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junho 26, 2010

Friday is casual (sex) day

O café-da-manhã foi constrangedor – e adorável.
 
Talvez fosse o pé da Mia no armário ou quem sabe era só coisa da minha cabeça, mas sentar numa mesa com os pais dela enquanto eu fingia ser sua “amiga”, depois de uma noite daquelas, me fazia sentir como uma adolescente de novo. A começar que eu não tomava café-da-manhã numa mesa de família há anos. Mal sabia o que fazer comigo mesma. Quando comemos com as amigas da Mia ali, na manhã seguinte à do UFC, os pais dela não se sentaram conosco. Mas agora, sim. E como se não bastasse a minha inabilidade absoluta em socializar com gerações mais velhas, ainda tinha o fato de que meia hora antes a filha deles estava sentada na minha cara.
 
Aquele sorriso não saía do meu rosto por nada. Numa tentativa de disfarçar o máximo que podia, fiquei tomando gole atrás de gole de suco. Me escondendo naquele copo e curando a ressaca ao mesmo tempo – numa proporção de 10g de comida no garfo para cada 5 litros de laranja espremida. A Mia me olhava de volta e sorríamos, às escondidas. O pai dela sequer se dava conta, engravatado e enfiado em um jornal, enquanto a mãe tentava puxar assunto comigo e analisava a minha caminhoneirice da cabeça aos pés. Ali, com o cabelo bagunçado de tanto comer a sua filha e a mesma roupa cheirando a cigarro da noite anterior.
 
Foi mal, sogrinha.
 
A Mia ria. Estava com uma regata branca por cima duma calça rasgada, que eu escolhi enquanto ela tirava todas as roupas do armário e me pedia para ajudá-la, ambas sem nenhuma intenção de realmente nos vestirmos, enroladas nuns beijos incessantes. Só quando sua mãe nos chamou para tomar café pela terceira vez é que nos trocamos, às pressas. Agora a Mia prendia o cabelo num rabo, meio de qualquer jeito, sentada à mesa. E eu a observava, secretamente maravilhada com o quanto ela era linda – puta merda.
 
Assim que terminamos o café-da-manhã, nos livrando daquele momento obrigatório constrangedor, pulamos da cadeira e nos apressamos para sair o quanto antes do apartamento. Roubei um croissant para comer no caminho e me despedi dos meus “sogros”, certa de que não havia causado nenhuma boa impressão. Ainda assim, o pai da Mia nos ofereceu carona. Menti a existência de um carro "estacionado logo ali na esquina" – e duma carta de motorista, aliás – e recusamos educadamente.
 
Descemos de elevador, aliviadas. Até que enfim, livres.
 
O dia estava gostoso. Saímos andando pela rua, puxando papos furados e cigarros do bolso. A Mia não conseguia parar de rir, zombando da minha performance desconfortável em frente aos pais dela, e eu sorria, envergonhada. Comi meu croissant no ponto e entramos no primeiro ônibus que passou em direção à Consolação, nos apertando com aquela multidão-das-8-e-meia típica de São Paulo.
 
Entre mochilas e corpos em excesso, coloquei minha mão ao redor da Mia, segurando-a nas costas para que não se desequilibrasse com os trancos do busão, enquanto eu me apoiava num dos canos de metal. Conversamos e rimos o caminho todo, num estado bobo de felicidade, sem sequer notar o cansaço que ficara de uma das noites mais longas – e incríveis – daquele ano.
 
Descemos nas redondezas do Mackenzie. Mas aquele já não era o meu lugar – estava abarrotado de amigos dela e de gente que conhecia o Fer. Uns prováveis dedos-duros. Ou seja, eu não podia me meter à besta – uma tendência na minha vida. Então calculei os meus passos. Queria aproveitar o máximo de tempo possível ao lado dela. Observei atenciosamente cada esquina e porta e comércio fechado ao longo do caminho, freneticamente movimentado pela massa paulistana. Até encontrar um esconderijo: um bar fechado, cuja porta entrava cerca de dois metros parede adentro. Sem pensar duas vezes, meti a Mia ali dentro e lhe roubei um último beijo.
 
Meu deus. Eu precisava disso.
 
A Mia sorriu. E voltamos para a rua com na mesma rapidez com que sumimos dela. Acompanhei-a até a entrada do Mackenzie que ficava na R. Itambé e tentei não me despedir mais. Apenas voltei os passos, andando de costas na calçada, e sorri para ela. A Mia se virou e entrou, atrasadíssima para a aula. Caralho. Aquilo tinha sido maravilhoso – tudo aquilo. Eu era a mina mais feliz de toda a porra do mundo. Voltei até a Consolação repassando na minha cabeça cada segundo daquela noite, cada centímetro daquela mulher. Eu nunca estive tão feliz.
 
Entrei e saí do busão, sem sequer perceber, completamente imersa nos meus próprios botões. Não sei como cheguei no estúdio, mas cheguei; e passei por todo mundo sem abrir a boca, apenas sorrindo de ponta a ponta do rosto. Sentei na minha cadeira e olhei para a frente, dando de cara com um dos meus colegas engraçadinhos de trabalho, que me observava pacientemente.
 
