No caminho de volta para casa, a Mia já estava presente em cada
pensamento que passava pela minha cabeça. Por mais que nós nos metêssemos em
situações confusas e às vezes acabássemos nos desentendendo, eu não conseguia
tirar ela dos meus pensamentos. Ela continuava lá. E eu ali, constantemente
presa àquele sentimento, àquele impulso na sua direção. Inferno. Nos
últimos dias tinha ficado claro que ela gostava de mim, de uma forma ou de
outra. O problema é que eu não sabia qual – e isso me perturbava.
Chegando na estação Consolação, parei numa banca para comprar um
chiclete e, enquanto esperava o troco, recebi uma mensagem do Fer. Ele estava
na casa duns amigos ali perto, na Matias Aires. Mais amigos dele do que meus. Era
um apartamento velho e grande dividido por um número sempre flutuante de
moradores – eram cinco? Oito? Difícil dizer. A cada semana o sofá da
sala era ocupado por algum estranho alcoolizado ou estudante de Filosofia da
USP qualquer, que não tinha onde pregar os olhos ou comer a namorada. Parecia
uma república coletiva de toda a Augusta.
Entrei no apartamento dos moleques e joguei minhas tralhas no
sofá. A sala estava sob uma marofa descomunal. Vi o Fer sentado no chão jogando
videogame com outro cara, que eu não conhecia, em meio à uma roda de pessoas
que conversavam aos gritos, que eu também não conhecia. Ele me cumprimentou de
longe – sem tirar os olhos da TV. E eu imediatamente me arrependi de ter ido naquele
rolê errado.
Pensa numa desculpa pra ir embora, resmunguei
pra mim mesma, qualquer uma. Mas foi quando reparei na Mia, num jeans
preto e com as mangas da camiseta enroladas, com as tatuagens à mostra, fumando
sozinha na varanda. Quer dizer, talvez eu possa ficar uns minutinhos...
_Oi... – eu disse, fechando a porta de vidro atrás de mim.
Ela sorriu de volta, com uma das mãos apoiada na beirada da
varanda. E o meu coração pulou uma
batida, inferno.
_Não sabia que cê ia colar aí...
_É. O Fer me mandou mensagem agora, tava saindo do metrô... – roubei o cigarro das mãos dela, apoiando os antebraços na grade – E você, tá escondida aqui por quê?
_Ah, mano – a Mia revirou os olhos – Muito chato lá dentro, num dá...
“Tá foda”, ri. E traguei uma vez, antes de devolver o cigarro para
ela. A Mia observava o movimento da rua – os restaurantes tiravam as cadeiras
da calçada e preparavam-se para fechar. Ela colocou o cigarro na boca, se
curvando para ver mais embaixo. Me juntei a ela. E ficamos ali por um tempo,
observando as pessoas que passavam na calçada.
_Será que se todo mundo vivesse à noite... – ela comentou, do nada,
como se pensasse em voz alta – ...a gente ia querer ficar acordado de dia?
Achei graça. E sorri – “eu ia”. Ela me passou o cigarro e sentou
no chão, com as costas apoiadas contra o vidro da porta. Sentei ao seu lado e a
observei, rindo de novo.
_Quê?!
_Cê parece entediada até a morte, meu.
_E tô mesmo. Esse rolê tá um porre, mano.
_Como assim?! – dei um trago e forcei uma voz indignada, irônica – Você não quer assistir dois caras jogarem FIFA pela vigésima vez seguida?!
_Céus, não – ela riu.
_Osso.
_Pelo menos tem pizza – a Mia pegou o cigarro e me olhou – Cê já jantou?
_Já... Meu pai passou perto do meu trampo hoje e fomos num restaurante por lá – respondi – Meu, toda vez que saímos juntos é a mesma conversa... Ele acha que eu e o Fer somos casados ou algo do tipo.
_Você e o Fê? – ela gargalhou.
