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janeiro 11, 2010

"Quem está na chuva..."

Me apoiei na parede, sentindo a água correr pela minha nuca, esperando que ela levasse toda a minha ansiedade ralo abaixo. Mas quanto mais eu demorava no banho, mais nervosa eu ficava. A ideia da Clara dividindo o mesmo cômodo que a Mia por tanto tempo me incomodava. Ainda assim, minha hesitação me mantinha embaixo do chuveiro. O que diabos eu faço agora? Respirei fundo. De um jeito ou de outro, eu estava ferrada. Não havia chance de a Mia relevar aquela entrada triunfal depois de tê-la beijado no meio da madrugada.
 
Fechei a torneira, num impulso. Quer saber? Se já tô no Inferno, é melhor ir em frente e abraçar logo o capeta.
 
Me enxuguei rapidamente e fui direto para o quarto. No pique de vestir a roupa mais sapatão possível e ir dar para a Mia um motivo real para se incomodar, tascar o maior beijo na Clara, sei lá eu, que se foda. É. Às vezes, me batiam uns impulsos burros. Nunca tive muita paciência para esperar para ver – ou largo mão ou faço três vezes pior, para acabar logo com a tensão. Parei na frente do armário e analisei minhas opções. Não sabia que diabos vestir. O que diabos se usa para impressionar uma menina gosta de meninos? 
 
Tudo em mim sempre gritou “caminhão”. Me irritava quando as pessoas vinham com essas de que “tudo bem” ser lésbica, só “não precisa virar caminhoneira”. Como se a feminilidade tornasse nossa sexualidade mais aceitável ao mundo. Ou menos pior. Meu cu. Quanto mais eu pudesse me afastar do esperado duma boa moça, melhor. Na infância, eu era a dor de cabeça da minha mãe – resistia a usar qualquer vestido ou saia. Me sentia como o Ken enfiada nas roupas da Barbie. Desagradável. Gostava de andar largada por aí com camiseta, All Star e jeans. Acho que nunca superei o fim do movimento grunge.
 
Tá. Mas e agora, hesitei, em frente ao meu armário bagunçado. Não podia usar nenhuma daquelas camisetas de banda que a Mia já tinha visto um bilhão de vezes. Queria que ela olhasse para mim. Realmente olhasse. Alguns minutos de indecisão depois, puxei duma gaveta uma flanela que sabia que ela gostava e a amarrei na cintura, vestindo uma regata preta por cima. Bermuda, coturno e é, é isso, pensei, me sentindo a última caminhão da BR-116.
 
Conforme voltava para a sala, podia ouvir as caixas de som berrando um LP do Roxy Music. “Lift up your feet and put them on the ground, you used to walk upon…”, cantarolei, passando pelo corredor, “...when we were young”. Eu adorava a voz do Bryan Ferry.
 
_Eita. Cadê todo mundo?
 
Estranhei, me deparando com minhas duas convidadas sentadas no sofá da sala, sozinhas.
 
_“Todo mundo”, quem?
_A Mia e o Fer, aonde eles foram?!
_Dormir, não sei... Resolveram ir pro quarto.
_M-mas... como assim? Quem resolveu? Ele ou ela?
_Sei lá... – a Clara riu – ...faz diferença?
 
Muita. Lá se ia o meu plano brilhante. Fingi não me incomodar e neguei com a cabeça, sorrindo de volta para a Clara. Argh. Já estava quase na hora da balada abrir. As convenci, então, a agilizar o nosso esquenta para sair o quanto antes daquele apartamento, argumentando que a entrada era mais barata até meia-noite. A real é que eu estava frustrada – depois de ficar revirando o armário para alguém que sequer queria me ver. Devia ter previsto essa.

7 comentários:

Dea disse...

ah, Mel... assim você ME frustra!

Monnik disse...

Engraçado que eu imaginava a FM bem masculina.SURPRESAAAAA

Anônimo disse...

Verdade, preferia que ela fosse com a regata e de shortinho, mas com o All Star só pra deixar um apelo sutil ..Oh yeah I'm gay...

Anônimo disse...

Igual àquela cena épica do filme "Flashbacks of a fool": http://www.youtube.com/watch?v=au8cCvGk9eU&feature=related

@livia_skw disse...

FM de salto?! :O

• the girl fucking Mia • disse...

Que salto? Sandália rasteira sapatão, rs

@livia_skw disse...

HAHAHAHA, doce ilusão minha...