_Você não dormiu hoje, né? – ele riu.

junho 22, 2010

Muridae nata

_Hum... – sorri, acariciando o seu rosto – ...cê ainda tá com a tatuagem que eu fiz.
 
O raiozinho desenhado de caneta já começava a desbotar debaixo do seu olho. Ela sorriu de volta para mim. Eu estava apoiada nos cotovelos, de barriga para cima no colchão, e a Mia sentada ao meu lado. As suas mãos percorriam a minha pele, num carinho desatento e gostoso. E as minhas seguravam o seu rosto. Foi quando ela desviou a cabeça e olhou para o relógio na parede, respirando fundo.
 
_Meu, não acredito que vou pra faculdade assim...
_Assim como?
_Assim... – ela riu – ...sem dormir nada!
_Ué. Mas cê não precisa ir...
_Ah, não preciso? – ela riu, de novo.
_Não... – eu sorri, olhando para ela como se o simples fato de eu negar tal necessidade fosse o bastante para desfazer a sua existência – ...não precisa, não.
_E você também não precisa ir trabalhar, então?
_Ah! Pra tudo dá-se um jeito...
_Hum. Cê não acha que já causou estrago o suficiente?
_Estrago em quê?
_Em mim... – ela riu, inclinando o corpo para me fazer cócegas, me provocando – Na minha vida! Na minha cama! Não, hein?
_Não.
_Não?!
_Ainda dá para estragar mais um pouquinho... – pisquei na sua direção, sorrindo.
_Ah, então cê acha que não foi o bastante?
_Isso não foi um estrago... Foi meia noite de caos controlado.
_Ahh... sei – ela achou graça, indignada – E o que mais cê poderia querer de mim?
_Tudo, oras. Todo o resto.
_Olha, não sei se tem muito mais para eu te dar... – ela mordeu a língua, numa indecência quase acidental – ...mas cê pode pegar o que quiser.
 
Eu ri, puxando-a na minha direção para beijá-la.
 
_Que perigo, garota... – murmurei, com a boca já na sua e os dedos afundados na lateral do seu corpo.
 
A Mia segurou o meu rosto com as duas mãos. E eu a puxei para cima de mim. Você é minha, pensei. Enquanto a abraçava pela cintura e a apertava contra o meu corpo, nuns amassos despreocupados. Desses que prolongam a manhã seguinte de um encontro perfeito. Mas não era tão simples assim. E a contragosto, a realidade me bateu violentamente. Não, não na consciência – que é exatamente onde deveria ter batido. Me bateu foi no peito, como uma pancada que me doeu de repente. Inferno.
 
A Mia não era minha.
 
E uma hora ou outra, aquilo ia acabar. Teria sido tudo isso mesmo? Ou logo ela estaria de volta nos braços do Fer? Merda. Senti a angústia me subir até a garganta, enquanto a abraçava ali. O tipo de dor que sufoca, que te faz sentir encurralada. Como um rato contra a parede. Estava metida até a porra do pescoço em um problema sem solução – perdidamente apaixonada pela namorada do meu melhor amigo. Agora mais do que nunca. Porque depois de ter ela assim, depois de cada maldito segundo ao seu lado naquela madrugada, eu não ia conseguir voltar ao normal. Aos olhares escondidos e à convivência no meu apartamento, aos beijos dados quando ninguém está olhando.
 
Pois é. Quem se acha esperto demais para a ratoeira, acaba se ferrando mil vezes mais. O orgulho te leva direto até a boca do gato, faz você continuar e continuar e continuar, errada e cheia de si. E quando você se dá conta, já não tem mais volta. Eu tinha ido longe demais. Era incapaz de sequer lembrar por onde entrei. Tudo o que me restava agora era esperar para ser mastigada e digerida de vez por aquela merda toda. Era só questão de tempo.
 
Então cumpri meu papel. Afinal, quem se mete pelos buracos e esgotos da vida, sabe ser sujo como ninguém. É instintivo. Deslizei sem dificuldade pelo corpo da Mia, me afundando no colchão até o meio das suas pernas. E fui beijando as suas coxas. Puxei-a contra a minha boca, num só movimento, fazendo com que sentasse na minha cara. Podia sentir o seu calor escorrer na minha garganta. Hum. A Mia suspirou como quem fecha os olhos, sentindo cada movimento da minha língua. Então moveu o quadril para frente e foi rebolando na minha boca, bem devagar. Bem gostoso. E quando aquela indecência começou a me fazer esquecer de tudo, esquecer da angústia no meu peito... Ouvimos um barulho na porta.
 
_É a minha mãe!
 
A Mia se espantou e saiu de cima de mim, num só pulo.
 
