Ela tinha que responder, sei lá... “Não consigo parar de pensar em ontem à noite”, “eu gosto de você pra caralho”, qualquer coisa menos isso. Qualquer merda que não fosse simplesmente concordar comigo, tipo, muito, muito vagamente. Sério, Lê, isso é uma catástrofe. Eles vão voltar ao normal hoje. Eu sei que vão. Eu já tô sentindo tudo acontecer... Vai ser o pior dia da minha vida.
_Voltar? Mas desde quando eles brigaram, meu?
_Ah, na festa, sexta. Meu, não tenho tempo pra ficar te explicando tudo, presta atenção! Eles brigaram e eu dormi com a Mia ontem e foi o máximo, sério, o máximo, e agora ela vai ver o Fer e vai ficar toda apaixonadinha de novo e vai estragar tudo. Já tá estragando, mano... Ela tá esquisita o dia todo, vai por mim.
_Nossa...
_E o que diabos quer dizer “eu tb...”, afinal?! “Eu também e queria te ver de novo”? “Eu também, mas tenho muita coisa pra pensar”? “Eu também e só”?!? “Eu também... e estou pensando em você, no Fer, na Kathleen Hanna, na torcida inteira do Corinthians...”?!?! – me irritei – Sério, me explica. Que merda ela quis dizer com isso?!
_Mano... Cê percebeu que cê tá tendo um surto, né?
_Não enche, Letícia.
_Quer dizer que ela também tá pensando em você!! Cara... relaxa. Ou manda outra mensagem pra ela, sei lá – resmungou – Como você é complicada, credo! Só tem rolo nessa sua vida aí.
_Olha, sem ofensas, mas você definitivamente não serve como Marina.
_O quê?
_Nada. Preciso desligar... – murmurei, inquieta – Mas valeu.
_Tá. Um beijo... – a Lê riu.

fevereiro 03, 2011

Sintaxe complicada

“Eei...”, comecei a escrever no celular e logo me contive. Não queria me intrometer, o assunto era deles. Não podia sair surtando com meias palavras ditas num café-da-manhã – mas, droga, como era difícil evitar.
 
O nome da Mia aguardava no campo do destinatário, acima da mensagem quase vazia. E a porra da ansiedade me tomava a cabeça, o corpo. Sentada à beira da cama, toda nua da cintura para baixo, com a mesma regata amassada de dormir e os cabelos bagunçados, os olhos fixos no seu nome na tela – judiando cruelmente dos meus lábios, nervosa.

Merda.

Tornei a digitar, sentindo uma necessidade desesperada de tomar alguma atitude, agir, fazer qualquer coisa a respeito. Argh. Precisava completar a frase, as reticências imploravam por alguma verdade minha – “eu te amo”. Não. Assim que olhei as palavras digitadas, as apaguei imediatamente, num impulso covarde e previsível. Inferno. Me sentia exposta, exposta demais – me declarar assim me deixava mais insegura do que eu conseguia aguentar. Então, voltei atrás. Respirei fundo e encarei o meu quarto, as roupas jogadas pelo chão e o samba-canção do Fer, agora largado ao meu lado, no colchão. Diz alguma coisa, imbecil... Cê precisa dizer alguma coisa.
 
E naquele momento, qualquer frase pronta serviria – “mal posso esperar para te ver de novo”. Não. “Gosto tanto de você”. Não, também não é isso. Não era nada daquilo. Argh, como eu odiava não poder dizer um simples não-quero-que-você-fique-com-ele, como queria poder pedir para que ficasse comigo. Que pensasse em mim, porra, até aquele dia acabar – e só em mim. Que deixasse o resto do mundo para lá, esquecesse os horários marcados e a conversa e o namorado, que fosse minha e não dele, naquela quarta-feira.

Mas não posso.
 
Pedir, assim, me parecia hipocrisia. Pois é, hipocrisia. Porque antes de nós duas, existiam eles dois – e eu sempre soube. Não podia sequer fingir o contrário, já que dormia ao lado da porra da evidência. Desgraça.
 
