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abril 05, 2013

Meio-fio

_Cê tem um novo admirador...
 
Comentei ao sair com o Fer para tomar um ar em frente ao prédio – o apartamento estava um forno, não dava mais para continuar ali.
 
_É só o que me faltava – ele achou graça, acendendo um cigarro – Se bem que eu devia mesmo aparecer na casa do velho com um namorado, ver se ele me deserda de vez...
_Bom, tá fácil. Já tem voluntário... – arqueei a sobrancelha e roubei o cigarro das suas mãos, dando um trago também – ...mas acho que o Du faz mais a linha só-quero-te-comer.
_Não, para. Tô de boa.

Retirou a brincadeira na hora. E eu comecei a rir – o tesão platônico do Du pelo Fer me divertia. E me distraía da merda que estava a minha vida. Nos sentamos no meio-fio, já levemente bêbados de tanta cerveja, e eu traguei mais uma vez o cigarro que tinha roubado, passando-o de volta para o Fer logo em seguida.
 
_Mas e aí, meu... – olhei para ele – ...falando em namoro, acabei nem perguntando, como tão as coisas entre você e a Mia? Cês andavam se desentendendo, né...
_Ah, mano...  sei lá... – balançou a cabeça, frustrado – ...esse fim de semana até que foi da hora. Mas mesmo quando tamo de boa, estar em Santo Amaro dificulta um pouco as coisas. É foda não ter grana pra sair e ter que ficar se vendo na casa dos pais dela, dos meus...
_Nossa, sim. Não dá nem pra fumar um, meu!
_É, então. Foda. Mas vamos ver, né... O cara lá do trampo da Marina me ligou, vou lá essa semana. Quem sabe rola mesmo e aí eu volto pra cá te atazanar...
_Por favor! Preciso de pelo menos uma notícia boa na minha vida...
 
E assim que falei aquelas palavras, ainda que sinceras, o meu coração afundou. É estranho como os seus pensamentos se voltam contra você quando se está triste. Peguei o cigarro das suas mãos, dando mais um trago, enquanto sentia meu peito se dividir entre realmente querer morar com meu melhor amigo de novo e um medo desgraçado de perder o que tinha com a Mia quando ele não estava no apartamento, a intimidade que construímos nos últimos três, quase quatro meses. Argh. Como posso sequer pensar isso, me reprimi silenciosamente, escrota do caralho.
 
Aquela semana estava particularmente difícil para lidar comigo mesma. E por mais que tentasse manter a minha cabeça no lugar, a minha mente tinha um jeito sorrateiro de tirar as coisas de contexto, de ir me envolvendo numas brisas estúpidas. E eu não conseguia fugir. De repente, conversando ali, sentados na calçada da Frei Caneca, me sentia como a razão para tudo o que tinha dado de errado na vida do Fer recentemente – desde o relacionamento dele com a Mia ao seu retorno à casa dos pais. A culpa era minha. Toda minha. Assim como também era culpada pelo meu término com a Clara, por machucar tanto a garota que eu amava. E eu me torturava por dentro, inferno, naqueles breves segundos, soltando a fumaça para o lado, cabisbaixa.
 
_Ei... – o Fer notou a minha angústia e deduziu – ...calma, ela vai voltar também.
_Fer, não, e-ela... – suspirei e os meus olhos doeram, cacete – ...ela é esperta demais para voltar para mim. Cê não tá ligado o quanto eu fodi as coisas.
_Ela seria uma idiota de não voltar, meu.
 
Colocou o braço sobre meus ombros, me abraçando, numa tentativa de me animar, e sorriu. Mas no fundo, eu sabia – sabia que a Clara não tinha que aguentar nenhuma das minhas merdas. E sabia que ela estava certa. Já estava decidido no segundo em que subimos naquele avião – e no fundo, talvez o Fernando também soubesse disso. Mas me beijou a testa, com carinho, chateado por ter que assistir o meu coração partir assim.

Conversamos até tarde naquela noite. E quando me deitei, lá pelas tantas da madrugada, tive um impulso de religar o celular. De ir importuná-la. De ligar e ligar e ligar, de novo, até que me atendesse, de obrigá-la a lidar com a falta absurda que eu sentia dela, por mais injusto que fosse. Não sabia o que fazer com aquele buraco no meu peito, na minha vida. Caralho. Mas por algum motivo não o fiz – dando-me conta de quem eu estava me tornando. E quem eu não queria ser. Eu precisava deixar a Clara em paz.
 
Deixar ela me esquecer.

É. É isso.

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