_Tá trancada, gata... – a tranquilizei, rindo, enxugando o queixo, a boca com as costas da mão.
_Não, é sério...
_Vamos fingir que estamos dormindo... – cochichei, achando graça – ...vem.
_Não dá, eu preciso ir lá... – a Mia insistiu, rindo – ...senão ela vai estranhar.
_Deixa ela bater, meu... – minhas mãos deslizaram inconscientemente pelas suas pernas – ...vem aqui comigo.
_Para! – ela me beijou, já se enroscando em mim – A gente vai ser pega!
_Tá trancada a porta, Mia...
_Mas a gente ainda precisa colocar um colchão no chão, qualquer coisa... – murmurou – ...antes de abrir... – entre um beijo e outro, sem muita determinação em sair dali – ...senão ela vai desconfiar...
_Não vai. A gente fala que chegou tarde ontem e capotou...
_Não dá. Vem... – se desvencilhou, enfim, das minhas mãos e eu ri – Vamos se trocar!
_Ah! Eu preciso por roupa também?
_Assim, né, o ideal seria ela não encontrar você pelada na cama com a filha dela...
_Hum. Quer que eu me esconda no armário?
_Junto comigo? – ela riu.
 
E eu comecei a rir também. Um encontro sapatão e já tá fazendo piadinha aí, achei graça, enquanto me rendia e me arrastava para fora da cama para buscar as roupas que deixamos largadas no chão.

junho 17, 2010

Intimidade

_Você trancou a porta?
_Eita. Não lembro...
 
E não lembrava mesmo. Álcool demais, maconha e endorfina também. Segundos antes, os passos de alguém despertaram o corredor até então em silêncio. A Mia se levantou e se apressou até a porta, rindo, virando a fechadura antes que seja-lá-quem-fosse resolvesse entrar. Boa. Depois de quase sermos pegas pela mãe dela na outra vez, era melhor evitar constrangimentos – afinal, ninguém ali queria ter que explicar para os pais dela que, sim, a filha passou a noite transando e, não, não foi com o Fernando.
 
Ia ser, no mínimo, desagradável.
 
As horas naquele quarto haviam passado eternas e maravilhosas. Intensas pra caralho. Perdemos totalmente a noção do tempo e agora a luz da sexta-feira já entrava pela janela, invadindo o cômodo contra a nossa vontade. Ou a minha. É – eu não queria que aquela madrugada acabasse. E quanto mais o sol coloria as paredes em tons amarelados, mais eu tentava me apegar a cada segundo, deitada entre os lençóis bagunçados.
 
A cama começava a esfriar sem a Mia ali, mas a preguiça me impedia de me mover no colchão. De barriga para cima e com as mãos embaixo da cabeça, sentindo minha pele descoberta arrepiar de saudades dela. Volta para cá, pensei. E a olhei de longe, em pé do outro lado do quarto. Os meus olhos acompanharam cada curva descoberta do seu corpo, conforme ela se apoiava contra a porta para escutar o movimento no corredor.
 
Estava esgotada de pensamentos sujos. E ainda que a observasse nua ali, só me restavam os sentimentos difíceis de admitir. Aqueles. Enquanto a Mia deslizava as pernas uma na outra, se esquentando, subindo e descendo os pés descalços no piso gelado. Não tinha um só vestígio de vergonha ou de desconforto no corpo. Era só ela. E eu. E era apaixonante.
 
Por mais que estivesse cansada, exausta de tantas horas acordada, tinha vontade de não dormir nunca mais. Sentia uma tranquilidade estranha. Queria só ficar ali, olhando a Mia esquentar as pernas uma na outra. Não era a memória daquela madrugada que me mantinha desperta, nem mesmo a expectativa do que estava por vir. Era só... sei lá. O jeito descomplicado como eu existia naquele momento. E eu não sentia isso há muito tempo.
 
A Mia caminhou de volta para cama e sentou-se ao lado do meu corpo, com as pernas cruzadas em cima do colchão. Ela tinha a pele arrepiada pelo frio da manhã. E pequenas marcas que minha boca e os meus dedos e os tacos do chão deixaram em suas costas. Olhei para ela como quem olha para uma parte da sua própria vida – como se fosse natural que ela estivesse sentada ao meu lado, deixando escapar um sorriso bobo de quem ficou acordada a noite toda comigo. Como se ela sempre tivesse estado ali.
 
E por um momento, eu esqueci que não.

junho 14, 2010

Marco polo

Caralho. Podia sentir intenção em cada movimento da sua língua. A Mia mal encostou em mim e eu já sabia que não ia aguentar. Não ia aguentar porra nenhuma. E talvez ela não soubesse tudo o que estava fazendo – mas que se dane, às vezes, importa mais o tamanho da fome do que como se come. Cada vez que a sua língua deslizava pela minha pele encharcada, agarrando as minhas coxas na sua direção, eu perdia a cabeça. A Mia também se contorcia, quase como se aproveitasse tanto quanto eu, metida entre as minhas pernas – e eu imaginava todo aquele tesão escorrendo pelas suas. Puta que pariu. Eu era capaz de gozar sem que aquela garota tocasse um só dedo em mim.
 
E ela encostou bem mais do que isso, puta merda.
 
Eu perdi o ar muito, muito antes de ir para o chão com ela. O meu coração também nunca foi lá de bater direito perto daquela mulher. Pulava umas batidas – parava, então voltava; e acelerava. Agora então, que nos faltava tanta vergonha, sem roupa no breu do seu quarto, disparava mais do que nunca. E eu me forçava a registrar – queria me lembrar de cada segundo daquele momento. Mas a sua boca em mim ia me tirando do sério e os segundos se esticavam e o meu corpo tensionava e se arrepiava e eu ia perdendo a sanidade o coração o ar até sentir cada extremidade do meu corpo formigar, gozando e esquecendo completamente onde sequer estava. Naquele momento, só me importava com quem, cacete.
 