_Juro. É ridículo.
_Mas, espera, ele não sabe que você...?
_Sabe – balancei a cabeça, enquanto ela soltava a fumaça entre os lábios – Só ignora.
_Que bizarro... Faz quanto tempo que ele sabe?
_Uns seis, sete anos. Deixa eu pensar... – calculei rapidamente – É, quase sete. Eu tinha de 16 pra 17 quando contei.
_E o que ele disse?
_Nada.
_Nada?
_É, por uns dois meses – ri.
_Isso é horrível!
Ela começou a rir e eu concordei, é. Foi.
_Mas depois vocês ficaram bem, não?
_Ah, sim – peguei o cigarro e dei mais um trago – Sei lá, meu, acho que por mais difícil que seja, as pessoas que realmente te amam acabam entendendo. E nunca deixam de te amar, sabe? Em algum momento, elas percebem que você não pode ser feliz de outra maneira.
_Mas seu pai não aceitou totalmente... Digo, por causa desse lance do Fê e tudo mais.
_Ele fala mais por brincadeira... No fundo, ele sabe que não é assim. Já conversamos muito, ele conheceu as minas que eu namorei, acho que s-só não perde totalmente as esperanças de um dia me ver casando, tendo filho, sabe? Ao lado dum bom rapaz e o caralho a quatro.
_Olha, o Fê não é exatamente o que eu chamaria de um “bom rapaz”.
_É, cê tem razão... – eu ri.
_É. O Fer me mandou mensagem agora, tava saindo do metrô... – roubei o cigarro das mãos dela, apoiando os antebraços na grade – E você, tá escondida aqui por quê?
_Ah, mano – a Mia revirou os olhos – Muito chato lá dentro, num dá...
_Cê parece entediada até a morte, meu.
_E tô mesmo. Esse rolê tá um porre, mano.
_Como assim?! – dei um trago e forcei uma voz indignada, irônica – Você não quer assistir dois caras jogarem FIFA pela vigésima vez seguida?!
_Céus, não – ela riu.
_Osso.
_Pelo menos tem pizza – a Mia pegou o cigarro e me olhou – Cê já jantou?
_Já... Meu pai passou perto do meu trampo hoje e fomos num restaurante por lá – respondi – Meu, toda vez que saímos juntos é a mesma conversa... Ele acha que eu e o Fer somos casados ou algo do tipo.
_Você e o Fê? – ela gargalhou.
_Juro. É ridículo.
_Mas, espera, ele não sabe que você...?
_Sabe – balancei a cabeça, enquanto ela soltava a fumaça entre os lábios – Só ignora.
_Que bizarro... Faz quanto tempo que ele sabe?
_Uns seis, sete anos. Deixa eu pensar... – calculei rapidamente – É, quase sete. Eu tinha de 16 pra 17 quando contei.
_E o que ele disse?
_Nada.
_Nada?
_É, por uns dois meses – ri.
_Isso é horrível!
_Ah, sim – peguei o cigarro e dei mais um trago – Sei lá, meu, acho que por mais difícil que seja, as pessoas que realmente te amam acabam entendendo. E nunca deixam de te amar, sabe? Em algum momento, elas percebem que você não pode ser feliz de outra maneira.
_Mas seu pai não aceitou totalmente... Digo, por causa desse lance do Fê e tudo mais.
_Ele fala mais por brincadeira... No fundo, ele sabe que não é assim. Já conversamos muito, ele conheceu as minas que eu namorei, acho que s-só não perde totalmente as esperanças de um dia me ver casando, tendo filho, sabe? Ao lado dum bom rapaz e o caralho a quatro.
_Olha, o Fê não é exatamente o que eu chamaria de um “bom rapaz”.
_É, cê tem razão... – eu ri.
2 comentários:
:)
Em algum momento elas percebem que você não pode ser feliz de outra maneira e acabam entendendo.
[Fato/
Ameei *.*
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