Os minutos se esticavam, aumentando, rodando no pequeno relógio que ficava no canto direito da tela. O Fer já tinha deixado o apartamento há algum tempo e eu restava ali, com o estômago embrulhado, sofrendo por antecipação. Antecipação por uma tarde que sequer acontecera ainda. Não entrei nessa sem saber, suspirei, forçando coerência goela abaixo. As minhas mãos podiam, sim, desde o começo, estar amarradas – mas os meus olhos sempre estiveram abertos. E eu sabia. Sempre soube. Não me cabia agora pedir o contrário dela, da vida dela.

Então fica quieta, caralho.
 
Passei a mão na boca, no queixo, e a desci pelo pescoço, tentando controlar o meu nervosismo descabido. Mal me aguentava, sentada ali. Impotente, desejando que as coisas fossem diferentes, que ela não precisasse ir se encontrar com ele. “Tô pensando tanto em vc, meu”, digitei. E num gesto impensado, idiota, enviei. Aí no segundo seguinte, claro, me bateu um desespero. Merda, o que foi mesmo que eu escrevi?, tentei lembrar ao ver, piscando na tela, uma mensagem automática – “envio concluído com sucesso”.

Entrei, apressada, na caixa de saída e reli a frase. Tá. Aquilo me tranquilizou, não tinha sido tão ruim assim. Agora já chega, respirei fundo mais uma vez e larguei o celular na cama, decidida a ir trabalhar.
 
Preciso de uma cueca.

fevereiro 02, 2011

Do lado de lá

Um Mississipi, dois Mississipi, três Mississipi... doze Mississipi, treze Mississipi, quatorze Mississipi, quinze Mississipi... e vira. Um Mississipi, dois Mississipi... quatorze Mississipi, quinze Mississipi... e vira, de novo. Assim eu seguia, milagrosamente em pé antes da hora, no meu ritual rumo ao perfeito queijo quente de frigideira. Mal-vestida num samba-canção roubado do Fer uns anos antes, com uma regata branca velha e um ótimo humor – acordar com tempo suficiente para um café-da-manhã decente era tão raro na minha vida que, né, tais ocasiões mereciam pequenas recompensas. Mesmo que elas gerassem grandes louças.

Foda-se, tenho tempo, sorri e virei novamente o meu futuro lanche-mega-delicioso no fogão.
 
Olhei mais uma vez para o relógio na parede, entre quinze Mississipis e outros quinze do lado oposto, e notei as horas. 7:04. Sequer lembrava quando fora a última vez que pulei da cama assim tão cedo. Ainda mais depois de ter adormecido às 4-e-sei-lá-quantas, falando com a Mia no telefone. Maravilha. As fatias de pão-de-forma já mostravam os primeiros sinais de que iam dourar por fora e o queijo começava a derreter entre elas, me deixando realmente com fome. No meio do processo, ouvi o Fer entrar pela porta que dava no corredor.

_O que cê tá fazendo aí? – percebi ele se aproximar, atrás de mim.
_Pode tirar o olho, hein, é o meu café-da-manhã...
_Não falei nada... – ele riu e veio para o meu lado, se apoiando na pia e roubando um pedaço do queijo que eu deixei para fora da geladeira; enrolou uma fatia, olhando sei-lá-por-quê para a minha roupa, e depois comeu um pedaço – ...ô, essa aí não é minha?
_O quê? A cueca?!
_Acho que é, não é? – perguntou, mais interessado em comer o queijo do que em saber a resposta; aí me observou, distraído, conforme eu seguia contando Mississipis.
_É, sim...
_Espera... e isso aqui? – empurrou o meu cabelo para trás, descobrindo o meu pescoço, e riu, sentando-se na pia quase de frente para mim – Isso aí, com certeza, não é meu. De quem é, hein?
_Cala a boca. De ninguém, babaca.
_O quê? – ele riu, pegando mais uma fatia do queijo e me enchendo de propósito – Vai dizer que cê se queimou com a frigideira?
_Mano, sai daqui, vai... – eu o expulsei, ameaçando-o com a espátula suja, sem vontade de discutir o chupão que a sua namorada tinha me deixado na noite anterior.
 