Com os meus olhos ainda fechados, senti a Mia beijar a minha coxa quando terminou. E então ela subiu, deitando-se ao meu lado. E eu me forcei a recuperar rapidamente o fôlego. Precisava de um segundo e não mais do que isso – não com aquela mulher ali. Sentia vontade de comer ela até o sol nascer e se pôr e nascer de novo. Depois começar mais uma vez, puta que pariu. Abri os olhos e eles se perderam por um instante na boca entreaberta da Mia, deitada ao meu lado, ainda ofegante.
 
_ISSO FOI TÃO... – ela passou as mãos no rosto, impressionada, como se não acreditasse.
 
O suor fazia com que alguns fios do seu cabelo grudassem na sua testa. Eu a encarava, rindo, encantada pela cara de boba que ela estava fazendo. Extasiada. Havia um certo charme na forma como ela sorria, vitoriosa, depois de um orgasmo meu. Ainda podia sentir as minhas bochechas quentes e a minha pele arrepiada. A Mia me olhava de volta, como se não conseguisse achar as palavras para descrever o que sentia. Eu meio ria e meio sorria, achando graça.
 
_Eu nunca... – ela continuou desarticuladamente, impressionada – ...e-eu... juro, eu...
_Eu sei – ri.
_N-não, não, foi tipo... – ela tentava explicar com as mãos e eu ria – ...f-foi tão...
_Hmm – sorri – Foi como?
_N-não sei... Eu, e-eu tava... – suspirou – ...digo, e-era em você... mas eu senti quase como se... c-como se fosse...
_Em você?
_MEU, SIM!
 
Ela passou a mão no rosto mais uma vez e me encarou de volta, num misto de curiosidade e tesão, empolgada. Eu ria.
 
_CARALHO, COMO ISSO É POSSÍVEL? E-eu... nunca senti nada assim... – ela apoiou o braço embaixo da cabeça e se virou na minha direção, impressionada pela sincronicidade biológica entre nossos corpos – Meu deus, é... é genial!
_Cuidado, hein... – eu a adverti, brincando – ...esse sentimento, essa coisa aí que cê sentiu, vicia.
_N-nossa, imagino, porque eu... e-eu nunca... – ela prosseguiu, ainda tropeçando na própria ansiedade de falar, empolgada – ...é que... não sei, caras são tão diferentes. Sei lá! Em tudo, não dá pra... sabe? M-mas você... – me olhou, como se me confessasse algo inédito – ...eu, e-eu sabia exatamente o que tava acontecendo, o... o q-que o seu corpo tava sentindo, não sei explicar. Parece que sobe por dentro, dum jeito visceral e, e tão gostoso, caralho... – suspirou – ...é intenso.
 
Eu a observava, achando mais graça ainda. Era como assistir alguém contar sobre a primeira vez que, sei lá, andou de bicicleta. Eu ri. E a Mia me deu um tapa no braço – como se soubesse que ria dela. Nossos olhos se cruzaram por um instante e então coloquei a mão em seu rosto, num impulso de estar perto dela de novo. Senti o meu coração perder outra batida. “É. É intenso”, murmurei. A Mia sorriu, se aproximando do meu corpo com intimidade. A sua boca encostou na minha e nos abraçamos no chão do seu quarto, num beijo perigosamente lento. Desses que fodem a sua cabeça, que mudam o rumo das coisas.
 
Caralho.  
 
Desci as mãos até a sua cintura e a puxei para perto de mim. Mas a Mia se desvencilhou, de repente, inclinando a cabeça e subindo os olhos como se procurasse algo atrás de nós. Que cê tá fazendo? Olhei para a mesma direção, sem entender, e então vi o maço dela largado sobre a sua cama. Ah, isso. Ainda consideravelmente bêbada, a Mia escorregou para fora dos meus braços e se virou, engatinhando no chão. É. Engatinhando, sem uma porra duma roupa no corpo. Essa desgraça de mulher quer me matar do coração.
 
Continuou até chegar na cama, onde apoiou os antebraços desajeitadamente, ainda de joelhos no chão, tirando um baseado que estava guardado no maço e acendendo-o ali. Os meus olhos acompanhavam cada movimento dela. Me virei no chão e me apoiei nas mãos para ir até lá, dando-me imediatamente conta de que estava tão embriagada quanto ela.
 
A Mia deu um trago, apoiada contra a cama. Nua, com os joelhos metidos no piso de taco e aquela raba que – só por Deus. Os fios castanhos de cabelo desciam pelas suas costas em meio às flores de cerejeira, tatuadas na lateral do seu corpo. Me aproximei, a abraçando por trás, e beijei o seu pescoço. A Mia colocou o baseado na boca e se ajeitou contra o meu corpo, ajoelhado atrás dela. Senti sua pele me aquecer.
 
_E aí... – fez graça – ...qual foi a nota?
_A nota?! – ri, sem entender.
_É. Fui boa aluna?
 
