Responde. Responde. Responde. Eu olhava
fixamente para a tela do celular, apoiado na mesinha de provas, mordendo a
ponta do meu pobre dedo polegar. Sabia que ela já havia saído da faculdade há
horas, tempo suficiente para voltar para casa e almoçar dez vezes junto com a família,
se quisesse – o que evidentemente acabava com a brilhante teoria à qual me
apeguei a manhã toda de que ela não tinha levado o celular para a aula ou o
deixara desligado o tempo todo. Puta que
pariu, pensei, por que ela não me
responde?
_Não tem trabalho pra fazer, não? – um dos fotógrafos freelancers do estúdio passou
por mim e riu.
_Não – murmurei, obcecada, sem tirar os olhos da mesa ou a mão da boca.
_Tá fácil essa vida de assistente, hein...
_Não enche... – curvei as sobrancelhas em desaprovação.
_Ô, bravinha... – jogou um cartão de memória na minha frente – ...descarrega
isso aqui pra mim, vai!
_Escuta. Quanto tempo demora pra digitar quatro letras no celular?!
_O quê?
_Quatro letras, no celular. Quanto tempo demora, Lê?!
_Ihh... já tá brigando? – ela riu – Que foi que eu fiz, meu?!
_Você, nada. A Mia... – passei a mão no rosto, indignada, sem conseguir
continuar – ...mano, eu mandei uma mensagem pra ela faz... – olhei rapidamente
no visor e calculei de cabeça – ...meu, mais de seis horas e sabe o que ela me
manda de volta?! Quatro letras. Quatro!! – me alterei – Mano, eu vou dar com a
cabeça na parede! É sério. Cê tem noção? Eu passei a manhã inteira grudada
nessa porra desse celular, surtando, e pra quê?! Pra receber quatro... Ok, sete,
se contar as reticências... Mas que se foda, sete míseros dígitos. Sete, mano.
Eu vou matar a Mia, tô te falando. Você vai me buscar na droga da DP, cara, eu
vou matar ela!
_Não entendi nada, calma. Qual era a mensagem?
_“Eu também”.
_Isso dá mais de quatro letras...
_Abreviado, né, porra. E ainda por cima foi abreviado!
_Ok – ela riu – Mas ”eu também”, o quê?
_...estou pensando tanto em você.
_E isso não é bom?
_Não! Claro que não! – discuti – Cara, ela vai ver o Fer hoje, mano, isso... i-isso
é péssimo! Ela tinha que responder, sei lá... “Não consigo parar de pensar em
ontem à noite”, “eu gosto de você pra caralho”, qualquer coisa menos isso. Qualquer
merda que não fosse simplesmente concordar comigo, tipo, muito, muito
vagamente. Sério, Lê, isso é uma catástrofe. Eles vão voltar ao normal hoje. Eu
sei que vão. Eu já tô sentindo tudo acontecer... Vai ser o pior dia da minha
vida.
_Voltar? Mas desde quando eles brigaram, meu?
_Ah, na festa, sexta. Meu, não tenho tempo pra ficar te explicando tudo, presta
atenção! Eles brigaram e eu dormi com a Mia ontem e foi o máximo, sério, o
máximo, e agora ela vai ver o Fer e vai ficar toda apaixonadinha de novo e vai
estragar tudo. Já tá estragando, mano... Ela tá esquisita o dia todo, vai por
mim.
_Nossa...
_E o que diabos quer dizer “eu tb...”, afinal?! “Eu também e queria te ver de
novo”? “Eu também, mas tenho muita coisa pra pensar”? “Eu também e só”?!? “Eu
também... e estou pensando em você, no Fer, na Kathleen Hanna, na torcida inteira
do Corinthians...”?!?! – me irritei – Sério, me explica. Que merda ela quis
dizer com isso?!
_Mano... Cê percebeu que cê tá tendo um surto, né?
_Não enche, Letícia.
_Quer dizer que ela também tá pensando em você!! Cara... relaxa. Ou manda outra
mensagem pra ela, sei lá – resmungou – Como você é complicada, credo! Só tem
rolo nessa sua vida aí.
_Olha, sem ofensas, mas você definitivamente não serve como Marina.
_O quê?
_Nada. Preciso desligar... – murmurei, inquieta – Mas valeu.
_Tá. Um beijo... – a Lê riu.