Entre um gole e outro de whisky, observava os selinhos – as
pernas, as coxas, os dedos e os corpos entrelaçados; os cochichos no ouvido e os
sorrisos despreocupados; os antebraços de uma apoiados nos ombros de outra; os
quadris e braços leves, imersos na música; as mãos em qualquer lugar, em
todo lugar, na cintura de quem quer que estivesse à frente, ao lado, atrás;
o suor e o calor fazendo com que prendessem o cabelo, improvisando coques mal
presos; e as flores da Mia correndo pelas suas costas descobertas, numa frente
única preta desgraçada, mais linda do que jamais a vi, o movimento do
tecido acompanhando o seu corpo enquanto ela dançava e sorria. Puta merda.
E eu lá, a poucos metros dela, babando.
_Isso não é justo – reclamei para a Lê, que estava ao meu lado,
prestes a fazer uma análise antropológica das dinâmicas na balada paulistana.
_O que não é? – ela perguntou, virando mais um gole da sua segunda cerveja.
_Olha aquilo, meu... Não, sério, olha aquilo!
_Que tem? – a Lê riu, acompanhando meus olhos até o meio da pista, onde a Mia e as suas amigas dançavam, alheias à nossa atenção.
_Como o “que tem”? Tem que não é justo, porra! Por que eu não posso ir lá dançar com ela?
_Mas você po...
A Lê pôs-se a responder o óbvio, mas eu a cortei logo em
seguida e continuei com o meu raciocínio, completamente embriagada – meio indignada
de verdade, meio fazendo graça.
_Eu tenho certeza, certeza, que se fosse eu lá com elas, o
Fer ia me olhar torto dali... – fiz um sinal com os olhos, indicando o meu
melhor amigo, que conversava numa rodinha a poucos metros das garotas – Quer
dizer... Eu não, né? Eu não posso. Porque se você é sapatão, cê vira uma porra
de uma ameaça ambulante. Sabe, isso é discriminação!
_Do que cê tá falando?!
_Dessas minas aí... “héteros”... – fingi aspas com os dedos, sendo irônica, e a Lê riu de novo, antes de dar mais um gole na cerveja – ...que ficam aí, sabe, se pegando na frente de todo mundo e ninguém fala merda nenhuma. É mão para cá, mão para lá, gracinha gratuita, selinho numa, selinho na outra... Vai se foder!
_Acho que cê já bebeu demais, cara...
_Não. Eu acho assim... – fiz uma breve pausa, construindo o pensamento com o meu terceiro whisky em mãos – Ou você é sapatão ou não é. Entendeu? Não tem essa de ficar se esfregando na balada, agarrando a coleguinha, se insinuando para Deus e o mundo, e depois ir lá curtir homem.
_Deixa as minas, meu. Foda-se!
_Não. Não! – discordei, séria, e dei outro gole – Se vai ser “das amigas” na balada, tem que ser “das amigas” na cama. Isso é ridículo!
_Que é? Cê tá interessada, quer dormir com alguma delas?
_Quê?! Não! – me indignei – Eu só não acho que é coerente...
_Tá bom, Nietzsche.
_Vai me dizer que cê não fica puta?!
_O mundo é injusto mesmo, amiga... – a Lê concordou, com os olhos nas meninas e a boca novamente na garrafa.
_Muito! E enquanto isso, a gente, as minas que curtem mesmo a parada, nós somos obrigadas a ficar aqui, encostadas na parede, dando uma de cabeça fria e fingindo que não estamos nem aí. Olhando pro outro lado, sabe, enquanto meia ala feminina “se pega” de mentirinha só porque é hétero. Aí pode!
_Bom, a gente não tá exatamente olhando pro outro lado, né...
_Que seja – virei o restante do meu copo, já perigosamente imune à bebida.
_Hum, e por falar em hétero... Olha aquela ali...
_Quem?
_Aquela ali, de branco.
_Não tô vendo – disse, bêbada, meio confusa – Quem, aquela?
_Não. Mais para lá, a ruiva. Do lado do cara de jaqueta.
_Ahn... sei.
_Que cê acha? Sapatão?
_Ah, sei lá, cara... tenta, ué.
E simples assim, perdi minha companhia. Para uma paulistana metida
à hippie, vestida com uma blusinha básica e calça de algodão, com aqueles ares
lésbicos de quem cursa Ciências Sociais em universidade pública. Não deu nem
cinco minutos e a minha amiga – tentando bater o recorde de bocas por noite,
evidentemente – já se encontrava atracada com ela num canto qualquer.
O calor da Sarajevo tinha fervido todo o álcool em excesso no meu
sangue. Eu estava bêbada demais, começando a tropeçar nas minhas próprias palavras
e provavelmente sendo uma companhia bem menos agradável do que a tal garota,
pela qual fui trocada pela minha amiga recém-solteira. Argh, povinho alternativo de merda, resmunguei mentalmente,
encostando-me na parede com certa amargura. A verdade é que eu mesma integrava
o rolê alternativo-de-merda – mas andava azeda e de saco cheio de todo mundo. Olhei
novamente para a pista, voltando à realidade, e me deparei com a Mia vindo na
minha direção.
