A montagem das caixas começava a virar um caos. Uma após a outra, cada
vez com mais dificuldade. A ideia tinha partido da Mia, que levantou em
determinado momento para ir à cozinha e voltou com uma garrafa de rum entre aquelas
suas mãos – que eu, cada dia mais, tinha certeza de que não prestavam. Nada,
nem um centavo. E se tinha uma coisa que eu e o Fer éramos incapazes de
recusar, como os fracos humanos que éramos, era rum gelado.
E ela sabia. Maldita.
Eu podia ver os trilhos prestes a serem descarrilhados – como uma
observadora passiva, inerte – e não fiz nada a respeito. Pelo contrário.
Bebi gole atrás de gole, rindo junto aos dois, por horas no chão da sala, em
meio aos vinis espalhados. A nossa sorte é que embalamos cuidadosamente a
vitrola ainda no início da garrafa. Agora já estávamos na sexta ou sétima leva
de vinis. E, embriagados, descontávamos a nossa crescente falta de coordenação
no papelão, que se tornava cada vez mais amassado na lateral torta das caixas.
As conversas logo começaram a ocupar todo nosso tempo, enquanto
pouco trabalho era, de fato, feito. Por volta das onze da noite, acendi um
baseado, abdicando do meu posto. E ri da desorganização que causamos na sala. Fazia
tempo que eu não me divertia assim com o Fer e a Mia. Senti falta disso, admiti para mim mesma, cacete – apesar
dos pesares, aquelas eram duas das minhas pessoas favoritas no mundo, com quem
eu me dava tão bem. Peguei um dos compactos originais de rocksteady do
Fer nas mãos, para olhar a capa, e a Mia me roubou o baseado.
_Mas, e aí, afinal... – ela perguntou, tragando demoradamente – ...quanto
tempo vocês já tavam aqui?
Comecei a calcular em voz alta, confusa pela quantidade de rum que
se infiltrava na minha cabeça.
_Foram cinco, seis... não! Cinco anos e... seis me...
_Oito! Foram oito.
_Não, Fer... OITO meses?! Nem a pau... – balancei a cabeça para ele, com convicção – ...eu tinha quase 19, meu. Tenho certeza! E o meu aniversário é só daqui quatro meses ainda, não pode ser oito.
_Então foram sete. Seis não pode ser... – argumentou, sério – Mano, “seis meses” a gente teria que ter mudado em... espera, que mês a gente tá agora?
Comecei a rir, largada no chão. “Como cê não sabe em que porra de
mês a gente tá?!”, gritei com ele e ri, já fora de mim de tão bêbada, “não faz
nem uma semana que virou o ano, caralho!”. A Mia começou a rir comigo, com o
baseado em mãos, sequer entendendo o que se passava naquele momento. Peguei o fino
de novo e puxei por algum tempo, na intenção de segurar tudo aquilo nos pulmões
– mas, claro, comecei a rir mais uma vez e a fumaça escapou toda.
Já o Fer, por sua vez, ria de mim. E o som na sala seguia
barulhento – tão alto que já tava passível de multa. Para piorar tudo, a gente
conversava aos berros, competindo com os alto falantes. Com carinho, a Mia
argumentou que a gente tinha, de longe, o apartamento mais legal de toda a Frei
Caneca.
_Todo dia, juro. Nós saímos TODO DIA no primeiro mês, quando
mudamos pra cá – apontei o indicador contra o chão, numa assertividade embriagada
– Mano, eu não lembro nem O QUE aconteceu quando começamos a morar na Augusta! É
tudo, tipo, uma grande nuvem na minha cabeça...
_No fim do primeiro mês, a gente já tava casado com a privada... – o Fer riu, me tomando o baseado e dando duas bolas rápidas – ...essa aqui passava mal no vaso, eu ia ajudar e acabava gorfando no chuveiro, era uma beleza.
_Cara, na boa, eu peguei gente que eu não sei o rosto até hoje... – achei graça e a Mia sorriu, nos observando tagarelar – ...se eu vir na rua hoje, juro que não sei dizer.
_Nem eu sei, porra... – o Fer riu – Não. Espera! Quem eu tava pegando quando a gente mudou?
