_Escuta... – a Thaís me perguntou, do nada – Cê ainda tá sério com
a Clara?
_Do que cê tá falando, mano?!
Estranhei, equilibrando o celular contra o ombro, enquanto
assinava um orçamento e tentava despachar toda papelada que ainda tinha que
entregar antes de ir embora naquela terça. Minha amiga parecia estar na rua,
pelo som do outro lado da linha, e eu podia ouvir alguém rindo ao seu lado.
_Não é... – respondeu, tentando segurar o riso – ...é só que tava
indo comprar comida agora e encontrei uma mina aqui, sem querer. E mano... Puta
gata!
_Sei... – comecei a rir.
_Pensei em apresentar vocês hoje, sabe, se cê tiver solteira... Ela fala espanhol, é filha de boliviano, trabalha numa loja de música aqui perto, tem cabelo comprido, assim, um undercut... – foi listando, fazendo graça – ...uma tatuagem na linha do ombro.
_Ahm...
_Ouvi dizer que ela gosta dumas trouxas igual você.
_Vai se foder!
_É sério, velho, ela acabou de me falar que curte umas sapatão ruim de sinuca.
_Olha, Thaís, cê nem vem cuspir no prato que comeu! – eu ri, revirando os olhos, e assinei mais uns papéis sem nem ver direito – Mas, agora sério, onde cês tão? Saio daqui uns quinze, vinte minutos, se pá...
_Tamo voltando pro estúdio, vou tatuar a Ju hoje. Cola lá!
_Bora, bora.
Desliguei o telefone ainda rindo. A amizade da Thaís com a Clara
era fundamentada quase unicamente em me zombar. A cada oportunidade que surgia.
Bestas. Me apressei para terminar o que faltava de trabalho e saí da
produtora pouco antes das sete – a semana mal tinha começado e já estava
cansada. Pelo menos agora, com o Du dividindo o apartamento comigo, já não
precisava mais fazer tanta hora extra. Subi a rua até o metrô e fui em direção
a Pinheiros para encontrar o meu date tão misterioso.
Quando cheguei no estúdio, uns quarenta minutos depois da ligação,
a minha amiga estava debruçada sobre a sua namorada, tentando acertar um
decalque nas suas costas. Ao lado delas, com as mãos apoiadas na maca, a Clara se
inclinava para acompanhar de perto. Numa regata branca que roubou de mim uns
meses antes – gostava de ir trabalhar com ela porque ficava larga e confortável
no seu corpo. Seu cabelo estava preso numa trança sobre o seu ombro, revelando
o undercut e a tatuagem de cruz andina que ela tinha na nuca.
Fechei a porta atrás de mim e a Clara virou o rosto na minha
direção, sorrindo ao me ver. Sorri de volta, caminhando até onde elas estavam.
O estúdio tinha paredes pretas com desenhos e decalques colados por todo lado,
um sofá grande e umas espadas de São Jorge em vasos pelos cantos. Todos os
outros tatuadores já tinham ido embora – só restavam as três ali. A Thaís
levantou brevemente a cabeça para me cumprimentar, enquanto fazia uns retoques
de caneta no decalque, e a Ju ergueu a mão sem poder se mover muito.
_Hum... – me aproximei da Clara, fazendo graça – ...então é você
que eu ia conhecer hoje?
_É – ela colocou os braços em volta do meu pescoço – Mas não sei, ouvi um papo aí que cê namora...
_Eu?! Não... – balancei a cabeça, na maior cara de pau – ...cê tá me confundindo.
_Ah, tô?
Ela riu e eu deslizei as mãos até suas coxas naquele jeans, a
erguendo no meu colo num só movimento. E nos beijamos, ainda rindo, conforme
ela cruzava as pernas ao redor do meu corpo. “Olha, se eu soubesse que cê era
gata assim...”, cochichei, com a boca a centímetros da sua. “Hum”, a Clara se divertia, “me diz o que cê
ia fazer”. A Thaís revirou os olhos ao longe, gritando na nossa direção:
_PODE PARAR. SEM BAIXARIA AQUI DENTRO, VOCÊS DUAS!
E nós a ignoramos. Os meus pés encontraram intuitivamente o
caminho até o sofá, caindo junto com a Clara sobre as almofadas. E a Thaís
começou a reclamar de longe. A gente riu, se agarrando quase de propósito. Subi
em cima da Clara e a apertei pela cintura, nuns beijos com gosto. “TEM CÂMERA
AQUI DENTRO!”, minha amiga insistia, nos xingando. E a gente fazia que não
escutava. Nisso, senti o meu celular vibrando. Tirei ele do bolso, ainda entre
as pernas da Clara, rindo, e olhei rapidamente no visor – merda. Era a
Mia me ligando. Recusei a chamada, num reflexo rápido, mas senti certo desconforto.
Aí guardei o telefone no bolso, de novo.
_Do que cê tá falando, mano?!
_Sei... – comecei a rir.
_Pensei em apresentar vocês hoje, sabe, se cê tiver solteira... Ela fala espanhol, é filha de boliviano, trabalha numa loja de música aqui perto, tem cabelo comprido, assim, um undercut... – foi listando, fazendo graça – ...uma tatuagem na linha do ombro.
_Ahm...
_Ouvi dizer que ela gosta dumas trouxas igual você.
_Vai se foder!
_É sério, velho, ela acabou de me falar que curte umas sapatão ruim de sinuca.
_Olha, Thaís, cê nem vem cuspir no prato que comeu! – eu ri, revirando os olhos, e assinei mais uns papéis sem nem ver direito – Mas, agora sério, onde cês tão? Saio daqui uns quinze, vinte minutos, se pá...
_Tamo voltando pro estúdio, vou tatuar a Ju hoje. Cola lá!
_Bora, bora.
_É – ela colocou os braços em volta do meu pescoço – Mas não sei, ouvi um papo aí que cê namora...
_Eu?! Não... – balancei a cabeça, na maior cara de pau – ...cê tá me confundindo.
_Ah, tô?
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