Desavisado, o Fer achou graça. Desceu da pia e deu alguns passos atrás de mim, até a geladeira, tirando um resto de suco da prateleira de baixo. Deu uns goles direto da caixa, enquanto procurava pelo cereal no armário. Já estava pronto para sair para o trabalho e mais arrumado do que o normal para uma manhã de quarta-feira – com um jeans limpo, a barba feita, regata branca e uma camisa aberta por cima. Estranhei.
 
Que seja, voltei para o meu queijo quente, mais uma rodada de Mississipis e... pronto! Retirei o sanduíche da frigideira com a espátula, feliz, e o coloquei num prato vazio que aguardava na pia, ao meu lado. Aí peguei umas folhas de papel toalha e me sentei com o Fer na mesa, esnobando o seu reles café-da-manhã com o meu lindo sanduíche.

_Acordou cedo por quê?
_Sei lá, caí da cama. Levantei tão de boa hoje, meu, o despertador mal tocou e eu já tava em pé. Vai entender... – mordi o primeiro pedaço do meu queijo quente, magnífico, e olhei para o Fer conforme mastigava aquele pão crocante delicioso – E você? Tá todo arrumado aí, por quê? Foi promovido?!
_Promovido a ficar no mesmo cargo por mais dois anos, né, só se for... – revirou os olhos, frustrado com a absoluta falta de perspectiva no emprego – ...nem, meu. Vou encontrar a Mia hoje, mais tarde, pra gente conversar.

Ô, inferno. Como eu fui me esquecer?

_Hum... – tentei soar natural – ...boa sorte lá.
_Valeu, meu...
_Vocês... – continuei, sem ter certeza se queria ouvir a resposta – Vocês tão bem?
_Ah, acho que sim. Ela me ligou ontem, falou um monte. Só que eu tava no trampo, né... não dava pra conversar direito, então a gente marcou de se ver hoje pra falar com mais calma. Mas ela nem parecia brava mais...
_É? O que ela disse?
_Sei lá, falou uma pá de coisa. Que acabou exagerando, que gosta mesmo de mim. Ficou toda sentimental no telefone – deu mais uma colherada no cereal – Não entendi porra nenhuma, foi do nada...
_Hum...
_É foda, mano... Eu curto ela pra caralho, a gente se dá mó bem. Mas, porra, não entendo essas coisas! Num dia não quer falar comigo, no outro diz que tá com saudade. Me deixou o fim de semana todo na merda, meu... Sei lá. Queria que as coisas só ficassem bem entre a gente.
_Mas não era só o lance lá da... d-da festa?
_É. Ou, sei lá... Às vezes, acho que ela só quer uma desculpa pra terminar comigo, sabe? E-ela... Não sei, ela... fica distante, do nada, não quer fazer nada, não quer vir aí, não quer porra nenhuma comigo – argumentou, frustrado, deixando a colher de lado no prato e se explicando – E depois volta como se nem tivesse acontecido. Dessa vez foi igual, meu. Porra, fui até a casa dela domingo e ela nem me deixou subir, mano. Aí do nada, tá tudo bem, como se não tivesse rolado porra nenhuma, tudo lindo e azul no Paraíso. Sei lá, é estranho...
_Ah, Fer, não sei... às vezes, é só o jeito dela.
_É, só que... s-só que não era, cara! A Mia não era assim. Juro que não era, ela era muito sossegada. Faz uns meses só que ela entrou nessa de...
_De...?
_De, não sei, surtar o tempo todo. Me ama num segundo e, no outro, não quer nem que eu encoste nela, quer ficar sozinha. Antes a gente não conseguia nem tirar as mãos um do outro, porra! E eu curto ela pra cacete, sabe, eu sei que ela gosta de mim, mas... – balançou a cabeça – Puta, mano, é foda.
_É... – arqueei a sobrancelha, encarando a mesa.
_Velho, vai ser a mesma história de sempre. Cê pode ter certeza! Quer apostar quanto que eu vou chegar lá hoje e ela vai querer que eu vá com ela pra casa, vai querer foder a noite inteira, fingir que nem aconteceu? Mano... conheço, tô falando. Aposto o que cê quiser.
_Uhum... – empurrei o prato, discretamente.

Um queijo quente perfeito, desperdiçado. Perdi a fome.