_Nossa... Cê jura mesmo que cê espera que EU lembre? – comecei a rir daquele pedido absurdo quando, subitamente, me ocorreu num flash desagradável de memória – MANO! NÃO! Nããããão, ahhh! Você tava com aquela mina insuportável! Puta merda, Fernando. Essa era pior que a Julia, velho. Lembra? A, aquela lá, a que me odiava. Homofóbica do caralho!
_Ah, a Karina... – ele começou a rir, também.
_Nossa... – a Mia entrou de novo na conversa – ...por que te odiava, meu?!
_Ela tinha alguma coisa contra, sei lá. Mano, era só eu CHEGAR no apê, que ela revirava os olhos. Toda vez! E se eu tivesse com alguém, então, ela saía do cômodo. Puta mina idiota. Depois veio dizer pro Fer, não foi, que não achava que cê devia andar com “gente assim”. Muito babaca!
_Credo! – se revoltou, dando um tapa no ombro do Fernando – POR QUÊ cê tava com essa escrota?!
_Ah, sei lá... só tava, meu. E a gente nem ficou tanto tempo assim, dei um pé nela depois que ela falou essas paradas aí...
_É. ”Sei lá”, né... – comecei a rir de novo, sabendo a resposta, e me virei para a Mia para fofocar – ...ela tinha, mano, juro...
_Fica quieta!
_Cara, a garota nã...
_Cala a boca! – ele me interrompeu, de novo.
Me empurrou com o pé, fazendo graça, e eu ri. Aí a Mia se esticou
– naqueles shorts cada vez mais difíceis de ignorar – até alcançar o isqueiro
largado no chão. Parecia vinda direto dos infernos para o meu lado, naquele
piso de madeira. Então acendeu, mais uma vez, a brasa já apagada do
baseado. O cômodo parecia enevoado e o contraste com a lâmpada amarela no teto
não ajudava muito. A poucos centímetros da TV, o rádio tocava “Oh Babe” no
último volume, a versão do Ewan & Jerry com os Carib-Beats, e o meu
pensamento se fundia, meio vago, àquela atmosfera ensurdecedora, um tanto
perdido entre as palavras que falávamos e a letra da música ressoando ao mesmo
tempo, enquanto ríamos incessantemente.
Senti os meus pensamentos sumirem. Era como viver no absoluto
presente, sem roteiro algum na cabeça. Em branco. “Oh babe, watcha gonna
do now”, a música seguia, “I’m sick and tired, tired, tired, girl, and
I’m worried over you now”. Fechamos mais uma caixa, com muito custo e algumas
distrações extras – faltavam agora só alguns poucos discos espalhados pelo
chão. O Fer, todavia, já começava a sentir o baque daquela maconha toda no
cérebro. Bocejando durante a montagem da caixa seguinte, enquanto eu ainda
fumava, descomedida – empurrando a fumaça seca com o que restava do rum,
chegando ao final da garrafa, num comportamento insensato.
O trem descarrilhava. Sem que tenha demorado muito, apenas quatro
ou cinco músicas depois, o Fer bateu com as mãos nos joelhos e se levantou do
chão, anunciando que não conseguia mais manter os olhos abertos, fritando chapado
com a má combinação de THC e rum. Ia nos deixar ali, disse. Deu dois passos até
a prateleira no centro da sala, abaixando o volume do rádio, e se dirigiu a nós
duas:
_Ó... Pode largar o, o, os coisos aí que, deixa que, q-que
amanhã de manhã eu termino – falou, em palavras arrastadas, meio desconexas.
E aí entrou no corredor para ir dormir.
_Oito! Foram oito.
_Não, Fer... OITO meses?! Nem a pau... – balancei a cabeça para ele, com convicção – ...eu tinha quase 19, meu. Tenho certeza! E o meu aniversário é só daqui quatro meses ainda, não pode ser oito.
_Então foram sete. Seis não pode ser... – argumentou, sério – Mano, “seis meses” a gente teria que ter mudado em... espera, que mês a gente tá agora?
_No fim do primeiro mês, a gente já tava casado com a privada... – o Fer riu, me tomando o baseado e dando duas bolas rápidas – ...essa aqui passava mal no vaso, eu ia ajudar e acabava gorfando no chuveiro, era uma beleza.