Roubei o baseado dos seus dedos e dei dois tragos, segurando a fumaça antes de soltá-la para cima. “Foi” – respondi, rindo. Mas você não precisa que eu te diga, garota, revirei os olhos. A minha outra mão a segurava pela cintura. Hum. Inconscientemente, desci os dedos pelo contorno do seu corpo, acompanhando a curva da sua bunda. Abaixei os olhos por um instante e a observei entre meus dedos. Ali. Gostosa do caralho, suspirei, numas quedas de pressão. A Mia então se inclinou na cama, pressionando o quadril contra o meu corpo. Bem na sacanagem. Desgraçada. Senti a sua pele esbarrar nos meus pelos e um calor subir dentro de mim. A puxei, pressionando-a ainda mais contra meu corpo, e então encostei a boca em seu ouvido:
 
_Agora que cê já sabe que gosto eu tenho... – eu disse, imprestável, devolvendo o baseado na sua mão – ...deixa eu te mostrar o que fazer com o resto do corpo.
 
Ela tragou mais uma vez e fechou os olhos, inebriada, sentindo cada toque sujo da minha boca. Beijei seu pescoço, mordendo a sua pele, e fui descendo pelas suas costas, enquanto as minhas mãos subiam entre as suas coxas. A Mia continuava molhada – cacete. Escorreguei os dedos para dentro dela e então girei a mão. Encaixando a posição. A Mia estremeceu e enfiou o rosto no lençol da cama, com o baseado ainda aceso entre os dedos. Ouvi ela gemer. E deslizei a boca pela sua bunda, depois a língua – chupando ela por trás, enquanto a fodia.

junho 11, 2010

[ CONTEÚDO EXCLUSIVO ]

AVISO: Os próximos 2 posts foram escrito exclusivamente para o livro do Fucking Mia e não estão disponíveis aqui. Os títulos são "Amor, amor" e "Olha...".  

O livro do Fucking Mia está sendo preparado com muito carinho, em comemoração aos 10 anos de blog. O novo conteúdo está sendo escrito desde meados da pandemia e a ideia é lançar em breve! ♥

Se você quer ser avisada(o) sobre o lançamento do livro, deixe seu e-mail aqui:


junho 08, 2010

A calma antes de chover

O elevador subia eternamente em silêncio. Cada uma num canto – os olhos dela em mim e os meus nela, invariavelmente. Um a um, conforme os andares passavam, a nossa respiração se intensificava. E a tensão crescia. Sem tirar os olhos uma da outra nem por um segundo.
 
A Mia se apoiou no espelho e encostou a cabeça para trás, me encarando, enquanto cruzava as pernas naquele vestido desgraçado. Tão curto que eu podia ver uma das flores de cerejeira tatuadas na sua coxa – só o comecinho duma pétala. Das que desciam pelas suas costas até o seu quadril. Cacete. Ela estava maravilhosa. Com ares de fim de rolê, sabe, como se tivesse cambaleado para fora do boteco mais decadente da Augusta às seis da manhã, bêbada e tatuada, com os braços descobertos e o cabelo levemente bagunçado, torcido sobre o ombro, meio de qualquer jeito, depois de dançar a noite toda. Tinha só alguns fios soltos sobre seu rosto.
 
Bem o tipo de garota que eu gostava.
 
Sentia o meu corpo inteiro pender na sua direção, sedento, numa vontade de estar logo com ela. E a Mia me observava de volta, com certa sacanagem de leve, sem dizer nada. Nós duas sabíamos o que ia acontecer e puta merda – por mim, a gente se comia aqui mesmo, garota. Mas aquele jogo silencioso me empurrava de volta para a parede do elevador. Talvez eu devesse estar mais nervosa, depois de tanto tempo, mas não estava. Me sentia totalmente presente. Ali, com ela. Era só aquela porra daquele andar que não chegava nunca. Caralho, respirei fundo.
 
Até que, de repente, a porta se abriu. Nos despertando daquele estado embriagado de tesão expectativa. Andamos em direção ao seu apartamento e a Mia se agachou em frente à porta, desamarrando o cadarço do coturno para pegar a chave que ela tinha “guardado” presa ali. Achei graça na estratégia e entrei atrás dela na sala. Todas as luzes estavam apagadas. Se dirigiu até a cozinha, acendendo apenas uma lâmpada sobre a mesa.
 
_Olha, eu sei q-que... – ela falou arrastado – ...e-eu não preciso beber mais n-nada... assim, p-por um mês... – fez graça, enquanto abria a geladeira e debruçava-se rapidamente dentro dela – ...mas é q-que tem... cerveja... em a-algum... lugar... p-por aqui.
 
Eu ri, me sentando em cima duma bancada. Logo atrás dela. Aí a Mia fechou a porta da geladeira com o pé, meio desequilibrada, e se virou na minha direção com duas latinhas nas mãos.
 
_Você bebe também, né?
_Manda... – sorri.
 