Opa.
Ajeitei o cabelo, bagunçado pela falta de sobriedade e pelo vento
lá fora. E ela sorriu para mim, a poucos metros de onde eu estava, fazendo um
sinal com a cabeça para a esquerda. Como se quisesse que eu a seguisse. Apoiei
o copo vazio no chão e a alcancei a caminho da saída de fumantes, que ficava ao
pé de uma escadinha estreita. Ela foi na frente e eu dei uma olhada sem querer para
a sua bunda, naquele jeans preto justo, imediatamente sofrendo com a minha
impotência naquela droga de lugar. Eu
preciso parar de beber, porra.
A rua ficava um nível abaixo da pista de dança, após uma “cortina”
grossa feita de tiras largas dum plástico transparente, que deixava o frio
entrar pelos primeiros dois ou três metros do corredor. Paramos a alguns passos
da saída, ainda do lado de dentro. E enfim, a sós.
_O que não é? – ela perguntou, virando mais um gole da sua segunda cerveja.
_Olha aquilo, meu... Não, sério, olha aquilo!
_Que tem? – a Lê riu, acompanhando meus olhos até o meio da pista, onde a Mia e as suas amigas dançavam, alheias à nossa atenção.
_Como o “que tem”? Tem que não é justo, porra! Por que eu não posso ir lá dançar com ela?
_Mas você po...
_Do que cê tá falando?!
_Dessas minas aí... “héteros”... – fingi aspas com os dedos, sendo irônica, e a Lê riu de novo, antes de dar mais um gole na cerveja – ...que ficam aí, sabe, se pegando na frente de todo mundo e ninguém fala merda nenhuma. É mão para cá, mão para lá, gracinha gratuita, selinho numa, selinho na outra... Vai se foder!
_Acho que cê já bebeu demais, cara...
_Não. Eu acho assim... – fiz uma breve pausa, construindo o pensamento com o meu terceiro whisky em mãos – Ou você é sapatão ou não é. Entendeu? Não tem essa de ficar se esfregando na balada, agarrando a coleguinha, se insinuando para Deus e o mundo, e depois ir lá curtir homem.
_Deixa as minas, meu. Foda-se!
_Não. Não! – discordei, séria, e dei outro gole – Se vai ser “das amigas” na balada, tem que ser “das amigas” na cama. Isso é ridículo!
_Que é? Cê tá interessada, quer dormir com alguma delas?
_Quê?! Não! – me indignei – Eu só não acho que é coerente...
_Tá bom, Nietzsche.
_Vai me dizer que cê não fica puta?!
_O mundo é injusto mesmo, amiga... – a Lê concordou, com os olhos nas meninas e a boca novamente na garrafa.
_Muito! E enquanto isso, a gente, as minas que curtem mesmo a parada, nós somos obrigadas a ficar aqui, encostadas na parede, dando uma de cabeça fria e fingindo que não estamos nem aí. Olhando pro outro lado, sabe, enquanto meia ala feminina “se pega” de mentirinha só porque é hétero. Aí pode!
_Bom, a gente não tá exatamente olhando pro outro lado, né...
_Que seja – virei o restante do meu copo, já perigosamente imune à bebida.
_Hum, e por falar em hétero... Olha aquela ali...
_Quem?
_Aquela ali, de branco.
_Não tô vendo – disse, bêbada, meio confusa – Quem, aquela?
_Não. Mais para lá, a ruiva. Do lado do cara de jaqueta.
_Ahn... sei.
_Que cê acha? Sapatão?
_Ah, sei lá, cara... tenta, ué.
5 comentários:
Genial o comentário sobre as meninas heteros que ficam de gracinha na balada e na cama correm atrás de pinto. A Devassa sabe tudo mesmo e como ela falou: ou é sapatão ou não é. Quero logo o outro, vamos, vamos!
Que esquerdismo /\
Acho q ri mais com "ares lésbicos de gente que cursa Artes Cências em universidade pública", do q com o Fer detonando a FM
Sorte q eu resolvi ler o outro post antes d reclamar q a Mia ñ tinha reclamado da Marina =P
Muitooooooooooo bom, muito bommmmmmmmmm, muito bom MEuL.....
Do caralho!!!!
adoroooooooo 8 x...
Genial, tudo! FM bêbada super filosofando e me matando de orgulho. E Mia tava só esperando a Lê sair de perto? :x adorei, vou pro próximo post NOW *-*
#umbjo pras cults...
as maiis gostosas...em tds os sentiidos da expressäo...
né @Tucca_xD?
666
Bgs pra queem eh!
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