_Cara, na boa, eu peguei gente que eu não sei o rosto até hoje... – achei graça e a Mia sorriu, nos observando tagarelar – ...se eu vir na rua hoje, juro que não sei dizer.
_Nem eu sei, porra... – o Fer riu – Não. Espera! Quem eu tava pegando quando a gente mudou?
_Nossa... Cê jura mesmo que cê espera que EU lembre? – comecei a rir daquele pedido absurdo quando, subitamente, me ocorreu num flash desagradável de memória – MANO! NÃO! Nããããão, ahhh! Você tava com aquela mina insuportável! Puta merda, Fernando. Essa era pior que a Julia, velho. Lembra? A, aquela lá, a que me odiava. Homofóbica do caralho!
_Ah, a Karina... – ele começou a rir, também.
_Nossa... – a Mia entrou de novo na conversa – ...por que te odiava, meu?!
_Ela tinha alguma coisa contra, sei lá. Mano, era só eu CHEGAR no apê, que ela revirava os olhos. Toda vez! E se eu tivesse com alguém, então, ela saía do cômodo. Puta mina idiota. Depois veio dizer pro Fer, não foi, que não achava que cê devia andar com “gente assim”. Muito babaca!
_Credo! – se revoltou, dando um tapa no ombro do Fernando – POR QUÊ cê tava com essa escrota?!
_Ah, sei lá... só tava, meu. E a gente nem ficou tanto tempo assim, dei um pé nela depois que ela falou essas paradas aí...
_É. ”Sei lá”, né... – comecei a rir de novo, sabendo a resposta, e me virei para a Mia para fofocar – ...ela tinha, mano, juro...
_Fica quieta!
_Cara, a garota nã...
_Cala a boca! – ele me interrompeu, de novo.
38 comentários:
As duas sozinhas não vai prestar... Amo!!!
maaaano, eu quero o outro. serio. posta o proximo logo. por favor por favor por favorziinho.
O fer não vai mais conseguir passar pela porta daqui a pouco
Sensacional!
Esse post me lembrou muitoo aquele das formigas rs... Mesma atmosfera, td muito leve, solto, fácil!
Adoro os 3 juntos, numa boa. Mas então, o Fer foi dormir né, deixando a Mia e a FM sozinhas e vamos combinar q assim fica melhor haha.
Aguardando ansiosamente o próximo.
Nossa... fim de post com TOTAL gostinho de quero mais!
Vejamos o q acontecerá com esse trem descarrilhado...
"Apesar dos pesares, aquelas eram duas das minhas pessoas favoritas no mundo" *----------* awwwwwwwnnnn
Adoro saber desses detalhes da amizade dela e com o Fer, a vibe foi ótima. Foi realmente lindo ;D
_____________________________________
Deixar elas sozinhas? Agora? PUTA QUE PARIU
Cadê o outro, Melissa? D:
exijo a continuação AGORA na minha mesa, dona Melissa.
att
Aiiinn!! Que deliciaaaa ver o entrosamento desses três!! Apesar de torcer pra Mia e pra FM.. Amo o Fer.. E não queria que ele se desse mal nessa historia! Porqueeeeeeeeee né! Essa parada das duas sozinhas, chapadas e decididamente uma na da outra não vai prestar! E acho que o grande dia tardou, mas chegou!! É hoje!
próximo please!
Eu disse, eu disse! Sabia que ia rolar algo assim! O Fer fritando, e as duas se pegando!
Mia, se joga, sua linda! *-*
Ahh, nãoo Gwen e Mia na mesma sala nãããoo muito porre ao mesmo tempo hahaha.. Canabis e rum são fichinhas.
Ai amei esse post, quase chorei quando li eles conversando sobre qto tempo estavam ali...Vou sentir falta do Fer, sentir falta dessa "coisa" u.u
As duas sozinhas ali, puta merda sério que vou ter que esperar o próximo post? O.o
Ahhhhrrghhh ansiedade que me consomee pqp
Beijo Mel, post nota 1000 =D
"Vinda direto dos infernos para o meu lado" (66)
Eu só acho que a continuação deveria ser postada hj, só acho! HAHAHHAHAHHA
Fuck Yeaaahhh
Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhh, meu Deus.