Me entregou uma das latinhas e eu a abri, apoiando os cotovelos nas pernas, ainda sentada na bancada. Ganhávamos tempo. A Mia encostou na pia, me encarando. E o clima entre nós voltou. Cacete, como é gata, meu deus. Podia ver ela se mover milimetricamente, com os olhos em mim, intrigada. Colocou as mãos perto de onde eu estava, as esbarrando na lateral dos meus joelhos, enquanto eu dava o primeiro gole. Como se o seu corpo confiasse em mim. E nossas peles mal pudessem esperar para se encostar mais uma vez. Bebemos a cerveja inteira assim, quietas, nos olhando e sorrindo. Nós duas sabíamos onde aquela tensão toda ia dar – com sorte, é, na cama.
 
Matei o último gole, uns minutos depois, e fiquei em pé no chão. E olha, a minha vontade era de colocar aquela garota contra a primeira parede que visse pela frente. Mas, então, a Mia me perguntou se eu não queria “deixar minhas coisas” lá no seu quarto e foi indo em direção ao corredor. Que coisas?, achei graça, com a carteira e o maço enfiados no bolso de trás da calça e ambas as mãos livres, mas tá. Observei ela caminhar no escuro, descalça e com os coturnos na mão.
 
E a segui.
 
A Mia entrou primeiro no quarto, abrindo a porta e acendendo a luz, caminhando até o armário para guardar as botas. E eu entrei segundos depois, fechando a porta e apagando a luz, de novo, caminhando até onde ela estava. Encostei a mão na sua cintura, deslizando os dedos sobre seu vestido. E pude ouvir a sua respiração acelerar no breu. Aproximei o meu corpo das suas costas, me movendo deliberadamente devagar, e beijei o seu ombro. Bem de leve. A sua pele estremeceu. Senti cada poro, como se a minha pele arrepiasse junto.
 
E fui subindo a boca. Pelo seu ombro, pela curva do seu pescoço. E então a sua nuca, levantando o seu vestido – despindo-a continuamente. Até tirá-lo por inteiro e jogar no chão. Arranquei a minha regata, então, e encostei nela de novo. A Mia suspirou, assim que o meu peito tocou nas suas costas. Virou o rosto e apoiou a cabeça para trás, me beijando. Seus dedos se entrelaçaram no meu cabelo, me segurando mais perto. Com uma vontade intencionada. Escorreguei as mãos pela sua cintura e pelas dobras na sua barriga, tocando cada centímetro da sua pele descoberta. Sentindo o seu corpo pesar contra o meu, com a cabeça apoiada no meu ombro. Nossa respiração ia oscilando, nuns beijos cada vez mais fortes. Agarradas uma na outra. Puta merda. E aí, num só movimento, desci meus dedos para dentro da sua calcinha, acompanhando suas curvas até o meio molhado das suas pernas.
 
Grosseria, eu sei.

junho 04, 2010

D2

E o que aconteceu
Foi mais ou menos assim:

“Quer subir?”
Ela disse pra mim
“Quer ficar?”
Ela disse pra mim
“Vai com calma, vai”
Ela disse pra mim

Por amor ou besteira
Foi o que ela disse pra mim

Aí já era, né...

(Marcelo D2)

Amassando o resto

Ok. Matematicamente falando, não faz o menor sentido. Já não tinha muita lógica antes, para falar a verdade, e aí só piorou. Ainda assim, quando sentamos no banco de trás daquele carro, na saída do bar, no mesmo lugar onde mal couberam quatro pessoas na ida fomos capazes de encaixar a mesma quantidade de pernas... e mais duas mãos dadas.
 
A minha e a da Mia.
 
Espremidas entre as nossas pernas. E consequentemente, espremendo ainda mais o resto dos passageiros naquele pequeno carro. O mais impressionante é que ninguém reclamou dos centímetros a mais de espaço ocupado. Pelo contrário: nós quatro voltamos mais felizes e animados do que antes no banco de trás. Embriaguez é uma benção, né? Bastou um pouquinho de ar fresco, assim que pisamos para fora do bar, e todo mundo despertou magicamente. Aí, claro, voltamos o caminho inteiro atazanando o pobre do nosso motorista, o Gabriel.
 
Anestesiados de qualquer tipo de dor ou incômodo, devido a toda tequila, éramos pura encheção de saco. Em alto e bom som. Até a Mia deu uma acordada e, sob o efeito da saideira, também tomou a liberdade de aborrecer o meu querido amigo junto a mim e os seus colegas publicitários. Não me lembro bem qual era a piada – aliás, mal lembro do caminho de volta –, mas envolvia gritos súbitos e a probabilidade séria de um acidente automobilístico caso tivéssemos sucesso em assustar nossa infeliz vítima ao volante.
 
Quando chegamos em frente ao prédio da Mia, estávamos todos rindo mais do que o normal. Menos o Gabriel – que revirava os olhos para nós pelo retrovisor e apressou a descida da Mia do carro. Rabugento, depois de tanta asneira gritada em seu ouvido, sugeriu que nós três também saíssemos junto e aproveitássemos para ir à merda. Aparentemente a nossa má companhia já não era bem-vinda. Mas todo mundo ignorou o seu mau-humor e ficou. Inclusive eu.
 
Não – espera.
 