To morrendo, cadê o próximo post Meeeeeeeeeeeeel?
Gente sério, muita sacanagem parar aí. Muita. G.G
Vai demorar? Diz que não, por favor.
Please, sem maldadinha com suas leitoras poxa. ):
Adoro os 3 juntos, numa boa.²
Continua, continua, continua *-*
esses 3 tem uma sintonia monstra! hahahahaha
e agora as 2 sozinhas e chamadas.....
aí sim a ansiedade pro próximo post bate loucamente ! hahaha
Quanto tempo eu esperei por esse momento muahmuahamuah
MIA <3
E aí, será que a FM vai conseguir lembrar da Clara com esse trem descarrilhado?
Continua, Melzita, sua linda!!
dá pra sentir quando você se empolga muito num post, Mel. e eu AMO! fico empolgada junto. e sinto que mereço uma prévia, depois da raiva que senti daquela inbox que você mandou, hahahaha! please? *.*
Sdds da Clara :( rs
Hmmmmm adorando kkkkk
Ooo, quero ver mto esse 'desastre' ;p
#Miasónasagacidade
QUERO VER O DESASTRE JÁÁÁÁ!
huuuuuuuuuuuummm..sinto cherinho de Fm e Mia por aki...
:DDDDDDDDDDDDDDDDDDD
Fico com o coração apertado: potencial da m... é imensa! :/
uma obs: curti a foto nova da FM aqui. ;)
O Fer é muito ingênuo JDOSDFSAJDAKS;LDUS;HDPIUASHDAHDLAS Como está em praticamentos todos os comentários anteriores: as duas sozinhas não vai prestar.
Aliás, vai prestar e muito... É o que eu espero a meses, poax HFDHAKSF;OHDDSJFHLS
Mel, hoje eu recebi um livro autografado pelo autor e fiquei imaginando quando eu terei um livro seu autografado, sério. Melhor ainda seria se esse livro fosse um exemplar do Fucking Mia HAHAHAH (Tô rindo porque rimou, mas, sério, seria genial).
receita para desastre, super sugestivo esse nome! hahaha
Aaaaah, nooooooooo!
As duas sozinhas e eu vou ter que esperar o próximo... Por favor, não demora :((((
Nossa velho, fm e mia sozinhas?! Isso nao vai prestar.
Esperando o proximo post mega anciosa.
Mas tenho uma pergunta, como assim se passaram só oito meses qe eles moram juntos? Pq se vc for ver por uma ordem de fatos, acontecimentos e tempos qe fm e mia ficaram sem se falar, parece bem mais tempo.
4 anos e 8 meses, flor... rs
Ah sim mel, brigado. Nao acompanhei o raciocinio. ;}
Hahaha
Parar aí foi maldade pura haha
Vai lá FM, destrói logo a parada toda. Já faz muito tempo essa migalhinhas entre a FM e a Mia. Só lamento pelo Fer, não que ele seja A vítima, mas uma facada dessas ninguém merece.
Ansiedade...
Finalmente, as minha musas estão "sozinhas" de novo.. come ela FM.. por favor...
sómaldade..rsrs
Próximo post tem que matar toda a saudade que estou sentindo da Mia com FM, PLEASE. Quero cenas picantes, hahaha. Amei o post.
Por favor, no próximo post, desejo algo que me faça subir pelas paredes, e que eu possa gozar de prazer só de ler... faça algo picante, por favor, atenda ao pedido de uma "garota-do-armário"
Após reler esse post, pressinto: Mia dando encima, FM se desesperando e Fer roncando no quarto ao lado.
Vai dar merda??? Maaaaaaaaagina!
estava pensando aqui, e me veio na cabeça a fm ficando com uma garota mais masculina, até mesmo andrógina. achei graça. fm sempre tão no domínio da situação, mais ativa talvez (não gosto desses rótulos mas tive que usar agora pra tentar explicar). seria divertido vê-la do outro lado, sabes? isso não combina com ela, e por isso mesmo seria engraçado, ela afim de uma andrógina super ativa ahahah. mas é claro, no final das contas ela tem que ser da mia, sempre.
ansiosa para o próximo post! não demoraaa.
Postar um comentário