Não sei se as coisas aconteceram rápido demais ou se foi culpa da bebida, mas quando dei por mim, a Mia já havia me dito “tchau” e o meu amigo impaciente estava prestes a sair de novo com o carro. Merda. As rodas chegaram a soar no asfalto, antes que eu caísse na real e ordenasse desnorteada para ele parar, freando nem um metro depois. O Gabriel soltou o volante e se virou para o banco de trás, com raiva, me fuzilando com os olhos.
 
“Deixa eu sair”, pedi, às pressas. A sua namorada desceu do carro e abaixou o banco, me deixando passar. Desci correndo, com o motor ainda ligado, e fui atrás da Mia na calçada. Ela estava a alguns metros mais para frente.
 
_Ei – enfiei as mãos nos bolsos e a chamei – Não ganho um beijo de despedida, meu?

junho 02, 2010

Bochechas amassadas

_O que cê tá pensando aí?
_Não sei... – a Mia respondeu, sonolenta, com o rosto apoiado na mesa – ...só pensando.
_Hum... – ri – Acho que eles vão chutar a gente daqui logo menos.
 
A Mia sorriu. Parecia imersa em seus próprios pensamentos, sem realmente prestar atenção na conversa. Os seus olhos castanhos me observavam de perto, com aquela lassidão bêbada, como se levassem minutos inteiros para percorrer cada milímetro do meu rosto. E se perdiam por alguns instantes, até reencontrarem os meus olhos.
 
_O que é “desde sempre”? – ela perguntou, de repente.
_Desde sempre?!
_É. Você disse... lá fora... que me queria o tempo todo, “desde sempre”.
_Disse?!
 
Indaguei, com o rosto ainda na mesa e embriagada, tentando me lembrar quando tinha dito aquilo. A Mia achou graça.
 
_Disse, sim... – ela riu e a moleza dela começou a me contagiar – O q-que... cê quis dizer?
_Não sei... a-acho que isso mesmo, o que eu disse.
_Mas... Não pode ser desde sempre.
_Por que não? – achei graça.
_Porque não faz tanto tempo que...
_Eu quis te beijar quando te vi no Starbucks – a interrompi, numa sinceridade bêbada, explicando – Assim que o Fer te apresentou pra mim pela primeira vez.
_Nossa, nem lembrava do dia que te conheci...
_Obrigada pela parte que me toca, hein?
_Boba... não foi isso que eu quis dizer – ela sorriu – Acho que só... n-não lembro de como foi direito...
_Cê tava sentada numa poltrona. E eu cheguei e pensei “puta merda, que mina gata” – ri, numa confissão apaixonada, alcoolizada – Eu te achei maravilhosa. E assim que cê abriu sua boca, que começamos a conversar, sei lá, a gente se deu muito bem. Lembro que uma hora cê disse que a Tina Bell era a sua obsessão adolescente...
_Nossa, sim.
_E a gente ficou falando dela, da Kathleen Hanna, da Brody Dalle, da Elisa do Dominatrix... Essas muié tudo aí. E eu pensei, “mano, como essa mina não é sapatão?”.
_Gente – a Mia riu – Não lembro de nada disso.
_Nada?
_Ah, eu lembro do dia, mas não do que a gente falou ou o que eu pensei sobre você. Cê era só a mina que morava com o Fê. E essa história de lésbica não colava muito para mim...
_Como assim? – ri – “Essa história”?!
_Ah, eu achava que era desculpa dele para eu não ficar com ciúmes...
_Mano... – eu tirei com ela – Cê é muito paranoica!
 
A Mia deu um sorriso envergonhado e eu ri, os seus olhos estavam afogados em álcool. Haja tequila nessa garota. A verdade é que eu lembrava de cada segundo do dia em que a conheci. Podia descrever exatamente o que ela estava usando e cada vez que olhou na minha direção. Sabia de cor cada palavra do que conversamos. E meu deus, como eu invejei o Fernando naquele dia. Lembrava de sair do Starbucks com uma sensação estranha, que eu não entendia. E que demorei meses para entender – é.
 
_Mas, então, qual a primeira lembrança boa que cê tem de mim?
_Hum... – a Mia pareceu pensar – ...não sei. Pra falar a verdade, acho que foi um dia que você me chamou no seu quarto. Que fumamos ouvindo Zappa, cê lembra disso?
_Meu... – eu ri – Foi meses depois da gente se conhecer!
_Tá... Não é a primeeeira coisa que eu me lembro, mas é a primeira memória inteira. Sabe? Acho que foi a primeira vez que a gente passou tanto tempo junta... Antes, sei lá, cê era só a mina descoladinha que morava com o Fê e eu achava esquisito – ela explicou e eu ri, indignada – Mas naquele dia a gente se divertiu muito. E foi do nada, achei que ia ficar lá plantada na sala até o Fê voltar e cê foi tão legal comigo...
_Eu não estava sendo legal, eu queria te beijar... – brinquei.
_Né? – ela riu e bocejou, com os olhos já quase se fechando, como se o sono tivesse batido de repente – Eu sinto que é tão fácil ficar perto de você... e-eu gosto quando... a gente fica a-assim... pertinho.
 
Os olhos da Mia se fecharam momentaneamente. Como se cochilasse na mesa, só um pouquinho, depois de uma noite com descansos de menos e tequilas de mais. Eu, por outro lado, sequer piscava – embriagada e apaixonada, observando-a, com o meu rosto também deitado na mesa. Podia ficar ali para sempre. Cê é linda demais, garota. A Mia tinha um piercing no nariz, uma argola fininha, que agora se amassava contra a sua bochecha. E um raiozinho minúsculo, desenhado logo abaixo do canto do olho, que fiz com uma caneta roubada do bar – em meio a uma conversa sobre tatuagens no rosto, quase uma hora antes.
 
Caralho. Não queria que essa noite acabasse.
 
_Hmm... – a Mia abriu os olhos do nada, por um instante, ainda sonolenta – ...e antes que eu me esqueça: a She-Ra e o He-Man são irmãos, sim.
_O quê?! 
_Não discuta.
_Mas eles... – eu ri, achando graça no retorno inesperado do assunto – ...argh, tá. Que seja. Só não conta pro Gabriel – cochichei – Senão ele vai ficar insuportável.

A resistência

A tiazinha da limpeza já começava a varrer o chão do bar e os atendentes empilhavam os copos molhados no balcão. E nós continuávamos lá, resistindo. A Mia estava com a cabeça encostada na mesa, ouvindo a discussão fervorosa – e sem sentido – que eu estava tendo com o Gabriel. Os outros nos ignoravam em conversas paralelas, igualmente embriagados e animados.
 
Fim de festa total, aquela decadência. As luzes acesas destruindo completamente o clima. E a gente ali, insistentes, abusando da paciência do segurança, que nos olhava feio a cada dez segundos. Virei para trás, puxando um cigarro do maço e implorei para o tal segurança – com os olhos e um gesto torto, mais ou menos compreensível – que me deixasse acender lá dentro. Ele negou, claro. E eu acendi mesmo assim. Traguei três ou quatro vezes rapidamente, antes que ele atingisse a mesa e ordenasse grosseiramente que eu o apagasse.
 
Bosta.
 
Esses seguranças de bar parecem aqueles assassinos em filmes de terror, que andam numa lentidão constante e macabra, mas ainda assim conseguem te pegar. Não importa quanto você corra – eles sempre te alcançam. Inferno. Afundei a brasa na sola do meu All Star, com aquela cara de merda, e enfiei o cigarro inacabado de volta no maço. Recomecei então a minha briga com o Gabriel, ignorando o pedido do cara para que pagássemos logo e nos retirássemos do bar. Se eu não posso fumar, vou ficar mais quarenta minutos nessa porra só de birra, dei de ombros. Que se foda.
 
A nossa permanência era favorável para o próprio estabelecimento. Considerando a quantidade absurda de álcool que nós seis consumimos nas horas anteriores, se o bar nos expulsasse antes de pagarmos iam certamente perder metade da arrecadação da noite.
 
_Primos, talvez – eu continuei, tirando com a cara do Gabriel.
_Que seja. Mas você tem que admitir o parentesco!
_Óbvio que não tem, mano!
_Tem sim, porra. São irmãos!
_A She-Ra e o He-Man?! – eu o olhei, desconfiada.
_E gêmeos, caralho! Pode ver... O cabelo é igual. Eles lutam igual. O jeito é igual. Até os traços são parecidos!
_O que isso tem a ver, mano?! É o mesmo artista! Só por isso eles são irmãos?! Nessa sua lógica aí, o Mickey é irmão da Minnie...
_Não – revirou os olhos, irritado – Eu li isso em algum lugar, são mesmo...
_Onde?
_Não sei, meu, não lembro! Na internet!
_Ah, nossa, que fonte confiável... – retruquei, irônica.
_Eles são irmãos, mano... É real. Tô te falando!
_Se eles são irmãos, qual é o sobrenome deles?
_Sobrenome?
_É!
_Não sei o sobrenome, mas isso n...
_AÍ! – interrompi, bêbada, como se aquilo demonstrasse que ele estava errado e eu, certa – TÁ VENDO?!
_Cê tá viajando! Nenhum personagem assim tem sobrenome. É desenho de criança!
_Novamente, Mickey... “Mouse” – argumentei.
_Tá. Mas, tipo, o pai deles era um rei e eles foram separados quando eram pequenos, então não tem sobrenome mesmo...
_Mano, eu assisti esse desenho minha infância inteira. Cê acha que eu não ia saber duma coisa dessas?!?!
_São, sim! Eles são, tipo, um príncipe e uma princesa... Mas ela foi roubada bebezinha para ser uma discípula do Mal!
_Aham, “Cláudia”, senta lá.
_Ah, mano... – ele ficou nervoso – Não dá pra discutir com você!
 
Cruzei os braços, achando graça, enquanto o Gabriel ia trêbado reclamar de mim para a namorada. Então olhei para a Mia, ainda deitada ao meu lado, e encostei a cabeça na mesa – ficando no mesmo nível que ela. Observei, por uns segundos, os seus olhos quase fechando sobre a madeira.
 
_Oi – ela sorriu para mim.
_Oi – eu sorri de volta.